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O agravo de instrumento nas execuções fiscais de pequeno valor

quinta-feira, 15 de setembro de 2022

Atualizado às 07:41

O Estudo das Execuções Fiscais mostra-se importante, eis que aproximadamente 35% dos feitos em tramitação em nosso país são Execuções Fiscais. As Execuções Fiscais correspondem, por exemplo, a 57% do acervo de processos do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.1

E como é notório, em grande parte das Execuções Fiscais o valor cobrado é bastante baixo, muitas vezes sendo inferior ao próprio custo de tramitação do processo2.

 

Desse modo, continua relevante a previsão contida no artigo 34 da Lei de Execuções Fiscais:

"Art. 34 - Das sentenças de primeira instância proferidas em execuções de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTN, só se admitirão embargos infringentes e de declaração."3

 

Referida previsão sempre foi questionada por parte da doutrina4, entretanto, teve sua constitucionalidade reafirmada pelo Supremo Tribunal Federal, em 2011, ao julgar o Tema 408 de Repercussão Geral5.

 

Apesar da previsão legal prever a restrição de recursos em face da sentença, desde muito a doutrina vem entendendo que tal restrição também seria aplicável ao Agravo de Instrumento: 

"(...) é evidente que, eliminando o duplo grau no principal, não o manteve no secundário. Assim, não cabe, nas execuções de alçada, o recurso de agravo(...); em contrapartida, não precluem as decisões. O ideal da irrecorribilidade das interlocutórias se implantou indiretamente, devolvendo-se ao conhecimento do órgão julgador, nas execuções de alçada, através da interposição dos embargos infringentes, todas as questões porventura antes decididas e nele impugnadas."

(Araken de Assis, Manual da execução. 11ª ed., São Paulo: RT, 2007. p. 1.059 e 1.061.) 

"Voltou-se, assim, ao sistema de causas de alc¸ada, para as quais na~o vigora o duplo grau de jurisdic¸a~o por provocac¸a~o das partes.

Duas indagac¸o~es, pelo menos, suscita a inovac¸a~o em seus aspectos pra'ticos:

a) caberia agravo de instrumento das deciso~es interlocuto'rias nas causas de alc¸ada?

b) caberia o duplo grau de jurisdic¸a~o necessa'rio (antigo recurso ex officio)?

Parece-nos que ambos os expedientes esta~o implicitamente inadmitidos pela atual sistema'tica das causas de alc¸ada para as execuc¸o~es fiscais."

(Humberto Theodoro Júnior, Lei de Execução Fiscal, 13ª ed., São Paulo: Saraiva, 2016, edição eletrônica, p. 356/357)

Esse também era o entendimento da Súmula 259 do extinto Tribunal Federal da Recursos: 

"Não cabe agravo de instrumento em causa sujeita à alçada de que trata a Lei 6.825/80, salvo se versar sobre o valor da causa ou admissibilidade de recurso."

Tal entendimento continua sendo prestigiado pelas duas Turmas de Direito Público do Superior Tribunal de Justiça: 

"PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 50 ORTNS. ALÇADA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. APLICAÇÃO.

1. A execução judicial para cobrança da Dívida Ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e respectivas autarquias é regida pela Lei n. 6.830/1980 e, subsidiariamente, pelo Código de Processo Civil, conforme dispõe o art. 1º da referida Lei de Execução Fiscal.

2. O art. 34 da LEF estabelece o valor de alçada para eventual acesso ao segundo grau de jurisdição no montante de 50 (cinquenta) Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional - ORTNs.

3. Em interpretação sistemática do regramento legal, conclui-se pelo não cabimento do agravo de instrumento contra decisões interlocutórias na hipótese de a execução fiscal não alcançar o valor de alçada do art. 34 da Lei n. 6.830/1980, conforme antigo entendimento jurisprudencial sedimentado na Súmula 259 do ex-TFR.

4. Agravo interno não provido."

(AgInt no AREsp n. 1.831.509/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/9/2021, DJe de 7/10/2021.)

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. VALOR DA CAUSA INFERIOR A 50 ORTNS. ALÇADA. RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. NÃO CABIMENTO.

I - Na origem, trata-se de agravo de instrumento contra decisão que, em processo de execução fiscal, determinou a intimação da municipalidade para o recolhimento das despesas de citação postal, sob pena de extinção da ação executiva. No Tribunal a quo, não se conheceu do recurso.

II - Não havendo, no acórdão recorrido, omissão, obscuridade, contradição ou erro material, não fica caracterizada ofensa aos arts. 489 e 1.022 do CPC/2015.

