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A condenação em honorários advocatícios no Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica

quinta-feira, 18 de junho de 2020

Atualizado em 19 de junho de 2020 07:15

Texto de autoria de Rogerio Mollica

Uma das maiores e mais comemoradas inovações trazidas pelo Código de Processo Civil de 2015 foi a criação do Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica (IDPJ), que possibilita ao sócio se manifestar previamente sobre as alegações do requerente, no prazo de 15 dias, e com ampla possibilidade probatória, nos termos dos artigos 133 a 137 do Código de Processo Civil de 2015.

Por ser um instituto recente, ainda suscita muitas dúvidas, sendo que uma das principais é se haveria a condenação em honorários advocatícios em Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica.

Em 30 de março de 2.017, o processualista e amigo André Pagani de Souza escreveu primoroso artigo nessa coluna criticando o posicionamento do Tribunal de Justiça de São Paulo1 contrário à fixação dos honorários advocatícios.

Faz-se necessária a volta ao tema, eis que recentemente, o Superior Tribunal de Justiça voltou a apreciar a referida tese e decidiu, por maioria, nos seguintes termos:

"RECURSO ESPECIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO NA ORIGEM. INCIDENTE DE DESCONSIDERAÇÃO DA PERSONALIDADE JURÍDICA. CONDENAÇÃO EM HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DESCABIMENTO. ART. 85, § 1º, DO CPC/2015. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

1. Não é cabível a condenação em honorários advocatícios em incidente processual, ressalvados os casos excepcionais.

Precedentes.

2. Tratando-se de incidente de desconsideração da personalidade jurídica, o descabimento da condenação nos ônus sucumbenciais decorre da ausência de previsão legal excepcional, sendo irrelevante se apurar quem deu causa ou foi sucumbente no julgamento final do incidente.

3. Recurso especial provido."

(REsp 1845536/SC, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, Rel. p/ Acórdão Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 26/05/2020, DJe 09/06/2020)

É bem verdade que sob a vigência do antigo CPC a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça já havia fixado o entendimento de que "A jurisprudência desta Corte entende que a melhor exegese do § 1º. do art. 20 do CPC/1973 não permite, por ausência de previsão nele contida, a incidência de honorários advocatícios em incidente processual ou recurso"2.

A recente decisão do Superior Tribunal de Justiça também se baseia no entendimento de que o § 1º, do artigo 85 do Código de Processo Civil de 2015 traria um rol taxativo das hipóteses de cabimento da condenação em honorários advocatícios e essas hipóteses não abarcariam o IDPJ. Entretanto, trata-se, na verdade, de um rol meramente exemplificativo, considerando-se que em outras passagens do Código também é prevista a condenação em honorários advocatícios sucumbenciais, tais como no parágrafo único do art. 129, que trata da denunciação da lide.

A doutrina vem, majoritariamente, se posicionando de forma contrária ao entendimento do Superior Tribunal de Justiça, ou seja, pela possibilidade da condenação da parte vencida no Incidente de Desconsideração da Personalidade Jurídica ao pagamento de honorários advocatícios:

"Em virtude de se tratar de exercício de direito de ação e de sua própria natureza jurídica, a decisão proferida acerca do pedido de desconsideração da personalidade jurídica exige a condenação da parte vencida ao pagamento dos ônus sucumbenciais". ( Primeiros comentários ao código de processo civil [livro eletrônico] / Teresa Arruda Alvim ... [et al.]. -- 3. ed. -- São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2020).

"A desconsideração da personalidade jurídica é espécie de intervenção de terceiros que se dá por ação (art. 2.º). É indiferente que o CPC/2015 lhe atribua a terminologia de "incidente". Por suas características, parece inegável que é ação incidental - e não mero "incidente" (Luiz Henrique Volpe Camargo. In: Antônio do Passo Cabral; Ronaldo Cramer (coords.). Comentários ao novo Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, p. 235). Disso resulta que a decisão que julgar a ação incidental condenará o vencido (art. 85, caput) ao pagamento das despesas processuais a favor do autor e honorários advocatícios a favor do advogado do vencedor (art. 85, caput e §14 c/c art. 23 da Lei 8.906/1994). Sendo procedente o pedido de desconsideração, caberá ao sócio (na desconsideração tradicional) ou à pessoa jurídica (na desconsideração inversa) arcar com as despesas e honorários. De outro lado, sendo improcedente o pedido de desconsideração, caberá ao autor do pedido arcar com as despesas e honorários do advogado do sócio (na desconsideração tradicional) ou da pessoa jurídica (na desconsideração inversa)". (Luiz Henrique Volpe Camargo, in Breves comentários ao código de processo civil [livro eletrônico] / coordenadores Teresa Arruda Alvim Wambier... [et al.]. -- 2. ed. -- São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016).

"Afinal, uma vez citado o réu, ele irá constituir advogado, ingressar no feito e, exemplificativamente, apresentar defesa para demonstrar a inexistência de atos de confusão patrimonial que justificariam a inaplicabilidade do instituto no caso concreto. Há uma decorrência lógica de que o autor, que propôs a demanda, caso derrotado, remunere as custas e os honorários advocatícios ao réu (e vice-versa)". (Christian Garcia Vieira, in Desconsideração da personalidade jurídica no Novo CPC: natureza, procedimentos e temas polêmicos. Salvador: JusPodivm, 2017. p. 183).

Desse modo, faz-se necessário que a Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça volte a analisar o tema, agora já sob a égide do Código de Processo Civil de 2015, e pacifique o entendimento sobre o cabimento ou não da fixação de honorários advocatícios no Incidente de Desconsideração de Demandas Repetitivas.

__________

1 Agravo de Instrumento nº 2230826-35.2016.8.26.0000 julgado, em 7/2/2017, pela 37ª Câmara de Direito Privado do TJ/SP. Cabe consignar que temos também decisões do TJ/SP favoráveis à condenação em honorários advocatícios, tal qual no Agravo de Instrumento nº 2240166-32.2018.8.26.0000 (28ª Câmara de Direito Privado) e no Agravo de Instrumento nª 2201737- 30.2017.8.26.0000 (22ª Câmara de Direito Privado)

2 EREsp 1.366.014/SP, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, CORTE ESPECIAL, julgado em 29/3/2017, DJe 5/4/2017.