Política, Direito & Economia NA REAL

Política & Economia NA REAL n° 8

8/7/2008

 

Queda nas bolsas : apenas o começo ?

É muito difícil estimar os efeitos que as expectativas sobre os fundamentos econômicos podem produzir sobre o mercado financeiro e de capital. Embora esta seja uma atividade corriqueira desde os menos sofisticados até os mais ativos centros financeiros mundiais é certo que as previsões sobre a economia e a sua correspondente repercussão sobre os mercados têm sido muito distante da realidade.

Apenas para citar um exemplo, a recente crise de crédito no setor imobiliário dos EUA foi vista até o início deste ano por alguns dos mais importantes analistas norte-americanos como algo "limitado e com pequenas possibilidades de provocar substantivos efeitos sobre a dinâmica econômica e sobre os mercados". Ora, agora se vê que a crise não somente é gritante como está arrastando algumas grandes instituições financeiras para o buraco.

No momento, a única coisa afirmativa e categórica possível de ser dita é que há uma considerável probabilidade de que a economia mundial, liderada pela queda da atividade econômica dos EUA (que representa 1/4 de toda a produção e consumo mundial), possa embarcar num período de recessão e de alta inflação.

Se essa possibilidade é elevada – e não há quem não negue isso no momento –, é igualmente provável que os diversos segmentos do mercado financeiro ainda não tenham refletido de forma, digamos, eficiente o que está a ocorrer. Apesar da queda ao redor de 20% nos mercados acionários norte-americanos desde o início da crise financeira em outubro passado, os indicadores das ações (um deles o índice Preço/Lucro) ainda estão altos e embutem expectativas de crescimento improváveis para os próximos trimestres e talvez anos. Ou seja, é possível que os mercados acionários ainda caiam muito mais para se ajustar à nova realidade que viveremos daqui para frente.

Emergentes : incólumes ?

Em larga medida a estabilidade dos países emergentes se deveu em função de uma alta significativa dos preços das commodities. Do leite aos produtos siderúrgicos, passando pelo petróleo, tudo subiu numa intensidade e velocidade absolutamente imprevistas. O "fator China" com seu crescimento estupendo é o fenômeno por detrás desta alta das commodities. Vale lembrar que a China não cresce sozinha: grande parte de sua produção é transferida para mercados consumidores, sobretudo os EUA.

Seria ilusório acreditar que o cadente poder de consumo americano não terá efeitos sobre o dragão chinês. Trata-se de aspecto vital para verificarmos a magnitude do efeito que atual crise terá sobre o conjunto dos países emergentes: de uma forma ou de outra todos os mercados emergentes têm-se beneficiado do "fator China". Da América Latina à Rússia. Da África ao Leste Europeu. Assim sendo, quem quiser não ser surpreendido pelo andamento dos mercados internacionais terá de ficar com o olho na América e outro na China. Aí está a chave para entender o que acontece no mundo de hoje.

Eleições sem internet ?

A grande novidade das eleições presidenciais nos EUA este ano é o uso intensivo da internet na campanha. E foi com a utilização inteligente dos recursos de comunicação que a rede mundial proporciona que Obama, conseguiu dobrar o establishment do partido, amplamente favorável a Hilary. Ele roeu as estruturas partidárias com a adesão dos eleitores não comprometidos com as cúpulas dirigentes. E ainda aumentou fantasticamente a arrecadação de recursos para a campanha com doações pessoais via internet.

Um movimento desses no Brasil, neste momento, em tese, parece impossível. Numa decisão em que mostrou seu total desconhecimento do que seja a internet, seu alcance, suas peculiaridades, o TSE equiparou a rede às emissoras de rádio e televisão e estendeu a ela as regras restritivas às campanhas eleitorais vigentes para os dois meios. Uma decisão tão lastimável do ponto de vista da liberdade de informação, quanto inútil.

Desemprego no longo prazo

Em mais um sinal de fraqueza do mercado de trabalho americano, o número de desempregados por mais de seis meses nos EUA se elevou para 1,6 milhão, 37% superior ao mesmo período do ano passado. Do total, 18% está buscando emprego há mais de seis meses. No início da última recessão em 2000 (depois da "bolha da internet"), este número era de 11%. Um mau sinal que está a indicar uma recessão mais severa ao que parece.

