A aprovação, pela Câmara dos Deputados, do texto-base do projeto que endurece o combate aos devedores contumazes representa um marco relevante na consolidação de um ambiente tributário mais equilibrado e íntegro. O tema, amplamente discutido nos tribunais e no Parlamento, ganhou contornos mais precisos a partir do reconhecimento, pelo STF, da diferença essencial entre o contribuinte eventualmente inadimplente e aquele que estrutura sua atividade econômica para descumprir reiteradamente as obrigações tributárias.
No julgamento da ADIn 4.854/RS, o STF assentou que o devedor contumaz não se confunde com o empresário em dificuldade conjuntural. Trata-se de figura que adota uma estratégia deliberada de inadimplemento, gerando concorrência desleal, perda de arrecadação e distorções profundas no ambiente econômico. O projeto aprovado na Câmara segue essa orientação constitucional ao estabelecer critérios objetivos para caracterização da conduta, bem como instrumentos proporcionais capazes de inibir práticas reiteradas de sonegação estruturada.
Sob a ótica das finanças públicas e da livre concorrência, o enfrentamento do devedor contumaz não configura mero mecanismo arrecadatório. Representa, antes, uma política indispensável à proteção do interesse público e ao resguardo das empresas que cumprem suas obrigações. A ausência de instrumentos eficazes de diferenciação entre inadimplência eventual e inadimplência estratégica incentiva comportamentos oportunistas e transfere ao contribuinte regular o custo da evasão praticada por poucos.
A clareza normativa introduzida pelo projeto contribui para reforçar a segurança jurídica. Ao definir parâmetros técnicos, prever etapas procedimentais e assegurar meios adequados de defesa, o texto evita soluções automáticas, privilegiando a proporcionalidade e a transparência. Regulamentações que combinem rigor e técnica são fundamentais para permitir a atuação coordenada das administrações tributárias estaduais e Federal, sem criar riscos indevidos aos contribuintes de boa-fé.
O avanço legislativo também dialoga com uma agenda institucional mais ampla, na qual diversas entidades, incluindo a advocacia pública, vêm defendendo o aperfeiçoamento dos mecanismos de enfrentamento ao contumaz. Posições já manifestadas no Congresso ressaltam que o país não pode tolerar modelos de negócio baseados na inadimplência sistemática, uma vez que tais práticas corroem a confiança no sistema, fragilizam políticas públicas e estimulam a competição predatória.
O país ainda tem desafios relevantes pela frente. A regulamentação precisa ser cuidadosa, e as administrações tributárias estaduais e Federais devem atuar de forma coordenada. Mas o sinal político e jurídico enviado pelo Congresso é importante: o Brasil não tolerará que a competição empresarial seja distorcida por estratégias de inadimplemento sistemático.