Alcance do PL da dosimetria não se limita a crimes do 8/1; entenda
Texto aprovado pela Câmara estabelece regras gerais de dosimetria e execução penal e gera debate sobre seus efeitos para outras condenações.
Da Redação
terça-feira, 16 de dezembro de 2025
Atualizado às 18:53
O Senado Federal pode votar nesta quarta-feira, 17, o projeto de lei 2.162/23 que altera os critérios de dosimetria e as regras de cumprimento da pena privativa de liberdade.
Conhecido como PL da dosimetria, o texto será analisado inicialmente pela CCJ - Comissão de Constituição e Justiça, antes de eventual deliberação pelo plenário.
Embora tenha ganhado repercussão por seu possível impacto sobre condenações relacionadas à tentativa de golpe, o projeto não restringe expressamente seu alcance aos crimes praticados em 8 de janeiro.
O texto aprovado pela Câmara estabelece regras gerais de dosimetria e execução penal, sem limitar de forma explícita a aplicação das novas normas a esse contexto específico, o que abriu espaço para debates de seus efeitos sobre outros crimes e condenações.
O que pode mudar?
O texto propõe mudanças estruturais nas regras de aplicação e execução das penas, ao modificar dispositivos centrais da lei de execução penal e do Código Penal. O texto altera os arts. 112 e 126 da LEP (lei 7.210/84) e insere os arts. 359-M-A e 359-V no Código Penal.
Uma das alterações está no critério de cálculo da pena quando mais de um crime é praticado dentro do mesmo contexto. O novo art. 359-M-A afasta a soma automática das penas, típica do concurso material, e passa a adotar o concurso formal próprio, por exemplo como tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático. Nesses casos, aplica-se apenas a pena do crime mais grave, com acréscimo que pode variar entre um sexto e metade, conforme avaliação judicial.
O projeto também cria o art. 359-M-B, que autoriza redução de pena quando o delito for cometido em meio a um grupo de pessoas. A diminuição pode alcançar até dois terços, desde que fique comprovado que o condenado não financiou nem exerceu papel de comando ou liderança na ação.
Veja:
No campo da execução penal, o art. 112 da lei de execução penal é reformulado para reafirmar a progressão de regime como regra, condicionada ao cumprimento de fração mínima da pena e à avaliação do comportamento do apenado.
O projeto fixa como parâmetro geral o cumprimento de um sexto da pena, mas cria percentuais mais elevados para situações específicas, conforme o tipo de crime, a reincidência, a existência de violência ou grave ameaça e o resultado da conduta.
As frações exigidas variam de 20% a 70% da pena, com critérios mais rigorosos aplicáveis a crimes hediondos, feminicídio, constituição de milícia privada e liderança de organização criminosa, além de hipóteses em que o livramento condicional fica expressamente excluído.
Confira:
"Art. 126. (....) § 9º O cumprimento da pena restritiva de liberdade em regime domiciliar não impede a remição da pena."
Emendas
Nesta semana, o PL recebeu emendas de senadores que buscam delimitar o alcance da proposta. Apresentadas pelos senadores Otto Alencar e Mecias de Jesus, as emendas restringem a aplicação das novas regras de dosimetria e execução penal aos crimes praticados no contexto dos atos de 8 de janeiro de 2023, relacionados a invasão, depredação ou dano a bens públicos ou privados.
Os textos vedam a extensão da lei a fatos diversos, ainda que semelhantes em tipificação, e, no caso da emenda de Mecias de Jesus, criam regra própria de progressão de regime para esses crimes, afastando a aplicação do art. 112 da lei de execução penal.
O relator da proposta na Câmara, deputado Paulinho da Força, afirmou que o texto foi elaborado com a colaboração de juristas e que não há risco de beneficiar criminosos comuns. Durante a sessão que aprovou a matéria, o parlamentar sustentou que a iniciativa se restringe aos fatos ocorridos em 8 de janeiro e que, segundo sua avaliação e a de especialistas consultados, o projeto não alcança crimes comuns.
Quais os efeitos?
Em entrevista à Agência Brasil, o professor de Direito da PUC/RS Rodrigo Azevedo destacou que o PL da dosimetria terá efeitos além dos casos relacionados aos atos de 8 de janeiro.
O especialista explicou que, ao estabelecer como regra geral a progressão após o cumprimento de 1/6 da pena e reservar percentuais mais elevados apenas para crimes violentos e hediondos, a proposta beneficia também condenados por crimes comuns.
"Isso representa um afrouxamento relevante em relação ao sistema atual, que exige 20% para primários e 30% para reincidentes, mesmo em crimes sem violência", afirmou Azevedo.
O professor também observou que a mudança afetaria diretamente condenados por crimes como roubo, que, de acordo com o novo texto, poderiam progredir após 25% da pena, enquanto, sob a legislação atual, o percentual é de 40%.
Origem do PL
O PL da dosimetria, em tramitação no Congresso, passou por mudanças relevantes ao longo de sua discussão. A proposta inicial previa anistia aos envolvidos na trama golpista, mas o texto que avançou na Câmara abandonou esse caminho e passou a tratar da reavaliação das penas impostas pelo STF aos condenados pelos atos de 8 de Janeiro, por meio de alterações nas regras de dosimetria e execução penal.
O texto original apresentado no Congresso previa o perdão a crimes de natureza política ou eleitoral praticados por manifestantes, caminhoneiros, empresários e demais participantes de atos realizados entre 30/10/22 e a entrada em vigor da lei, incluindo manifestações em rodovias, em frente a quartéis ou em qualquer local do território nacional.
Com a reformulação do projeto, a anistia foi retirada, e o foco deslocou-se para a redefinição de critérios legais que podem impactar a fixação e o cumprimento das penas aplicadas pelo Judiciário.