III - A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao afirmar que não há recurso para a segunda instância quando o valor executado for inferior ao valor de alçada, de modo que, estando o valor da execução abaixo do estipulado, haverá exceção ao duplo grau de jurisdição, seja para a Fazenda Pública, seja para o executado.

Confiram-se: AgInt nos EDcl no AREsp 1.700.964/SP, relator Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, julgado em 24/8/2020, DJe 27/8/2020 e AgInt no AREsp 1.831.509/SP, relator Ministro Gurgel de Faria, Primeira Turma, julgado em 27/9/2021, DJe 7/10/2021.

IV - Recurso especial improvido."

(AREsp n. 1.751.847/SP, relator Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, julgado em 16/8/2022, DJe de 22/8/2022.)

No IAC no RMS 54712 / SP, a Primeira Seção, do Superior Tribunal de Justiça também decidiu que "Não é cabível mandado de segurança contra decisão proferida em execução fiscal no contexto do art. 34 da lei 6.830/80".

Desse modo, a limitação recursal imposta pela lei somente em face da sentença vem sendo estendida para também abranger o Agravo de Instrumento e mesmo o Mandado de Segurança cabendo ao jurisdicional ficar atento a tão extensão.

__________

1 Disponível aqui, p 171.

2 "De todo modo, com base nos dados fornecidos, é possível fazer constatações relevantes em relação a um dos problemas identificados: grande parte das execuções fiscais ajuizadas exige valores inferiores ao custo de tramitação do próprio processo de execução. A análise preliminar dos dados leva à conclusão de que é necessário alterar o sistema de cobrança de débitos, evitando-se ajuizamento de execuções fiscais que custarão mais do que o valor que se pretende cobrar." (Disponível aqui, p. 127)

3 "Valor de alçada: 50 OTNs. Para a atualização do valor de alçada, utiliza-se a sequência de indexadores OTN/BTN/INPC/UFIR, aplicando ainda o IPCA-E a contar de janeiro de 2000, data da última UFIR divulgada. Note-se que a UFIR foi extinta pela MP n. 1973-67, em 26 de outubro de 2000, mas vinha sendo fixada anualmente, sendo que seu último valor foi de R$ 1.0641, em 1o de janeiro de 2000. De rigor a utilização do IPCA-E a partir de janeiro de 2001 consoante a decisão do STJ no REsp 1.168.625, sujeito ao regime do art. 543-C do CPC, pois servia de parâmetro para a fixação da UFIR (vide adiante a ementa e os comentários sobre o critério adotado e os valores indicados em tal julgado). Não há como aplicar a SELIC porque esta abrange tanto correção como juros. A aplicação da TR, por sua vez, não recompõe sequer o processo inflacionário, além do que não encontra sustentação legal, na medida em que a atualização do valor da causa não corresponde à hipótese do art. 1o-F da Lei n. 9.494/97, com a redação da Lei 11.960/2009, que determina a utilização dos índices oficiais de remuneração básica e juros aplicados à caderneta de poupança para a atualização das condenações impostas à Fazenda Pública. Valor de alçada, atualizado pelo IPCA-E: jan/2018: R$ 1.020,16; jan/2017: R$ 990,26; jan/2016: R$ 934,74; jan/2015: R$ 844,09; jan/2014: R$ 785,87; jan/2013: R$ 742,45; jan/2012: R$ 701,91; jan/2011: R$ 658,73; jan/2010: R$ 622,66; jan/2009: R$ 597,64; jan/2008: R$ 563,27; jan/2007: R$ 539,72; jan/2006: 524,22; jan/2005: R$ 495,11; jan/2004: R$ 460,42; jan/2003: R$ 419,09; jan/2002: R$ 374,23; e jan/2001: R$ 348,08." (Leis de processo tributário comentadas: processo administrativo fiscal, protesto extrajudicial de títulos e execução fiscal / Leandro Paulsen, René Bergmann Ávila e Ingrid Schroder Sliwka - 9. ed. - São Paulo: Saraiva Educação, 2018, edição eletrônica, p. 760)".

 

4 "(...) se afirma sem susto a impropriedade do dispositivo. Não há de se conceber, ao menos na vigência da nossa Constituição, a possibilidade de se suprimir o direito de acesso ao Judiciário, seja em primeira ou segunda instância. A ampla defesa e o pleno direito de ação, se tomados como garantias efetivas, como demanda a moderna processualística, fulminam a legitimidade da limitação fundada no valor de alçada." (MARINS, James. Direito Processual Tributário Brasileiro - Administrativo e Judicial. 5. ed. São Paulo: Dialética, 2010. p. 678.).

5 "É compatível com a Constituição o art. 34 da lei 6.830/1980, que afirma incabível apelação em casos de execução fiscal cujo valor seja inferior a 50 ORTN."