Migalhas Quentes

STF retoma análise de renegociação de acordos de leniência da Lava Jato

Caso seguiu com o voto-vista do ministro Flávio Dino.

1/12/2025

STF analisa, em plenário virtual, a validade e os limites dos acordos de leniência firmados na Operação Lava Jato ao analisar a renegociação dos pactos celebrados por empresas de sete grupos econômicos.

Inicialmente, o relator, ministro André Mendonça, votou por manter os acordos de leniência da Lava Jato, reconhecendo sua validade, mas determinando ajustes para adequá-los ao modelo constitucional. Defendeu a participação coordenada de CGU, AGU e TCU na execução e fiscalização, sem anular valores já pagos.

Em voto-vista que retomou o julgamento, o ministro Flávio Dino abriu divergência parcial. Também manteve os acordos, mas propôs uma solução mais abrangente, com regras de cooperação entre os órgãos e mecanismos que evitem cobranças múltiplas, garantindo maior segurança jurídica às empresas.

O caso

A ADPF foi ajuizada por PSOL, PCdoB e Solidariedade, que contestam a forma como os acordos de leniência celebrados na Lava Jato foram conduzidos. As siglas afirmam que empresas foram submetidas a pressões indevidas e que os ajustes teriam sido firmados com desvio de finalidade, resultando em obrigações excessivas e prejuízos econômicos relevantes. Sustentam, ainda, que a negociação deveria ter sido centralizada na CGU, para evitar sobreposição de sanções e conflitos entre órgãos públicos.

As legendas também apontam falhas nos acordos originais, como a ausência de parâmetros objetivos para cálculo de multas e indenizações, a adoção de bases de cálculo consideradas desproporcionais, a inclusão de condutas posteriormente reconhecidas como lícitas ou de menor gravidade e a celebração simultânea de pactos com diferentes autoridades sancionadoras, o que, segundo elas, ampliou de forma indevida as obrigações impostas às empresas.

Os acordos de leniência, previstos na legislação anticorrupção, permitem que empresas confessem irregularidades, colaborem com investigações e reparem danos ao erário, mantendo a possibilidade de contratar com o poder público. Durante a Lava Jato, companhias de diversos setores firmaram esses compromissos, mas muitas relataram dificuldades para cumprir os valores estipulados, algumas delas, inclusive, entraram em recuperação judicial.

Relator do caso, ministro André Mendonça.(Imagem: Fellipe Sampaio /STF)

Voto do relator

O ministro André Mendonça, relator da ação, votou pelo reconhecimento do cabimento da ação, e afirmou que a CGU é a autoridade competente para celebrar acordos de leniência no âmbito do Executivo federal e também nos casos que envolvem relações com administrações públicas estrangeiras.

O relator ressaltou que os tribunais de contas não possuem competência para revisar, validar ou impor condições a acordos de leniência, podendo atuar apenas na apuração de dano ao erário, quando houver repercussão em contratos sob sua fiscalização.

Também destacou que o Ministério Público Federal não tem atribuição legal para celebrar acordos de leniência nos moldes da lei anticorrupção, embora possa firmar ajustes cíveis, como TACs e ANPCs, que não produzem automaticamente os efeitos próprios da leniência.

Mendonça considerou válidos os acordos já firmados pelo MPF, mas apenas dentro da esfera civil, enfatizando que eles não substituem a leniência prevista na LAC, salvo se houver ratificação pela União, por meio da CGU.

Em seu voto, propôs ainda teses que consolidam a competência central da CGU, delimitam a atuação do TCU e reconhecem o papel do Judiciário como instância de controle dos acordos.

Os ministros Nunes Marques e Luís Roberto Barroso acompanharam o relator.

Leia o voto e o complemento de voto.

Divergência 

O ministro Flávio Dino apresentou voto-vista, reforçando que houve excessos institucionais na condução desses acordos, com insegurança jurídica, sobreposição de competências e práticas que teriam colocado empresas sob coação, configurando, segundo ele, um quadro de “hidra persecutória”.

Para o ministro, o sistema de responsabilização instituído pela lei anticorrupção estabelece um regime claro: a Controladoria-Geral da União detém competência exclusiva para celebrar acordos de leniência na esfera federal, e nem o MPF nem o TCU podem exercer funções sancionatórias fora da lei.

Dino admite a participação conjunta da AGU e do MPF nos acordos, mas apenas para fins de resolver também, de forma global, as sanções de natureza civil, nunca as administrativas, que são exclusivas da CGU. Assinala que a atuação do Ministério Público na esfera administrativa é apenas subsidiária e depende de efetiva omissão do órgão competente, não podendo ser acionada por mera discordância quanto ao mérito ou à dosimetria das sanções aplicadas.

O ministro também reconhece a possibilidade de acordos paralelos entre CGU, AGU e MPF, desde que cada um respeite sua esfera de atribuições e haja compensação integral de valores para evitar dupla punição e violação ao princípio do non bis in idem. Dino dedica parte substancial do voto a fixar parâmetros para impedir distorções verificadas na Lava Jato, como “multas híbridas”, critérios econômicos desproporcionais e obrigações sem previsão legal.

Defende que os valores pactuados em leniência devem limitar-se às rubricas previstas na lei 12.846/13, multa, reparação integral do dano e perdimento de bens ilícitos, e que a dosimetria deve considerar sanções já aplicadas em outras instâncias, para evitar sobreposição.

Ao final, o ministro propôs ajustes em algumas teses do relator.

Leia o voto.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Leia mais

Migalhas Quentes

Lava Jato: AGU, CGU e empresas enviam ao STF conciliação de acordos de leniência

22/9/2024
Migalhas Quentes

Mendonça prorroga em 30 dias prazo para acordos de leniência da Lava Jato

22/8/2024
Migalhas Quentes

MPF, CGU e AGU criarão protocolo para acordos de leniência

28/2/2024
Migalhas Quentes

Lava Jato: Mendonça convoca audiência em ação de acordos de leniência

17/2/2024

Notícias Mais Lidas

Juíza aponta falta de acolhimento a jovem morto por leoa em João Pessoa

2/12/2025

Dias Toffoli impõe sigilo absoluto ao pedido da defesa de Vorcaro no STF

2/12/2025

Caso Narcisa e Boninho reacende o debate sobre abandono afetivo

2/12/2025

Mattos Filho assessora Appia em acordo estratégico com a Ultra

2/12/2025

Projeto social não devolverá repasse estatal por suposta destinação indevida

2/12/2025

Artigos Mais Lidos

Abertura de empresas e a assinatura do contador: Blindagem ou burocracia?

3/12/2025

Como tornar o ambiente digital mais seguro para crianças?

3/12/2025

Recuperações judiciais em alta em 2025: Quando o mercado nos lembra que agir cedo é um ato de sabedoria

3/12/2025

Seguros de danos, responsabilidade civil e o papel das cooperativas no Brasil

3/12/2025

ADPF do aborto - O poder de legislar é exclusivamente do Congresso Nacional

2/12/2025