A China aperta os controles

A Administração de Capitais Estrangeiros do governo comunista chinês está criando novos controles para os exportadores do país. Antes de converter seus recursos em yuans, os exportadores passarão por uma auditoria. Para isso terão de abrir uma conta especial para se verificar se as transações são genuínas e se não há sub ou superfaturamento. O que está por detrás desta medida ? As preocupações das autoridades de que as transações de comércio estejam sendo utilizadas por investidores financeiros para levar dinheiro para a China de forma ilegal.

Lá, os investidores de fundos e os bancos têm restrições significativas para investir no mercado chinês o que não ocorre no setor de comércio exterior. Os chineses suspeitam que parte das exportações é utilizada para "disfarçar" fluxos financeiros. O excesso de dólares convertidos em moeda local está a pressionar a inflação que já atinge o patamar oficial (e duvidoso) de 7% ao ano.

O que ocorreria se os investidores financeiros sofressem restrições para investir no Brasil com o objetivo de evitar a sobrevalorização do real? A gritaria seria enorme.

Nervosismo com Cacciola

Não são apenas os prováveis carcerários de Salvatore Cacciola que estão ansiosos com a chegada do ex-banqueiro em terras (e prisões) brasileiras. Há uma gama de investidores, ex-autoridades de governo, profissionais do mercado de capitais, políticos e até professores universitários que muito inquietos com a chegada do homem acusado de gestão fraudulenta no Banco Marka. Se ele vai cumprir 13 anos de prisão não sabemos. Se ele vai ficar calado, é ainda mais difícil saber.

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De Roma a Tóquio apenas palavras

A Food and Agriculture Organization (FAO) promoveu há cerca de mês e meio em Roma uma reunião sobre os efeitos da elevação dos preços dos alimentos no mundo. Agora, os países do G-8 vão discutir o mesmo tema sob o patrocínio do Banco Mundial. Desta vez, as maiores preocupações desta reunião que ocorrerá em Tóquio são em relação à inflação. Assim como em Roma, tudo em Tóquio deve ficar parado em discursos e mais discursos.

O que dá para sentir claramente é que todos esses "Gês" da vida perderam grande parte de sua capacidade de encaminhar soluções para as novas crises que se apresentam na esfera global. A incapacidade de agir é total. O G-8 já começou como uma crônica de um fracasso anunciado.

Segundo um bom time de economistas, a crise econômica exige, por exemplo, uma ação coordenada dos Bancos Centrais na determinação das taxas. Mas quem fará esta coordenação. O banco central dos bancos centrais (BIS) limitou-se na semana passada a dizer que a situação é grave e a fazer alertas. É muito pouco para economias globalizadas e interdependentes.

Reformar esses organismos é uma questão política. Exige, portanto, lideranças incontrastáveis, uma mercadoria bem escassa na atualidade.

Do Brasil, também apenas palavras

Lula está prometendo mais um de seus discursos duros, de cobrança de ação dos países ricos no seu pronunciamento na reunião ampliada do G-8, em Tóquio. O Itamaraty e o ministério da Fazenda teriam preparado as propostas brasileiras para conter a especulação mundial com commodities, especialmente os alimentos. Segundo a visão brasileira, é a grande, se não a única, responsável para inflação mundial. O presidente cobrará também medidas mais efetivas contra o aquecimento global. Lula aproveitará o tema, o principal da conferência, para defender novamente o etanol como uma das soluções para o meio ambiente.

Dois diplomatas já fora da carreira, mas que preferem manter o anonimato, acreditam que a estratégia brasileira precisa ser mudada. Os discursos de Lula são ouvidos, elogiados, mas não surtem efeitos práticos. O caso do etanol é típico: é elogiado, sem resultados. Na realidade, há boicote. Na semana passada, vazou pelo Guardian um relatório do Banco Mundial dizendo que os biocombustíveis talvez sejam responsáveis por até 75% da alta nos preços dos alimentos. Isso, às vésperas da reunião que vai discutir alimentos e inflação mundial. Coincidência ? Onde foi parar aquela sugestão de Lula de taxar o comércio mundial de armas para financiar o combate à pobreza ?

O presidente e seus assessores para assuntos internos precisam acreditar menos na força das palavras. Aqui, internamente, pode funcionar. Não em foros onde só tem macaco velho.

Na Europa alta dos juros. E aqui ?

