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Doença grave e Imposto de Renda: Guia prático para aposentados e pensionistas

Aposentados e pensionistas com doença grave têm direito à isenção do Imposto de Renda. Este guia explica doenças abrangidas, documentos, pedido no INSS, via judicial e restituição retroativa.

8/9/2025

Poucos aposentados e pensionistas sabem que podem estar pagando Imposto de Renda indevidamente mesmo após o diagnóstico de uma doença grave

A legislação brasileira, em especial o art. 6º, inciso XIV, da lei 7.713/1988, concede isenção tributária sobre os proventos de aposentadoria, reforma e pensão para determinadas enfermidades.

Essa previsão legal tem fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana e no reconhecimento de que quem enfrenta patologias graves arca com despesas significativas em tratamentos, exames e cuidados permanentes.

Apesar de ser um direito garantido por lei, muitos contribuintes continuam a recolher o tributo por falta de informação ou em razão de exigências burocráticas que dificultam o acesso.

Neste artigo, ofereço um panorama completo sobre a isenção do Imposto de Renda por doença grave: quais doenças estão abrangidas, como funciona o pedido administrativo, quais documentos são indispensáveis, em que situações é possível recorrer ao Judiciário e de que maneira é viável obter a restituição retroativa de até cinco anos dos valores pagos.

Doenças abrangidas pela isenção

A legislação brasileira estabelece um rol taxativo de doenças que autorizam a isenção. São elas:

Esse rol, ainda que fechado, vem sendo interpretado pelos tribunais de forma protetiva, ou seja, admite algumas exceções e algumas outras doenças podem vir a ser cobertas pela isenção.

STJ, por meio da súmula 627, consolidou o entendimento de que a isenção permanece mesmo quando a doença está controlada ou em remissão, afastando qualquer possibilidade de cancelamento do benefício pela simples ausência de sintomas.

Assim, o objetivo é garantir que a proteção não dependa da oscilação do quadro clínico, mas sim da gravidade da enfermidade em si.

Doenças não listadas, mas já reconhecidas judicialmente

A lei 7.713/1988 traz um rol taxativo de doenças que dão direito à isenção de IR (art. 6º, XIV). Contudo, a prática mostra que o Judiciário, em alguns casos excepcionais, vem ampliando a proteção para situações não expressamente previstas, sempre com fundamento na dignidade da pessoa humana, no caráter alimentar do benefício e na gravidade da enfermidade.

1. Alzheimer e outras demências degenerativas

2. Esclerose sistêmica e doenças autoimunes graves

3. DPOC - Doença pulmonar obstrutiva crônica severa

4. Doenças raras e degenerativas graves

5. Prótese cardíaca (como marcapasso ou válvula)

6. Prótese decorrente de câncer (ex.: mastectomia com reconstrução)

7. Próteses ortopédicas após acidentes ou doenças não listadas

Em resumo: o Judiciário não cria novas hipóteses além da lei, mas tem reconhecido a isenção para doenças não expressamente listadas, desde que possam ser enquadradas em categorias já previstas (ex.: Alzheimer; alienação mental; lúpus; moléstia grave autoimune semelhante à esclerose).

Documentação exigida

O ponto central para obtenção da isenção é a comprovação da enfermidade.

Administrativamente, exige-se laudo médico oficial expedido por serviço médico da União, estados ou municípios. Contudo, a jurisprudência ampliou esse requisito, admitindo que o laudo médico particular, desde que idôneo, seja suficiente na via judicial.

STJ consolidou esse entendimento na súmula 598, reconhecendo que impor exclusivamente laudos oficiais representaria barreira desproporcional ao exercício de um direito.

Além do laudo, são necessários documentos pessoais, comprovação da condição de aposentado ou pensionista e informes de rendimentos que demonstrem a incidência de Imposto de Renda.

Em resumo, é necessário:

  1. Laudo médico oficial: emitido por serviço médico da União, estados ou municípios.
  2. Documentos de identificação e comprovação da condição de aposentado/pensionista.
  3. Contracheques ou informes de rendimentos que demonstrem a tributação.
  4. Diagnósticos que comprovam a data da descoberta da doença.
  5. Declaração do IRPF do último ano.
  6. Documentos pessoais.

Onde e como pedir a isenção

O local para requerer a isenção varia de acordo com o regime previdenciário ao qual o aposentado ou pensionista está vinculado.

No caso dos beneficiários do INSS, o pedido deve ser feito por meio da plataforma Meu INSS, na opção “Solicitar isenção de Imposto de Renda”.

Já os aposentados e pensionistas vinculados a regimes próprios de previdência (como servidores públicos federais, estaduais ou municipais) devem protocolar o requerimento diretamente no órgão pagador da aposentadoria ou pensão.

Para os militares, o processo é conduzido no âmbito da Administração Militar.

Na maioria dos casos, a análise será precedida de perícia médica do órgão competente. E é justamente nesse ponto que muitos pedidos são indeferidos, seja porque a perícia considera o laudo insuficiente, seja porque interpreta de forma restritiva a legislação.

