Porandubas Políticas

Porandubas nº 502

Ofuscada pelas Olimpíadas, a campanha eleitoral deste ano segue sem entusiasmo por parte do eleitor.

17/8/2016

Abro a coluna com "causos" contados pela nossa referência maior do folclore político, o amigo Sebastião Nery.

Frio aperto de mão

O deputado baiano mandou cartão de Natal para uma mulher que morrera há muito tempo. A família, irritada, retribuiu : "Prezado amigo, embora jamais o tenha conhecido durante os meus 78 anos de vida terrena, daqui de além-túmulo, onde me encontro, agradeço o seu gentil cartão de boas festas, esperando encontrá-lo muito em breve nestes páramos celestiais para um frio aperto de mão. Purgatório, Natal de 2005". O deputado recebeu a resposta. E espera, angustiado e insone, pelo aperto de mão.

Casa de tolerância

A vereadora Lígia Lessa Bastos, da UDN, fazia discurso contra o prefeito Negrão de Lima, enfrentando os apartes dos representantes governamentais. Resolveu não conceder mais apartes. Manoel Blásques insistia, mas dona Lígia se mantinha intransigente. Quando terminou o discurso, Manoel Blásques pediu a palavra pela ordem :

- Sr. presidente, estranho o comportamento da nobre colega Lígia Lessa Bastos, pois esta Casa é reconhecidamente uma casa de tolerância.

17 ou 27 ?

O Brasil conquistou 17 medalhas na Olimpíada de Londres, em 2012. A meta para a "nossa carioca Olimpíada" é de 27, 10 a mais. Mas a performance brasileira tem sido aquém das expectativas. Onde a situação está dando errada ? Falta de recursos, falta de organização, muita animação e pouca disposição atlética ? Há algo de muito errado. A espetacular abertura dos jogos ganha 10 com louvor. O mundo ficou deslumbrado. Já nosso desempenho é sofrível. Dá para recuperar até o final ?

Campanha eleitoral

Os candidatos a prefeito em 5.568 municípios ainda não descobriram como empolgar o eleitorado. Também, pudera. Os olhos do eleitor estão atentos à Olimpíada. E seu coração não se entusiasma com as eleições. A campanha começa a ganhar as ruas. Mas a recepção, regra geral, não tem sido tão entusiasmada. Nos ambientes internos, a animação da militância mostra, até, certo entusiasmo.

Radiografia da eleição

Teremos, este ano, cerca de 495,4 mil pré-candidatos a prefeito e vereador (nem todos foram registrados). Em 2012, foram 492,4 mil. Concorrerão nos 5.568 municípios, candidatos a 57.931 cadeiras de vereador, totalizando 69.067 vagas (mais prefeitos e vice-prefeitos). A taxa de candidatos a prefeito por vaga é de 2,5. E a de vereadores é de 6,4 por vaga. Serão 144,1 milhões de eleitores, crescimento de 4% em relação a 2012 e 12% em relação a 2008. 31% dos candidatos têm entre 40 e 49 anos. Entre 50 e 59 anos, a percentagem é de 24%. Servidores públicos somam 16.960 ; agricultores, 16.926 ; e comerciantes, 15.952. Cerca de 55% se identificam como brancos e 36% como pardos. Os homens formam a maioria, cerca de 70%. Os casados somam 56% e os solteiros chegam a 33%. São 35 partidos que disputarão as urnas. PMDB e PSDB terão o maior número de candidatos, o PMDB com 9,3% e o PSDB com 7,5%, com o PP na terceira colocação, 6,6%. O PT está na 8ª posição com 4,9% dos registros.

Mais eleitores que habitantes

Em 350 cidades brasileiras há mais eleitores que habitantes. A maior defasagem está numa cidade do Pará, Canaã dos Carajás, com 40 mil eleitores e 34 mil habitantes. Apesar dos avanços alcançados pela Justiça Eleitoral, há um buraco negro nas urnas dos fundões do país. Temos, ainda, um pedaço do velho Brasil.