Jean-Claude Trichet, o presidente do Banco Central Europeu (BCE) deu a entender na sua tradicional entrevista após a reunião do comitê de política monetária que aumentou em 0,25% a taxa básica de juros nos países que adotam o euro como moeda que uma série de altas nos juros é improvável. Ninguém acreditou muito em função da elevação sistemática da inflação em todos os países europeus. A taxa de juros lá está agora em 4,25% ao ano e a inflação anualizada acima de 7%.

Por aqui, a inflação também anda "cantando pneus" e no BC já se discute elevações mais fortes, além de 0,5% a cada reunião. Isso já na próxima reunião do COPOM.

O BC continua esperando a ajuda de outras áreas do governo para não ter de dar pauladas mais pesadas nos juros. Tem recebido apenas promessas. O Fundo Soberano do Brasil, que seria parte dessa ajuda, no campo fiscal, parece pior que a encomenda. A entrevista do ministro Guido Mantega ao "Estadão" de domingo é um repositório de otimismo – não de realismo. A proximidade das eleições, como já era esperado, acelerou a liberação de recursos do Orçamento. O BNDES, para estranheza de muitos especialistas, manteve a TJLP em 6,25%, quase negativa. E a queda de braço das remarcações já está correndo solta no setor privado.

Petróleo : Irã é o próximo tema

Os especuladores que atuam no mercado de petróleo já elegeram o fator que influenciará mais os preços nas próximas semanas: o programa nuclear iraniano. Neste último fim de semana o governo islâmico de Teerã rejeitou a oferta européia para que deixasse de enriquecer urânio. Qualquer aumento de tensão no Oriente Médio vai se transformar em aumento forte no barril do petróleo. Mercado especulado é mercado sensível, como se sabe...

O teste para Dilma

O governo e o PT garantem que não querem que a eleição municipal se transforme numa preliminar de 2010, especialmente das eleições presidenciais.

Balela.

Para o partido e para o Planalto, outubro servirá como um grande teste para daqui a dois anos. O PT quer contabilizar sua força real, até para saber o quanto ainda será "lulodependente" em 2010. E o Palácio do Planalto põe as fichas da ministra Dilma Roussef na mesa, para testar a viabilidade de sua candidatura.

São dois movimentos paralelos, mas não necessariamente coincidentes. Se se sentir necessariamente fortalecido, o PT pode tentar sair com uma candidatura "própria", que não a de Dilma, francamente rejeitada por algumas alas petistas por seu estilo e por não ser "puro sangue" de origem.

Por outro lado, se Dilma cresce, ganha musculatura política, adquire um pouco mais de "cintura" para lidar com o mundo político e a mídia, a pretensão de Lula de fazer dela a candidata oficial à sua sucessão ficará facilitada. Assim, Dilma vai mesmo para os palanques, como não o fez na sucessão municipal anterior.

Por tudo isso, veremos muitas situações nessa campanha em que o PT vai estranhar mesmo é o PT.

Inflação ao modo do Brasil

No caso, não se trata da inflação habitual, a elevação dos preços, devidamente tratada em outra nota desta coluna. Trata-se de uma "inflação" tipicamente brasileira – a de candidatos. Segundo cálculos preliminares do TSE teremos cerca de 400 mil cidadãos disputando uma vaga de prefeito, vice-prefeito ou vereador nos pouco mais de 5.500 municípios. E isto porque a atividade política é um "sacrifício". Em tempos menos agitados já foi um sacerdócio. Para a população, cada vez mais desencantada com a política, parece mais uma "boquinha". Para mudar esse quadro, ensinam todos, somente uma ampla e irrestrita reforma política e partidária. Lula promete enviar uma nova proposta ao Congresso em agosto. Será a vigésima, trigésima, sei lá, dos últimos anos. Alguém ainda acredita que quem já está no jogo e ganhando vai mudar espontaneamente suas regras ?

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Colunista

Francisco Petros Advogado, especializado em direito societário, compliance e governança corporativa. Também é economista e MBA. No mercado de capitais brasileiro dirigiu instituições financeiras e de administração de recursos. Foi vice-presidente e presidente da seção paulista da ABAMEC – Associação Brasileira dos Analistas do Mercado de Capitais e Presidente do Comitê de Supervisão dos Analistas de Investimento. É membro do IASP - Instituto dos Advogados de São Paulo e do Corpo de Árbitros da B3, a Bolsa Brasileira, Membro Consultor para a Comissão Especial de Mercado de Capitais da OAB – Nacional. Atua como conselheiro de administração de empresas de capital aberto e fechado.