O fenômeno da adultização tão utilizada como a expressão do momento, a partir de sua viralização trouxe consigo um peso maior do que o seu conceito: a responsabilidade das plataformas digitais sobre o compartilhamento de conteúdos os quais, quando não viralizam pela baixa qualidade, podem viralizar pelo conteúdo extravagante, chegando a ser socialmente repudiado e atualmente criminalizado.
E isso ocorre em razão de toda a comoção gerada através do vídeo criado pelo youtuber Felipe Bressanim Pereira, também conhecido como Felca, o qual fez uma denúncia pontual sobre estes vídeos os quais, pela sinalização de alta relevância, amplifica a visibilidade para o público em geral. Os vídeos em questão tratam de exploração infantil, utilizando crianças e adolescentes para fazer vídeos de conteúdo nas redes sociais de temáticas adultas e conotações sexuais na maior parte das vezes.
Nesta semana, o influenciador digital que foi preso, acusado de tráfico de pessoas, exploração sexual de adolescente e trabalho infantil artístico, realizou grande parte destes vídeos e contava com a inacreditável marca de 17 milhões de seguidores. Tal número de seguidores pode não ter somente uma origem orgânica, mas ainda assim causa perplexidade. É como se muitos fossem omissos àquele conteúdo, quedando-se inertes, curiosos, talvez desinformados, mas passivos ao mal que tal conteúdo possa causar a vida das pessoas.
Um conteúdo online, ao ser produzido, quando gerado no intuito de “viralizar”, deve observar fatores como, por exemplo: os horários de maior tráfego na plataforma (timing), a boa produção do vídeo ou da postagem (qualidade), a maneira como o expectador, ou público direcionado poderá se identificar com aquele conteúdo e interagir com ele (engajamento) e a originalidade e a criatividade na elaboração do vídeo ou do post.
Do lado daquele que interage, temos o algoritmo que segue os primeiros passos em busca da viralização. Isso ocorre quando o conteúdo começa a ser compartilhado para usuários além daqueles que estão nos contatos de quem o produziu. Para cada usuário há o algoritmo responsável pela procura do padrão útil de interação e dos seus interesses. Na situação em questão, exploração sexual de crianças e de adolescentes atuando, agindo, se vestindo como adultos, os conteúdos chamam a atenção de criminosos, além de também chamarem a atenção de outras crianças e de outros adolescentes, incentivando a largarem a própria infância.
Existe uma complexidade em torno da construção da lógica destes algoritmos. Através dos sistemas de recomendação, é feita uma curadoria do que é visto a partir de padrões de consumo de perfis semelhantes às pessoas que costumam consumir aquele tipo de conteúdo. A lógica por trás disso vem da identificação de comunidades de gosto, o que significa dizer que a análise do perfil de um indivíduo se associa a um grupo semelhante a ele, e isso se chama princípio da recomendação ou da filtragem colaborativa.
Mas o maior problema da viralização é quando o conteúdo viralizado é de baixa qualidade, o que vem ocorrendo com grande frequência. E em uma sociedade tão tecnológica como a nossa é praticamente impossível proibir as crianças e os adolescentes de acessarem o ambiente digital. Eles são nativos digitais.
Infelizmente o incômodo global que tem como consequência a desinformação causada pela enorme quantidade deste conteúdo de baixa qualidade dentro das redes sociais é um problema de toda a sociedade que deve agir para fins de atribuir às plataformas, a responsabilidade sobre a disseminação desse tipo de conteúdo. Nesse sentido, a comunicação digital deve ser melhor direcionada.
E infelizmente, somente após a viralização do vídeo do influenciador “Felca”, as denúncias vieram a tona. Segundo dados da SaferNet Brasil, a partir da divulgação do vídeo, houve um aumento expressivo de 114% nas denúncias de pornografia infantil somente entre os dias 06 e 12 de agosto de 2025.
E as consequências para quem consome este tipo de conteúdo infelizmente é catastrófica, que podem trazer danos associados a transtornos psicológicos relacionados a percepções de si mesmo, comportamentos sociais inadequados, ansiedade, insatisfação corporal, erotização precoce, comportamento de risco, perda da infância, consumismo excessivo, dentre tantos outros fatores negativos que atrapalhem o processo de pensamento destes indivíduos que ainda não atingiram a maturidade.
As implicações futuras, a médico e a longo prazo, podem ser profundas, e a produção desses conteúdos não devem ter como objetivo central apenas a aquisição do lucro. Existe um futuro social e um interesse público muito maior e isso é interesse do Estado.
Atualmente, o Ministério Público pode investigar práticas algorítmicas que afetem direitos coletivos, como aqueles cujo conteúdo esteja relacionado a desinformação ou discriminação. Outro órgão fiscalizador que atua em prol dos usuários nestas plataformas é o SENACON - Secretaria Nacional do Consumidor o qual, verificando qualquer prática comercial abusiva ocasionada por meio da utilização de algoritmos direcionados, pode realizar a autuação imediatamemte.
A responsabilidade está nas mãos dos usuários e das plataformas e cada qual deverá responder conforme sua culpabilidade diante do cenário que se impõe: de um lado, as plataformas reguladas, com obrigações de transparência e controle por meio dos próprios usuários, que devem decidir pela personalização de recomendações proativas inserindo-se em filtragens colaborativas. Por outro, a constante vigilância por parte dos pais e responsáveis, quando diante de crimes como ode exploração sexual, que sejam informados e levem a diante a denúncia, pedindo a remoção de conteúdo e a responsabilização de quem detém a conta dentro da plataforma.