Migalhas de Peso

Gestão dos recursos do Fundeb: Diretrizes jurídicas e recomendações às prefeituras.

O gestor que não se atentar para os procedimentos técnicos de gestão dos recursos do Fundeb pode praticar ato de improbidade administrativa.

8/9/2025

Introdução

A correta gestão dos recursos do Fundeb - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação constitui obrigação constitucional e legal dos entes federados, tendo em vista o caráter fundamental do direito à educação e a vinculação orçamentária que lhe dá sustentação.

nota técnica 02/25, emitida em março deste ano pelo Grupo de Trabalho Interinstitucional FUNDEF/FUNDEB da 1ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF - Ministério Público Federal, estabelece diretrizes normativas para Estados e municípios no tocante à movimentação dos recursos, em especial quanto à necessidade de conta única e específica, de titularidade da Secretaria de Educação, em consonância com a lei 14.113/20 (Novo Fundeb), com a Constituição Federal e com as Portarias do FNDE.

O presente artigo analisa os fundamentos jurídicos da nota técnica, destacando as obrigações dos gestores municipais e apontando medidas práticas a serem adotadas pelas prefeituras para assegurar conformidade com o arcabouço normativo e prevenir responsabilizações indesejadas.

Fundamentos constitucionais e legais

O MPF enfatiza que a educação é direito fundamental indisponível, vinculado ao princípio da dignidade da pessoa humana (art. 1º, CF) e garantido pelos arts. 205 a 214 da Constituição. A jurisprudência do STF reforça o dever estatal de propiciar meios que viabilizem o seu exercício.

Em âmbito legal, acerca da gestão dos recursos da educação, destacam-se as seguintes normas:

- Lei 14.113/20, alterada pela lei 14.325/22 (lei do novo Fundeb):

- Portaria FNDE 807/22 (com alterações das portarias 624/23 e 653/24):

- Portaria conjunta STN/FNDE 3/22:

Além disso, a lei de responsabilidade fiscal (LC 101/00, art. 8º, parágrafo único) determina que recursos vinculados a finalidade específica não podem ser utilizados para outro fim, ainda que em exercício diverso.

Diretrizes para a gestão municipal dos recursos

A nota técnica estabelece pontos centrais que devem ser observados:

1. Abertura de conta única e específica no Banco do Brasil ou Caixa para os recursos ordinários do Fundeb;

2. Abertura de conta separada para recursos extraordinários (precatórios);

3. Movimentação privativa do Secretário de Educação ou dirigente máximo da pasta, admitida a assinatura com o Chefe do Executivo;

4. Proibição de transferências indevidas para outras contas, salvo para pagamento de salários quando houver contrato com banco diverso (art. 21, § 9º, lei 14.113/20);

5. Proibição de saques em espécie e obrigatoriedade de movimentação eletrônica;

6. Titularidade das contas vinculadas ao CNPJ próprio da Secretaria de Educação, com natureza jurídica de órgão público;

7. Obrigação de registrar e atualizar dados no Sistema de Informações sobre Orçamentos Públicos em Educação (SIOPE), garantindo transparência e rastreabilidade;

8. Inclusão de cláusulas obrigatórias em licitações e contratos bancários envolvendo folha de pagamento da educação.

O descumprimento dessas diretrizes pode caracterizar ato de improbidade administrativa (lei 8.429/1992, art. 10, XI) e ensejar intervenção estadual em Municípios (art. 35, III, CF), além de sanções de órgãos de controle.

Recomendações práticas às prefeituras

Considerando o teor da nota técnica e as determinações da legislação vigente, recomenda-se que as prefeituras adotem imediatamente as seguintes providências em suas estruturas:

1. Revisem a estrutura bancária existente, garantindo que os recursos do Fundeb estejam em conta única e exclusiva no Banco do Brasil ou Caixa;

2. Providenciem abertura de conta específica para precatórios do Fundef/Fundeb, na mesma agência da conta principal;

3. Verifiquem o CNPJ da Secretaria de Educação, regularizando-o junto à Receita Federal, quando necessário, para garantir a titularidade correta das contas;

4. Implementem controles internos eletrônicos, assegurando que movimentações sejam rastreáveis e compatíveis com o SIOPE;

5. Atualizem permanentemente os dados bancários no SIOPE, em caso de alteração de domicílio bancário ou instituição pagadora;

6. Capacitem servidores da área financeira e da educação, prevenindo falhas na execução orçamentária e financeira;

7. Incluam cláusulas específicas em licitações e contratos bancários, garantindo o cumprimento das normas federais sobre a gestão do Fundeb;

8. Elaborem relatórios periódicos de conformidade, a serem encaminhados aos órgãos de controle (MPF, FNDE e Tribunais de Contas).

Conclusão

A nota técnica 02/25 do MPF reforça que a gestão do Fundeb deve se pautar pela legalidade, transparência e rastreabilidade, assegurando que cada recurso público seja aplicado exclusivamente na manutenção e desenvolvimento da educação básica.

Para os municípios, o cumprimento das medidas propostas não se trata apenas de uma mera formalidade burocrática, mas de condição essencial para garantir a efetividade do direito à educação e evitar responsabilizações jurídicas, que podem ser bastante severas ao gestor/ordenador.

Portanto, é imperativo que as prefeituras promovam a imediata adequação de seus procedimentos de gestão financeira do Fundeb, consolidando práticas de governança que assegurem a correta aplicação erastreabilidade dos recursos, bem como o fortalecimento da política pública educacional.

Gustavo Bottós de Paula
Advogado formado pela Universidade Federal do Mato Grosso do Sul. Pós-graduado em Direito Público, Civil e Processual Civil. Diretor-Geral do Hospital e Maternidade Dona Regina, em Palmas, Tocantins.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Abertura de empresas e a assinatura do contador: Blindagem ou burocracia?

3/12/2025

Como tornar o ambiente digital mais seguro para crianças?

3/12/2025

Recuperações judiciais em alta em 2025: Quando o mercado nos lembra que agir cedo é um ato de sabedoria

3/12/2025

Seguros de danos, responsabilidade civil e o papel das cooperativas no Brasil

3/12/2025

ADPF do aborto - O poder de legislar é exclusivamente do Congresso Nacional

2/12/2025