A via judicial e o direito ao retroativo

Na imensa maioria dos casos, o pedido é acolhido na esfera administrativa. Contudo, se houver indeferimento, a alternativa será recorrer ao Judiciário para assegurar o direito.

Importante esclarecer que o STF, ao julgar o RE 631.240 (Tema 350 da repercussão geral), entende que o ajuizamento dessas ações não exige prévio requerimento administrativo, firmando a tese de que o portador de doença grave pode ir diretamente ao Judiciário, sem a necessidade de aguardar análise administrativa.

A ação judicial tem como objeto tanto a suspensão imediata da cobrança do Imposto de Renda, mediante pedido de tutela de urgência, quanto a restituição dos valores pagos nos últimos cinco anos.

Na prática, a devolução retroativa pode alcançar quantias expressivas. Imagine-se o caso de um aposentado que paga R$ 2.000,00 de IR por mês e descobre, quatro anos após o diagnóstico de câncer, que teria direito à isenção. Nesse cenário, ele pode reaver cerca de R$ 96.000,00, acrescidos de correção e juros.

É uma reparação não apenas econômica, mas de justiça fiscal, uma vez que o tributo jamais deveria ter sido recolhido.

A jurisprudência do STJ também reforça a proteção ao contribuinte.

Além da súmula 598, que admite laudo particular, os tribunais vêm reconhecendo o caráter alimentar do benefício, o que justifica a concessão de liminares para cessar imediatamente a tributação.

Perguntas comuns

1. Quais doenças garantem a isenção?

A lista da lei 7.713/1988, incluindo câncer, AIDS, cardiopatia grave, Parkinson, entre outras.

2. É preciso estar em tratamento ativo?

Não. Mesmo em remissão, a isenção se mantém, segundo a súmula 627/STJ.

3. Onde fazer o pedido?

No Meu INSS, para segurados do regime geral, ou no órgão pagador para regimes próprios.

4. Laudo particular é válido?

Administrativamente, não. Judicialmente, sim, conforme a súmula 598/STJ.

5. O que é o laudo oficial?

É o documento médico emitido por um serviço médico oficial da União, dos estados, do Distrito Federal ou dos municípios, atestando que o segurado é portador de uma das doenças listadas no art. 6º, XIV, da lei 7.713/1988.

6. Como obter o laudo oficial?

Aposentados e pensionistas do INSS devem solicitar pelo Meu INSS, onde é marcada perícia médica que gera o laudo eletrônico. Já servidores públicos precisam passar pela junta médica do órgão pagador, enquanto os militares são avaliados pela Administração Militar, também por junta médica oficial.

7. Qual a validade do laudo?

Para doenças incuráveis, o laudo é definitivo. Nas demais, pode haver prazo para reavaliação. Mesmo em remissão, a isenção se mantém, conforme Súmula 627 do STJ.

8. E se o laudo for negado?

Caso o serviço médico oficial não reconheça a doença, ainda assim é possível ingressar judicialmente com laudos particulares, já que o STJ (Súmula 598) admite esses documentos como prova válida em juízo.

9. Tenho direito à restituição?

Sim, dos últimos cinco anos, contados a partir do diagnóstico ou do pedido.

10.Posso acumular esse benefício com outros?

Sim, a isenção não afasta outros direitos previdenciários ou tributários.

11. Posso ter o pedido negado?

Sim, mas nesse caso é possível buscar o reconhecimento judicial.

12. Quanto tempo demora o processo judicial?

O tempo do processo judicial para reconhecimento da isenção de IR por doença grave varia conforme a Justiça (Federal ou Estadual, a depender do órgão pagador) e a complexidade do caso. Em média, o processo judicial pode trazer alívio rápido: a liminar costuma sair em 1 a 3 meses, suspendendo os descontos. Já a decisão final e a restituição retroativa levam em média 2 a 5 anos.

13. A partir de quando a isenção é válida?

O direito à isenção passa a valer a partir da data do diagnóstico da doença, ainda que o pedido seja formalizado posteriormente. Contudo, quando o diagnóstico for anterior à aposentadoria, a isenção só se aplica a partir da data em que o benefício previdenciário foi concedido.

Conclusão

A isenção do Imposto de Renda para aposentados e pensionistas com doença grave é uma conquista legal e jurisprudencial de enorme relevância social.

Apesar de expressamente prevista em lei, ainda exige atenção, informação e, muitas vezes, atuação judicial para ser efetivada.

Ao conhecer seus direitos, reunir a documentação correta e acionar as vias adequadas, o contribuinte não apenas interrompe descontos indevidos, mas também pode recuperar valores pagos ao longo de anos.

Trata-se de medida de justiça fiscal e dignidade, que garante maior tranquilidade financeira a quem já enfrenta os desafios de uma enfermidade grave.

Aline Vasconcelos
Advogada especialista em Direito da Saúde, com 15 anos de experiência na defesa de pacientes contra planos de saúde e na garantia de acesso a tratamentos e direitos essenciais.

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