41 estatais

Os governos Lula e Dilma, entre 2003 e 2015, criaram 41 estatais. A conta de prejuízo soma cerca de R$ 8 bilhões. Só com a folha de salários, o Tesouro bancou R$ 5,5 bilhões. Dinheiro a fundo perdido.

Temperatura ambiental

A temperatura do meio ambiente, medida pelo termômetro da política, começa a arrefecer. Já esteve nos 42º C, mas hoje oscila entre os 39ºC a 40ºC. A Olimpíada baixou um pouco a temperatura política. A 15 dias do desfecho do impeachment, até parece que a decisão já está cravada na mente das pessoas. A recorrência expressiva é a de que o jogo já está jogado, impressão que, segundo se lê, transborda do próprio espaço petista, onde os dirigentes se debruçam sobre as estratégias a serem estabelecidas para se alcançar um bom desempenho eleitoral.

Temperatura midiática

A mídia continua a abrir manchetes contra o governo, focando para recuos nas propostas de contenção de gastos, delações envolvendo figuras de proa, reforçando posições negativas a respeito da economia, em contraponto aos sinais que exibem volta da confiança dos agentes do mercado. Colunistas de política, mais que analistas da economia, mostram inclinação para acalentar a tese da catástrofe. Chamarizes estrondosos de revistas não ganham correspondência nas matérias internas, a denotar exagero. Blogs financiados com recursos públicos continuam a bater na tecla do "golpe". O fechamento de torneiras não os impede de prosseguir numa campanha visivelmente antigovernista.

Temperatura na área produtiva

Já nas frentes produtivas, o ânimo ganha volume, com a indicação de melhores expectativas para os próximos meses e até certa aposta em pequeno crescimento do PIB em 2017. Um dos maiores empresários brasileiros, em conversa com este consultor, traduz a expectativa : "há três trilhões de dólares vagando sobre o planeta. Se a economia brasileira caminhar na trilha da recuperação, parcela desses recursos certamente baixará por aqui. Pelos atrativos que o país oferece".

Temperatura na base

A pirâmide social mostra diferentes graus de temperatura. A base da pirâmide está preocupada com a sobrevivência, o cotidiano, as pressões do dia a dia. (Trata-se do contingente que age de acordo com a equação BO+BA+CO+CA= Bolso, Barriga, Coração, Cabeça). Para ele, a roubalheira iguala todos os políticos. Por isso, a base da pirâmide age com pragmatismo. Quer ver o melhor para sua vida. Tende a defender seus benfeitores e a condenar quem lhes dá as costas.

Temperatura na classe média

No meio da pirâmide, podemos ver três estratos : a baixa classe média, a média e a alta classe média. O segmento mais crítico está na média. Que se manifesta, forma opinião, tem uma avaliação dura dos governantes. Uma parte do meio - particularmente nas áreas do saber, das artes e da cultura - ainda pensa em um mundo bipolar, nós e eles, o socialismo clássico versus neoliberalismo. Esse grupo míngua a olhos vistos. Mas as camadas mais fortes do meio inserem os profissionais liberais. São os mais indignados contra o petismo/lulismo, principalmente na região Sudeste, onde se localizam as maiores classes médias, os maiores conjuntos de trabalhadores, os maiores núcleos estudantis, etc.

São Paulo, o epicentro

São Paulo, capital, é o maior território antipetista do país. Funciona como uma gigantesca pedra jogada no meio da lagoa. O ABC paulista, onde floresceu o petismo e onde mora Lula, tende a derrotar os candidatos petistas em outubro. Mesmo na USP, o petismo tem declinado. Na Unicamp, a academia na área econômica ainda abriga forte influência petista. Os movimentos sociais, divididos sobre o impeachment, refluem. Mesmo a corrente do MTST, liderada pelo polêmico Guilherme Boulos. As Centrais sindicais tendem, também, a procurar, cada uma, o seu rumo. A CUT, com seus longos braços nas comunidades bancária e metalúrgica, já não tem a força d'outrora. A Força Sindical, sob o comando do deputado Paulino, tem os dois olhos na grana. As Centrais lutam para manter as benesses junto ao Estado.

