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Fui induzido a contratar um pacote de resort e me arrependi e agora?

Foi induzido a contratar um pacote de resort e se arrependeu? Saiba que é possível cancelar o contrato, reaver os valores pagos e ser indenizado.

3/12/2025

Você já participou de um evento de vendas de resort, com promessas de hospedagens de luxo, descontos imperdíveis e até bebidas à vontade e, no dia seguinte, percebeu que assinou um contrato que não fazia sentido?

Pois saiba que milhares de consumidores estão na mesma situação, e a Justiça tem reconhecido o direito de cancelar o contrato e reaver todos os valores pagos em dobro quando há indução ao erro e abusividade.

Neste artigo, é explicado de forma detalhada como funciona a anulação de contratos de multipropriedade (resorts e tempo compartilhado), quais são os direitos do consumidor e o que fazer se você caiu em uma venda agressiva ou enganosa.

O que é multipropriedade e como funciona esse tipo de contrato

A chamada multipropriedade imobiliária, também conhecida como tempo compartilhado, é uma modalidade em que o consumidor compra o direito de uso de um imóvel turístico por determinado período do ano.

Na teoria, parece uma boa ideia: férias garantidas, estrutura de alto padrão e a possibilidade de usar ou trocar pontos por hospedagens em outros destinos.

Entretanto, muitos consumidores descobrem, após a assinatura, que os custos são altíssimos, as regras de uso são restritivas e o cancelamento é quase impossível.

O problema se agrava quando o contrato é assinado em eventos de venda com forte apelo emocional, com oferta de bebidas alcoólicas, música e promessas de vantagens exclusivas. Foi exatamente o que ocorreu com diversos clientes da WISH S.A., empresa que hoje responde a inúmeras ações judiciais em todo o Brasil.

O direito de arrependimento no CDC

O art. 49 do CDC é um dos pilares de proteção ao consumidor nesses casos.

Ele garante que toda contratação feita fora do estabelecimento comercial como em feiras, hotéis, resorts e eventos de venda pode ser cancelada em até 7 dias, com devolução total dos valores pagos.

“O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 (sete) dias a contar de sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a contratação ocorrer fora do estabelecimento comercial.”

Isso significa que, se o contrato foi assinado em um evento de vendas, o cliente tem direito de arrependimento sem precisar justificar.

A empresa, entretanto, deve restituir integralmente o que foi pago, sem cobrar multas ou taxas. Recusar esse direito é prática abusiva e fere frontalmente o CDC.

Vício de consentimento: Quando o consumidor é induzido ao erro

O vício de consentimento ocorre quando o consumidor é levado a assinar o contrato sem plena consciência das condições ou das consequências jurídicas. Isso acontece quando há erro, dolo, coação ou influência externa que afete a liberdade da vontade.

O art. 138 do CC prevê que um contrato é anulável quando a vontade for manifestada por erro substancial.

Em eventos de multipropriedade, é comum o uso de estratégias como:

Essas práticas tiram do consumidor a capacidade de decidir livremente, configurando vício de consentimento e justificando a anulação judicial do contrato.

Cláusulas abusivas e taxas de cancelamento exageradas

Outro ponto recorrente nesses contratos são as cláusulas abusivas de cancelamento, que preveem multas entre 20% e 40% do valor total. O art. 51, IV, do CDC torna nulas essas cláusulas por violarem a boa-fé e gerarem desequilíbrio contratual.

“São nulas de pleno direito as cláusulas que estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas ou que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada.”

Quando há cancelamento antes do uso do serviço, a empresa não pode reter mais do que 10% e, em muitos casos, não pode reter nada.

Assim, qualquer cláusula que imponha multa desproporcional ou impeça o direito de arrependimento é nula de pleno direito.

Repetição de indébito: Quando o consumidor tem direito à devolução em dobro

O art. 42, parágrafo único, do CDC garante que o consumidor cobrado ou lesado em valor indevido tem direito à devolução em dobro, acrescida de juros e correção monetária.

“O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, salvo hipótese de engano justificável.”

Quando a empresa age de má-fé, retendo valores mesmo após o cancelamento, aplica-se esse dispositivo. Em inúmeros processos, a WISH S.A. foi condenada a devolver em dobro os valores pagos e a indenizar por danos morais.

Essa penalidade tem o objetivo de inibir práticas reincidentes e reparar integralmente o dano financeiro do consumidor.

Casos envolvendo WISH S.A. e Surfland: Um padrão de abusos

Os casos revelam um padrão setorial de abusividade, com:

Os tribunais já consolidaram o entendimento de que tais práticas são contrárias ao CDC e violam o direito básico à informação e à liberdade contratual.

As decisões mostram que o consumidor pode e deve buscar a Justiça para cancelar o contrato e exigir devolução total ou em dobro do que pagou.

Decisões judiciais Contra a WISH S.A.

A WISH S.A. já responde a inúmeras ações judiciais com o mesmo objeto: venda de cotas de resort com indução ao erro e cláusulas abusivas.

Um dos casos paradigmáticos foi julgado pelo TJ/PR - Tribunal de Justiça do Paraná:

TJ/PR – 12ª Câmara Cível – apelação cível 000XXXX-60.2022.8.16.0190 – relator desembargador Tito Campos de Paula – j. 5/2/24 “Contrato de multipropriedade (Wish S.A.) firmado em evento de marketing com oferta de bebidas alcoólicas. Vício de consentimento configurado. Multa abusiva. Restituição integral dos valores pagos e indenização por danos morais.”

Esse precedente é idêntico ao caso de diversos consumidores que buscaram o cancelamento após perceberem o caráter enganoso das promessas. A decisão reforça que o contrato é nulo ou anulável, e que a empresa deve devolver os valores e reparar o dano moral.

O que fazer se você foi induzido a assinar esse tipo de contrato

Se você se arrependeu após assinar um contrato de multipropriedade, siga estes passos:

  1. Reúna documentos e comprovantes de pagamento (contrato, recibos, prints de mensagens e e-mails);
  2. Envie uma notificação extrajudicial à empresa, exigindo o cancelamento e restituição dos valores;
  3. Registre boletim de ocorrência se houve coação, engano ou consumo de álcool durante a negociação;
  4. Busque orientação jurídica especializada o quanto antes, para garantir a proteção dos seus direitos;

Essas medidas fortalecem a prova de vício de consentimento e má-fé empresarial, acelerando a resolução judicial.

Por que procurar um advogado especialista

Casos envolvendo contratos de multipropriedade exigem atuação técnica e experiência prática. Um advogado especializado em Direito do Consumidor e Bancário poderá:

Se você foi induzido a assinar um contrato de resort, multipropriedade ou tempo compartilhado e está enfrentando dificuldade para cancelar, não aceite o prejuízo. A Justiça tem reconhecido que essas práticas violam o CDC e configuram abuso de confiança.

Kelton Aguiar
Advogado Desde 2008 Formado pela Universidade Federal de Santa Catarina Experiência em mais de 2.000 ações judiciais ESPECIALISTA EM DIREITO BANCÁRIO OAB/SC 27135 e OAB/SP 386.554 @meuadvogadobancario

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