A Lee, Brock, Camargo Advogados (LBCA) apoiou a realização do "1º Fórum Valquírias Digitais: Justiça para as mulheres no Ambiente Digital", em 1º/10, na sede da OAB/SP, ocasião em que foi lançada a cartilha "Justiça Conectada", de orientação sobre a violência digital contra as mulheres.
A própria cartilha define o que é violência digital de gênero: "É qualquer forma de agressão, intimidação, humilhação ou controle exercido por meio das tecnologias da informação – como redes sociais, aplicativos, e-mails ou dispositivos eletrônicos – motivada por questões de gênero".
Há 27 tipos de delitos digitais aos quais as mulheres podem ficar expostas, e 40% delas já sofreram agressões online. Esses dados elevam a violência de gênero a um patamar acima do registrado no mundo analógico, conforme constatado por pesquisa da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e Inteligência Artificial da OAB/SP, com 7.484 respondentes online.
Para o presidente da Comissão e professor de Direito Internacional Privado da USP, Solano de Camargo, os dados são assustadores quando comparados ao tratamento que os ilícitos digitais contra as mulheres recebem no exterior, tanto de prevenção, quanto de combate.
"Comparativamente, há duas grandes diferenças: Lá fora há mais prevenção e, no caso de haver o surgimento de nova tecnologia, há preocupação com o seu impacto sobre grupos vulneráveis. Aqui não há essa cultura, somente colocamos cadeado depois da porteira arrombada", diz Solano.
Ele cita como exemplo lei Maria da Penha (lei 11.340/06), lei Carolina Dieckmann (lei 12.737/12), lei Joana Maranhão (lei 12.650/12), lei Mariana Ferrer (lei 14.245/21), dentre outras, inspiradas em mulheres que foram vítimas emblemáticas de crimes de gênero.
Na mesma linha, Patrícia Vanzolini, ex-presidenta da OAB/SP, enfatiza que a violência digital elevou a outro nível a violência contra a mulher, pela sua proporção, letalidade e magnitude.
Igualmente para a advogada Isabella Rainho, coordenadora do projeto "Valquírias Digitais", a violência contra as mulheres vem se expandindo para novas formas no mundo digital e no mundo analógico, a despeito dos registros não expressarem a realidade, uma vez que há subnotificações.
No Brasil, a luta contra violência dirigida às mulheres no mundo digital está concentrada no projeto "Valquírias Digitais", idealizado pelo presidente da Comissão de Privacidade, Proteção de Dados e IA da OAB/SP, Solano de Camargo, que utiliza o mito nórdico das guerreiras armadas e empoderadas para expressar o sentido de luta em torno da questão.
De acordo com Solano, é fundamental nomear os ilícitos online para começar o debate e o combate no plano Legislativo e Jurisprudencial. Também porque as vítimas, muitas vezes, têm dificuldades de explicar e enquadrar o que sofreram em um dos tipos de violência digital.
"É o caso de uma tapinha não dói. Conversei com duas mulheres que achavam fofo que fossem monitoradas eletronicamente dentro de casas pelos maridos e pelo GPS do carro. Isso normaliza a violência, não é fofo, é tóxico", afirma.
Na pesquisa de campo realizada pela comissão da OAB/SP com 7.487 pessoas (mulheres e homens) de todo o país, cerca de 89,7% dos respondentes eram mulheres e 62% com pós-graduação completa, o que empresta um perfil qualificado à pesquisa.
A Comissão apurou que 73,2% dos respondentes já testemunharam comunicação agressiva online, 60% eram casos de doxing (divulgação de dados pessoais com fins de perseguição), 52% já tinham sofrido algum tipo de assédio em redes profissionais (WhatsApp ou e-mail), 93% apoiam a criminalização de todas as forma de violência digital e 40% vivenciaram o problema.
Para Solano, um dado foi surpreendente, jovens de 18 a 25 anos já sofreram ou testemunharam violência digital, mas desse apenas 34% defendem a criminalização. "São os mais expostos e normalizam esses delitos. Faz sentido porque são nativos digitais e estão convivendo com esse tipo de violência desde cedo. Os dados também podem ser lidos como desconfiança ao sistema penal e a solução poderia ser híbrida com letramento e suporte para a geração Z", argumenta.
Os 27 tipos de violência digital levantados pela comissão são pornografia de vingança, deepfakes não consensuais, sextorsão, vazamento de pacotes (nudes), creep shots, cyberstalking, controle coercitivo digital, grooming (com meninas), flaming, assédio em jogos e streaming, stalkerware, cyberbullying misógino,cyber blackmail, cyber defamation, doxing, impersonificação digital, swatting, ameaça de estupro virtual, speech-bombing, zoom-bombing, discurso de ódio de gênero, cultura do estupro on-line, sexismo algorítmico, shadow bombing misógino, exclusão social digital, gaslighting digital, violência política de gênero online.
Diante de um quadro normativo insuficiente para combater a violência online contra as mulheres, a Comissão da OAB/SP propõe investimento em letramento digital, campanhas de conscientização e política de suporte institucional às vítimas que não precisariam ir à delegacia denunciar a violência digital sofrida, porque a narrativa poderia ser feita por suas advogadas.
O projeto conta com 10 Valquírias Digitais em todo o Estado, que atuam como coordenadoras regionais: Isabella Rainho (coordenadora), Ana Mahle, Beatriz Hilkner, Irma Sizue, Josiane Sartori, Karolyne Utomi, Renata Morais, Rosália Ometto, Roseanny Lima e Sabrina Gil.
No fórum, estiveram presentes o presidente da OAB/SP, Leonardo Sicca, a vice-presidente Daniela Magalhães e a secretária geral Adjunta, Viviane Scrivani.