É comum que pessoas jurídicas, por razões operacionais, financeiras ou contratuais, realizem estornos de valores anteriormente registrados como receita e, por consequência, incluídos na base de cálculo de tributos Federais. A questão que se coloca é saber se, uma vez reconhecida a inexistência jurídica desses ingressos, seria possível reconhecer o pagamento a maior de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins, com a consequente restituição ou compensação dos respectivos valores.
O IRPJ e a CSLL incidem sobre a renda, entendida como acréscimo patrimonial, enquanto o PIS e a Cofins incidem sobre a receita bruta, a qual pressupõe ingressos que se incorporam de forma definitiva ao patrimônio do contribuinte. O STF, no julgamento do RE 574.706/PR (Tema 69), assentou que apenas ingressos dotados de definitividade podem ser qualificados como receita para fins de incidência das contribuições ao PIS e à Cofins.
Se, em razão de estornos, verifica-se que determinados valores incluídos na base de cálculo dos tributos não representaram acréscimo patrimonial nem ingresso definitivo, mas simples registros transitórios posteriormente desfeitos, resta descaracterizado o próprio fato gerador. Nessa hipótese, o recolhimento de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins sobre tais valores revela-se indevido, abrindo espaço para a reapuração da base de cálculo e para o reconhecimento de pagamento a maior.
Para viabilizar a recuperação dos valores pagos a maior, é imprescindível que o contribuinte promova a retificação das obrigações acessórias correspondentes aos períodos afetados e, se aplicável, dos registros contábeis, de modo a permitir que o sistema da Receita Federal reconheça a existência do indébito quando da transmissão das PER/DCOMPs. Evidentemente, a robustez da prova documental dos estornos, com lançamentos contábeis, comunicações formais e demais documentos de suporte, é elemento central para impedir eventual não homologação das PER/DCOMP.
Superada essa etapa, surge uma segunda questão, relativa à tributação dos valores a serem restituídos ou compensados.
Caso os tributos recolhidos indevidamente tenham sido, à época, deduzidos como despesa na apuração do IRPJ e da CSLL, sua posterior restituição ou compensação deverá ser oferecida à tributação, sob pena de indevido benefício duplo ao contribuinte.
O STJ já assentou que a recomposição patrimonial decorrente da repetição de indébito configura acréscimo patrimonial quando os valores originalmente pagos foram utilizados como despesas dedutíveis (REsp 1.516.593).
Esse mesmo entendimento é aplicado pela Receita Federal, nos termos da solução de consulta COSIT 49/25.
Quanto ao momento da tributação, a orientação administrativa mais recente aponta que a disponibilidade econômica da renda se perfectibiliza com a escrituração contábil que quantifica o crédito, ou seja, antes mesmo da entrega da primeira PER/DCOMP. É o que se extrai da solução de consulta COSIT 308/23, cuja fundamentação, embora voltada a decisões judiciais ilíquidas, aplica-se por identidade de razões às hipóteses de reconhecimento administrativo de pagamento a maior decorrente de retificação espontânea.
Em síntese, os estornos que evidenciam a inexistência jurídica de receitas anteriormente tributadas autorizam, em tese, o reconhecimento de pagamento indevido de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins. Contudo, a recuperação desses valores deve ser conduzida adequadamente, tanto no plano documental quanto no plano contábil e fiscal, inclusive no que se refere à correta tributação da restituição, sob pena de criação de novos passivos e de questionamentos futuros pela fiscalização.