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O recente julgamento do Tema 1.137 do STJ - A aplicação do art. 139, IV, do CPC/15

quinta-feira, 18 de dezembro de 2025

Atualizado em 17 de dezembro de 2025 10:14

O art. 139, IV, do CPC/15 dispõe que cabe ao magistrado determinar todas as medidas indutivas, coercitivas, mandamentais ou sub-rogatórias necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, inclusive nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária.

O tema desperta muitas polêmicas no Brasil

Vale lembrar que Teresa Arruda Alvim1 enfatiza a necessidade de o inciso IV do art. 139 do CPC/15 ser interpretado "com grande cuidado, sob pena de, se entender que em todos os tipos de obrigações, inclusive na de pagar quantia em dinheiro, pode o juiz lançar mão de medidas típicas das ações executivas lato sensu, ocorrendo completa desconfiguração do sistema engendrado pelo próprio legislador para as ações de natureza condenatória".

Flávio Luiz Yarshell2, ainda, doutrina que, quanto ao art. 139, IV, "será preciso cuidado na interpretação desta norma, porque tais medidas precisam ser proporcionais e razoáveis, lembrando-se que pelas obrigações pecuniárias responde o patrimônio do devedor, não sua pessoa. A prisão civil só cabe no caso de divida alimentar e mesmo eventual outra forma indireta de coerção precisa ser vista com cautela, descartando-se aquelas que possam afetar a liberdade e ir e vir e outros direitos que não estejam diretamente relacionados com o patrimônio do demandado".

O STF enfrentou o tema no julgamento da ADI n. 5941 no STF. Em controle concentrado de constitucionalidade, o STF, nos termos do voto do min. relator Luiz Fux, proclamou: "constitucional dispositivo do CPC que autoriza o juiz a determinar medidas coercitivas necessárias para assegurar o cumprimento de ordem judicial, como a apreensão da CNH - Carteira Nacional de Habilitação e de passaporte, a suspensão do direito de dirigir e a proibição de participação em concurso e licitação pública. A maioria do Plenário acompanhou o voto do relator, ministro Luiz Fux, para quem a aplicação concreta das medidas atípicas previstas no art. 139, inciso IV, do CPC, é válida, desde que não avance sobre direitos fundamentais e observe os princípios da proporcionalidade e razoabilidade (...). Ao votar pela improcedência do pedido, o relator ressaltou que a autorização genérica contida no artigo representa o dever do magistrado de dar efetividade às decisões e não amplia de forma excessiva a discricionariedade judicial. É inconcebível, a seu ver, que o Poder Judiciário, destinado à solução de litígios, não tenha a prerrogativa de fazer valer os seus julgados. Ele destacou, contudo, que o juiz, ao aplicar as técnicas, deve obedecer aos valores especificados no próprio ordenamento jurídico de resguardar e promover a dignidade da pessoa humana. Também deve observar a proporcionalidade e a razoabilidade da medida e aplicá-la de modo menos gravoso ao executado. Segundo Fux, a adequação da medida deve ser analisada caso a caso, e qualquer abuso na sua aplicação poderá ser coibido mediante recurso"3.

É bem de ver, portanto, que os princípios dos arts. 1, 8 e 805 do CPC/15 ficaram muito bem ressalvados pelo STF, tendo a corte suprema se limitado a dizer que a redação do art. 139, IV, do CPC/15 é constitucional, mas sendo ressalvada a importância do controle concreto de sua aplicação em cada situação jurisdicional, preservando-se sempre os princípios processuais e constitucionais insculpidos nos artigos acima referidos.

Daí a relevante recente posição do STJ fixada no Tema 1.137, referente ao julgamento do REsp 1.955.539/SP.

Vale lembrar que, como sabemos, a questão já vinha sendo enfrentada pela 3ª turma do STJ, merecendo destaque o julgamento do HC 558313/SP, tendo sido relator o ministro Paulo de Tarso Sanseverino:"Na linha do entendimento firmado, portanto, apenas diante da existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável, ou que vem adotando subterfúgios para não quitar a dívida, ao magistrado é autorizada a adoção subsidiária de medidas executivas atípicas, tal como a apreensão de passaporte, e desde que justifique, fundamentadamente, a sua adequação para a satisfação do direito do credor, considerando os princípios da proporcionalidade e razoabilidade e observado o contraditório prévio".

De forma similar, ressalta-se o julgamento do AgInt no REsp 1.837.680/SP, tendo sido relator o ministro Moura Ribeiro: "Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, as medidas de satisfação do crédito devem observar os princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, de forma a serem adotadas as providências mais eficazes e menos gravosas ao executado. Precedentes."

