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A EC 125 e a instituição do requisito da relevância nos recursos especiais

quinta-feira, 21 de julho de 2022

Atualizado em 20 de julho de 2022 18:48

A comunidade jurídica ficou em polvorosa com a publicação, em 15/7/22, da EC 125, que prevê "a relevância das questões de direito federal infraconstitucional discutidas no caso" como requisito de admissibilidade dos REsp.

Segundo o presidente do STJ: "A PEC corrige uma distorção do sistema, ao permitir que o STJ se concentre em sua missão constitucional de uniformizar a interpretação da legislação federal. O STJ, uma vez implementada a emenda constitucional, exercerá de maneira mais efetiva seu papel constitucional, deixando de atuar como terceira instância revisora de processos que não ultrapassam o interesse subjetivo das partes".1

É notório que o STJ recebe uma carga muito grande de processos, aproximadamente 10 mil novos processos por ministro a cada ano. Como o Tribunal permanece em recesso nos meses de janeiro e julho, temos uma média de 1.000 processos a serem julgados todo mês pelos ministros. Obviamente por mais que cada ministro possua muitos assessores, é um número que acaba inviabilizando grandes discussões nos casos julgados e que levou à criação do nefasto expediente da jurisprudência defensiva para a eliminação sumária de recursos.

Em artigo publicado anteriormente nessa coluna já tivemos oportunidade de defender "que se os Tribunais possuem muitos recursos a serem julgados, que se criem filtros objetivos para selecionar os recursos que devem ser julgados e os que não. O que não se pode admitir é a criação de armadilhas não previstas em lei ou exacerbando a previsão legal e que surpreendem diuturnamente a advocacia e o jurisdicionado."2

Portanto, se tivéssemos a substituição de um limitador recursal subjetivo e não previsto em lei por outro objetivo e com previsão legal teríamos realmente muito a comemorar. Entretanto, não se pode ser ingênuo e, pelo menos num primeiro momento, devemos ter esses dois limitadores trabalhando concomitantemente e barrando o julgamento da imensa maioria dos recursos. É de se esperar que com o tempo a relevância venha a cumprir o seu papel e a jurisprudência defensiva deixe de ser necessária para limitar o número de recursos a serem julgados no STJ.

Desde muito a doutrina entendia que seria necessária a instituição de um filtro também para o STJ3. Entretanto, sempre se discutiu quanto aos problemas que podem advir de tal limitação, já que ainda não temos a cultura de respeito aos precedentes arraigada em nosso ordenamento, a jurisprudência de nossos tribunais superiores ainda se altera com certa facilidade e o número de recursos especiais providos não se mostra desprezível4.

A grande discussão que se passou a travar é quanto ao termo inicial da necessidade da demonstração da relevância. De fato, no §2 introduzido pela EC 125 consta a expressão "nos termos da lei". Não obstante, estranhamente, o art. 2º da EC prevê que suas novas disposições se aplicam aos recursos especiais interpostos após início da sua vigência, que se deu com sua publicação em 15/7/22.

Parece clara a necessidade da edição de lei regulamentando a relevância nos recursos especiais, assim como aconteceu quando da instituição da repercussão geral. Portanto, tal requisito não poderia ser exigido de imediato5. Entretanto, cabe aos operadores serem cautelosos e fazerem desde já em seus recursos especiais um capítulo similar ao utilizado nos RE, para tratar da relevância das questões de direito federal infraconstitucional.

_____

1 Disponível aqui.

Publicação em 21/03/2019. Disponível aqui.

Nesse sentido é o entendimento de Carlos Frederico Bastos Pereira: "A introdução de um filtro recursal de admissibilidade nos recursos especiais mostra-se a saída para que o STJ se pronuncie apenas sobre questões federais infraconstitucionais dotadas de relevância e transcendência. Essa alteração poderá promover ganhos não só quantitativos, mas também qualitativos, na medida em que a Corte poderá dedicar seu tempo para julgamento de casos importantes ao desenvolvimento da ordem jurídica brasileira. (Revista Eletrônica de Direito Processual - REDP, Ano 13. Volume 20. Número 2. Maio a Agosto de 2019, p. 42).

4 Nesse sentido Marco Aurélio Serau Jr. E Denis Donoso mostravam essa preocupação desde o início da tramitação da PEC da Relevância: "Com efeito, o percentual de reforma de acórdãos está na média de 15%, o que já é um número elevado, em nosso sentir. Tais percentuais - pasme-se - conhece picos de 30 a 50% de reforma em relação a determinados Tribunais e matérias. Tal dado estatístico é mais do que suficiente para a manutenção do papel do recurso especial como mecanismo de controle dos Tribunais inferiores. Não pode haver dúvidas, em outras palavras, de que esse quadro exigiria maior cuidado em relação á tomada de posição quanto aos temas que seriam excluídos de apreciação pelo STJ, diante do reconhecimento da ausência de relevância das questões federais. Por fim, não é exagero agregar que as "engenharias jurídicas" cujo escopo é a redução do número de processos que sobrecarregam o Judiciário representam um remédio amargo e que nem sempre cura o paciente." (Relevância da Questão Federal como filtro de admissibilidade do Recurso Especial: Análise das Propostas de EC 209/12 e n. 17/13, in Revista de Processo, 224, outubro de 2013, p. 250).  

5 Nesse sentido é o entendimento do professor Elpídio Donizetti: "Calma.   A exigência do requisito da "relevância das questões de direito federal infraconstitucional" ainda vai demorar um pouco para ser implementada. Fica na dependência da edição da lei. Como já dito, certamente haverá alteração do CPC". Disponível aqui.