Nordeste, o bastião petista

Se o petismo perde força no Sudeste, ainda mantém forte influência no Nordeste, onde fincou estacas nas margens e no meio acadêmico. Nas margens, a continuação dos programas sociais poderá diminuir a força do petismo, mas nas Universidades núcleos do petismo resistem às mudanças. Aliás, as duas áreas mais ligadas ao petismo no país foram Educação e Cultura. O domínio das máquinas dos dois Ministérios pelo petismo foi uma constante nos últimos 13 anos. Mas é possível constatar uma reação dos setores de negócios, a par das classes médias, que também começam a reagir contra a partidarização do Estado.

Uma nova esquerda

Lerei com gosto o novo livro do senador Cristovam Buarque : "Uma Nova Esquerda e o Brasil que queremos". Ele está me mandando.

10 medidas

Tem gente querendo melar as 10 Medidas contra a Corrupção, que estão sendo examinadas em Comissão Especial da Câmara, cujo relator é o deputado Onyx Lorenzoni. Que se reuniu segunda-feira com o procurador Deltan Dallagnol e promete seguir à risca o roteiro traçado.

Evasão de divisas

O advogado Plínio Gustavo Prado Garcia, membro efetivo da Comissão Especial de Direito Penal Econômico da OAB/SP, alerta : "Pessoas residentes ou domiciliadas no Brasil, que mantenham contas bancárias ou outros ativos no exterior, podem ter problemas penais, sob acusação de evasão de divisas. Isso pode acontecer em quatro hipóteses : a) quando tenham feito transferências financeiras ao exterior sem utilizar-se de regular operação cambial ; b) quando saírem do país portando mais de R$ 10.000,00 em espécie (ou seu equivalente em moeda estrangeira) sem apresentar Declaração de Porte de Valores (DPV) na saída ; c) quando, mesmo valendo-se de regular operação cambial por meio de instituição autorizada a operar com câmbio, esses valores ao final de cada ano, superarem US$ 100.000,00, sem comunicar ao Banco Central do Brasil, no ano subsequente, o saldo desses valores em 31 de dezembro do ano anterior, e d) quando recebam, diretamente, no exterior e lá mantenham, valores superiores a US$ 100.000,00".

Como administrar uma crise

Fecho a coluna com algumas sugestões para os administradores de Crises - fontes, porta-vozes, interlocutores :

- Convocar a mídia e mostrar disposição para esclarecer os fatos.

- Caso houver dúvidas a respeito dos fatos, procurar, previamente, preencher todas as lacunas com informações, dados e abordagens adequadas.

- Evitar a postura do avestruz.

- Não temer entrar na arena de guerra (enfrentar a crise de frente, não de costas).

- Evitar dizer : "Não tenho nada a declarar".

- Evitar formação de redes informais - teia de boatos.

- Expressar as ideias com calma e segurança.

- Seja objetivo e conciso.

- Procurar o máximo de compreensão.

- Não tentar ser brincalhão, galhofeiro.

- Procurar evitar sofismas.

- Evitar trapacear os ouvintes com informações fantasiosas.

- Não deixar denúncias sem resposta.

- Não transmitir imagem de arrogante.

- Não procurar exagerar na diminuição / tentativa de atenuar os fatos - apresentar justificativa plausível - a tática de engodo será percebida.

Recomendações/sugestões :

- Prevenir é melhor que remediar.

- A verdade sempre aparece.

- Se um grupo dispõe de um sólido sistema de valores, as chuvas da tempestade não causam danos irreparáveis.

- Os valores são permanentes.

- As chuvas de tempestade são fortes, porém, passageiras.

- Estabelecer estreita articulação com editores, jornalistas especializados, cabeça da mídia.

- Estabelecer boa articulação com autoridades.

- Estabelecer articulação com setores, entidades, ONGs - representantes dos públicos atingidos.

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Colunista

Gaudêncio Torquato jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.