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O que se esperar do compliance ambiental com a COP27

O mundo inteiro está voltado para a COP 27 - "Conference of the Parties", onde se aguarda, ansiosamente, quais serão as grandes definições e mudanças a serem implementadas de modo a impactar, de forma positiva, o nosso meio ambiente.

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

Atualizado às 10:35

As expectativas são boas, porém não podemos nos esquecer dos compromissos já assumidos, que devem ser observados com os padrões mínimos de governança e integridade que compõem o nosso compliance ambiental, ou accountability ambiental, termo utilizado por Gray (GRAY, Robert; OWEN, Dave; ADAMS, Carol. Accounting & Accountability: Changes and Challenges in Corporate Social and Environmental Publisher: Pearson Education Limited, Year: 2014 ISBN: 9780273681380,0273681389) para designar a responsabilidade de prestação de contas sobre a conduta ambiental de determinada organização.

Como se sabe, a preocupação com o meio ambiente não é em vão: a National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA) apontou, recentemente, que o nível de dióxido de carbono (CO2) medido em seu Observatório de Linha de Base Atmosférica Mauna Loa, no Hawaii, atingiu o seu pico em maio de 2022, em 421 partes por milhão, empurrando ainda mais a atmosfera para um território não visto há milhões de anos. De acordo com a NOAA, a poluição causada pelo CO 2 é gerada pela queima de combustíveis fósseis para transporte e geração elétrica, bem como pela fabricação de cimento, desmatamento, agricultura e muitas outras práticas, fazendo com que a atmosfera do planeta se aqueça de forma constante, o que desencadeia uma cascata de impactos climáticos, incluindo episódios de calor extremo, secas, incêndios florestais, inundações, precipitações mais pesadas, tempestades tropicais, dentre outros fenômenos. 

O Brasil assumiu importante participação nesse cenário [de responsabilidade ambiental] ao editar, no ano de 2009, a lei 12.187, de 29 de dezembro de 2009, que instituiu a Política Nacional sobre Mudança do Clima (PNMC), buscando ordenar as ações do governo brasileiro visando conciliar o desenvolvimento econômico-social com práticas, atividades e tecnologias de baixas emissões de gases. O PNMC tinha como meta a redução das emissões totais entre 36,10% a 38,90% até 2020 e compreende políticas que têm como um dos seus objetivos elevar a participação dos biocombustíveis na matriz energética brasileira.

No entanto, antes mesmo de atingir essa meta, já houve a edição de projeto de lei, para atualizar o PNMC ao Acordo de Paris (PL 6.359/2019).

A atual agenda global é materializada pela Agenda 2030, criada em 2015, quando a ONU propôs aos seus países membros uma nova agenda de desenvolvimento sustentável para os 15 anos seguintes. A Agenda 2030 é composta pelos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS). O cumprimento dessa Agenda representa um esforço conjunto de países, empresas, instituições e sociedade civil, nos objetivos relacionados à erradicação da pobreza, ao combate à desigualdade e da injustiça, à proteção do planeta e à utilização de energias renováveis, reafirmando uma visão do desenvolvimento como um processo contínuo, integrado e ético.

A Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) recepcionou essa agenda em seu relatório Better Policies for 2030, no qual se  dispõe a incorporar as metas nela estabelecidas em seus processos internos, por meio de quatro ações principais, quais sejam: i) aplicação das metas como guias para as estratégias e políticas da OCDE; ii) utilização dos dados da OCDE para auxiliar na análise da implementação da Agenda 2030; iii)aumento do apoio da OCDE para o planejamento e elaboração de políticas em nível nacional, fornecendo aos governos espaço para dividir suas experiências com a Agenda; e iv) inclusão da Agenda nas relações externas da OCDE.

Nesse contexto, o governo brasileiro realizou um estudo de planejamento para a expansão da oferta e demanda de energia até 2030, chamado de Plano Nacional de Energia 2030 (PNE 2030). Conforme conclusão de estudos realizados sobre a utilização de biocombustíveis, como discriminado no PNE 2030, existe o real potencial de reduzir as emissões associadas à queima de combustíveis fósseis, com resultados na economia brasileira da ordem de 2,56% até o ano de 2030.  Os resultados mostram, ainda, que, apesar de não parecer significativo, a substituição do uso dos combustíveis fósseis pelos biocombustíveis tem potencial para trazer efeitos positivos na economia brasileira, através do aumento de fatores primários abundantes, notadamente os ligados à produção agrícola, inclusive a agricultura familiar.

Registre-se que, tanto o meio ambiente equilibrado, como a dignidade da pessoa humana, constituem direitos garantidos pela Constituição Federal de 1988, de natureza fundamental, cabendo, portanto, ao Estado direcionar os órgãos e estruturas competentes para a prevenção, reparação e controle de danos, gerenciando os riscos de todas as ações que possam vir a atingir os legítimos interesses das gerações atuais e das futuras.

Isso é expresso na Conferência da ONU sobre o Ambiente Humano: "tanto as gerações presentes como as futuras tenham reconhecidas como direito fundamental a vida num ambiente sadio e não degradado" (ONU, 1972).

Destaca-se, ainda, que a implementação de uma Política de Responsabilidade Socioambiental também é determinante para as instituições financeiras e autorizadas a operar pelo Banco Central do Brasil, uma vez que este impõe diretrizes a serem observadas pelas instituições quanto à avaliação do grau de exposição ao risco socioambiental das atividades e das operações por elas desenvolvidas, para fins de concessão de investimentos (cf. Resolução 4.327/14). 

Portanto, a implementação adequada da Gestão de Riscos Ambientais possibilita manter a integridade do meio ambiente, zelar pelo desenvolvimento sustentável, consubstanciando importante ativo para investimento, sobretudo se considerarmos a possibilidade da chamada tríplice responsabilização ambiental, que abrange as esferas administrativas, penal e cível. Não por outra razão, JJ. Gomes Canotillho afirma que a sustentabilidade das decisões tomadas constitui um princípio geral do direito estruturante do direito constitucional, sendo um parâmetro válido de controle da governação pública. 

É o que se espera da COP 27: que sejam definidas metas importantes, mas, sobretudo, possíveis, a fim de que as mudanças a serem implementadas na realidade.

Vanessa Cerqueira Reis de Carvalho

Vanessa Cerqueira Reis de Carvalho

Sócia do escritório Medina Osório Advogados. Doutoranda em Direito Financeiro e Econômico Global pela Universidade de Lisboa. Procuradora do Estado do Rio de Janeiro.

Fernanda Ghiuro Valentini Fritoli

Fernanda Ghiuro Valentini Fritoli

Doutoranda em Direito Administrativo e mestre em Direito Constitucional pela PUC-SP. Professora (em estágio docente) na PUC-SP, no curso de graduação em Direito Administrativo. Professora de cursos de especialização. Sócia do escritório Fritoli & Moraes Advogados Associados.

Ana Claudia Consani de Moraes

Ana Claudia Consani de Moraes

Mestre em Direito do Estado pela USP. Especialista em Compliance, Ética e Antitruste. Sócia de Fritoli & Moraes Advogados Associados.

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