Em 23/4/2019, na apreciação do REsp 1.788.950/MT, tendo sido relatora a ministra Nancy Andrighi, julgou-se no sentido de que: "A adoção de meios executivos atípicos é cabível desde que, verificando-se a existência de indícios de que o devedor possua patrimônio expropriável,  tais  medidas  sejam  adotadas de modo subsidiário, por meio de decisão que contenha fundamentação adequada às especificidades da hipótese concreta, com  observância do contraditório substancial e do postulado da proporcionalidade."

E, de certa forma, seguindo as diretrizes da 3ª turma do STJ, a 2ª Seção do STJ, relativamente ao Tema 1.137, fixou que:

"Nas execuções cíveis, submetidas exclusivamente ao CPC, a adoção judicial de meios executivos atípicos é cabível desde que, cumulativamente: i) sejam ponderados os princípios da efetividade e da menor onerosidade do executado; ii) seja realizada de modo prioritariamente subsidiário; iii) a decisão contenha fundamentação adequada às especificidades do caso; iv) sejam observados os princípios do contraditório, da proporcionalidade, da razoabilidade, inclusive quanto à sua vigência temporal". 

Um ponto a ser destacado é que tanto no enfrentamento do tema pelo STF, no julgamento da ADI 5941, quanto na fixação das diretrizes constantes do Tema 1.137, pelo STJ, os critérios a serem adotados pelos magistrados ainda se mostram muito principiológicos e, de alguma maneira, abertos a diferentes interpretações nos casos concretos.

Esse fator demonstra que ainda teremos desafios a serem enfrentados, nas mais diversas execuções civis do país, quanto à forma pela qual a medida executiva atípica pode ser manejada de forma constitucional e atendendo aos princípios estruturantes do CPC/15.

As medidas executivas atípicas, naturalmente, são um aliado importantíssimo para o credor buscar a satisfação do seu crédito, e o enfrentamento do Tema 1.137 pelo STJ reforça a possibilidade do uso dessa ferramenta executiva prevista no CPC/15.

Mas, em uma crítica construtiva, o STJ poderia ter analisado a questão também sob a ótica das medidas executivas atípicas que possuem natureza mais voltada à busca de patrimônio do devedor. Vale aqui lembrar que, quando do julgamento da ADI 5941 no STF, a PGR já havia se posicionado no sentido de que o art. 139, IV, do CPC/15, deveria ser aplicado de forma eminentemente patrimonial.

Essas medidas executivas atípicas, mais voltadas ao patrimônio do devedor (bloqueio de pix, uso da CNIB, multa diária do art. 537 do CPC/15 sobre o valor da dívida, quebra de sigilo bancário, dentre outras), não necessariamente precisariam ser subsidiárias. Pelo contrário, por representarem ferramentas que almejam perseguir patrimônio do devedor, não haveria aqui justificativa para a subsidiariedade.

Foi essa a linha de raciocínio, aliás, no julgamento do Tema Repetitivo 769 pelo STJ, relativizando-se a excepcionalidade literal prevista no art. 866 do CPC/15.

Portanto, a 2ª Seção do STJ poderia ter fixado que a subsidiariedade valeria apenas para as outras técnicas atípicas que podem denotar alguma espécie de restrição de direitos, cuja aderência aos critérios constitucionais, legais e principiológicos do CPC/15 precisa mesmo ser examinada em cada caso concreto pelo magistrado.

Por fim, vale lembrar que medidas executivas atípicas são mais úteis quanto voltadas à busca patrimonial, já que o maior problema da execução é a falta de bens do devedor. De nada adianta manejar técnicas de coerção, de forma subsidiária, e ao fim da execução, se o devedor não tem patrimônio.

Precisamos ser mais rápidos na localização de bens do devedor.

_______

1 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins. RIBEIRO, Leonardo Ferres da Silva. TORRES de MELLO, Rogério Licastro. Primeiros Comentários ao Novo Código de Processo Civil. 1ª. Edição. São Paulo: RT, 2015. p. 264.

2 COELHO, Marcus Vinicius Furtado. MEDEIROS NETO, Elias Marques de. YARSHELL, Flávio Luiz. PUOLI, José Carlos Baptista. O Novo Código de Processo Civil: Breves Anotações para a Advocacia. Brasília: OAB, Conselho Federal, 2016. p. 28.

3 Disponível aqui.