1. Introdução
A carga tributária no Brasil é um tema recorrente de debate, caracterizada por padrões elevados de arrecadação e desafios na eficiência do gasto público. Atualmente, o Brasil apresenta uma das mais altas cargas tributárias entre as economias em desenvolvimento, atingindo cerca de 32,32% do PIB em 2024 (https://www.gov.br/tesouronacional e https://observatorio-politica-fiscal.ibre.fgv.br), superando a média de países com nível econômico similar. Esse panorama é acompanhado por críticas à chamada "sanha arrecadatória" do governo Federal, que reflete a busca incessante por maior arrecadação sem avanços proporcionais em responsabilidade fiscal e eficiência pública.
Este artigo tem como objetivo analisar a evolução histórica da carga tributária (https://www.ibpt.org.br e https://rbgdr.net) no Brasil e suas implicações econômicas e sociais. Também serão exploradas a relação entre a sanha arrecadatória e a falta de responsabilidade fiscal, além de serem apresentadas propostas para reverter essa dinâmica prejudicial e promover um ambiente tributário mais justo, eficiente e transparente.
2. A evolução da carga tributária no Brasil
2.1 Marcos históricos da tributação brasileira
O atual sistema tributário brasileiro resulta de uma série de transformações históricas, marcadas por adaptações às necessidades de arrecadação do Estado em distintas épocas. Entre os principais marcos históricos, destacam-se:
- Período colonial e imperial: A tributação no Brasil surgiu como instrumento para sustentar a metrópole portuguesa, sendo centrada em tributos sobre a produção agroexportadora. Esses impostos tinham caráter regressivo, penalizando mais intensamente os pequenos produtores.
- República velha (1889-1930): A transição para impostos sobre consumo e renda marcou os primeiros esforços para diversificar a base arrecadatória. Entretanto, a carga tributária ainda recaía de forma desproporcional sobre setores menos organizados.
- CF/88: Este foi um marco fundamental que consolidou o atual sistema tributário, organizando competências tributárias para União, Estados e municípios. A ênfase em tributos indiretos, como ICMS e PIS/Cofins, resultou em alta complexidade tributária, criando desafios para o desenvolvimento econômico.
Desde os anos 1990, a carga tributária cresceu rapidamente, em grande parte para financiar despesas sociais, previdenciárias e de infraestrutura. Apesar do aumento significativo da arrecadação, a eficiência do gasto público continua limitada.
2.2 A regra atual e sua complexidade
Com mais de 90 tributos em vigor, o Brasil é apontado como um dos países com maior complexidade tributária no mundo, segundo o relatório Paying Taxes 2024, elaborado pelo Banco Mundial. Essa complexidade não apenas aumenta os custos de conformidade tributária, como também desestimula o empreendedorismo e a competitividade empresarial.
3. A relação entre sanha arrecadatória e falta de responsabilidade fiscal
3.1 O ciclo vicioso entre arrecadação e déficit
A elevação da carga tributária no Brasil está profundamente vinculada à ausência de uma gestão fiscal eficiente. A "sanha arrecadatória" se materializa quando o governo Federal, em vez de implementar cortes estruturais em gastos ineficientes, prefere criar ou aumentar tributos para suprir déficits fiscais.
- Expansão dos gastos públicos: Mais de 33% das despesas públicas Federais estão alocadas em previdência e folha de pagamento, muitas vezes desprovidas de planejamento estratégico.
- Ineficiência alocativa: Apesar da alta carga de tributos, setores essenciais como saúde, educação e infraestrutura continuam subfinanciados ou geridos de maneira ineficaz.
Esse cenário alimenta um ciclo de déficits crescentes, ampliando ainda mais a pressão por maior arrecadação e criando distorções econômicas e sociais.
3.2 Regressividade do sistema tributário
O sistema tributário brasileiro é amplamente reconhecido como regressivo, uma vez que quase 50% da receita tributária decorre de impostos indiretos, como ICMS, aplicados ao consumo. Isso significa que os estratos mais pobres da população são proporcionalmente mais onerados, ampliando a desigualdade social.
4. Consequências econômicas e sociais da elevada carga tributária
4.1 Impactos econômicos
- Desestímulo ao investimento empresarial: Empresários enfrentam uma carga tributária que ultrapassa 40% do lucro das empresas, incluindo impostos sobre a distribuição de dividendos. Esse cenário desestimula a atração de investimentos estrangeiros e compromete a competitividade no mercado global.
- Complexidade administrativa: As empresas brasileiras gastam, em média, 1.501 horas por ano somente para lidar com obrigações tributárias, de acordo com o Banco Mundial, colocando o Brasil como o país com o maior custo de conformidade no mundo.
4.2 Impactos sociais
- Agravamento da desigualdade: Um sistema tributário que onera essencialmente o consumo afeta proporcionalmente mais as classes de menor renda, exacerbando a desigualdade.
- Baixa qualidade dos serviços públicos: A percepção de que o imposto pago não retorna em serviços públicos eficientes gera insatisfação e reduz a confiança cidadã no Estado.
5. Propostas para melhorar a responsabilidade fiscal
Diante dos desafios identificados, algumas propostas concretas para melhorar a responsabilidade fiscal incluem:
5.1 Reforma tributária ampla e progressiva
- Unificação de tributos: A implementação do IVA - Imposto sobre Valor Agregado, substituindo tributos como ICMS, ISS, e PIS/Cofins, simplificaria a estrutura tributária e tornaria o sistema mais transparente.
- Progressividade no IRRF e tributação de grandes fortunas: A criação de alíquotas adicionais no Imposto de Renda para pessoas de alta renda e a tributação sobre grandes propriedades poderiam garantir maior equidade no sistema.
5.2 Eficiência na gestão pública
- Despesas baseadas em resultados: Implantação de um modelo de gestão pública baseado em indicadores de impacto e eficiência na alocação dos recursos.
- Digitalização: A ampliação da digitalização dos processos administrativos poderia reduzir significativamente o desperdício e aumentar a eficiência de programas governamentais.
- Redução de gastos: Implantação de serviços on-line, fluxo de trabalho automatizado, gestão eletrônica e armazenamento de documentos, fiscalizações móveis, programas de incentivo à eficiência.
5.3 Transparência e educação fiscal
- Ampliação de canais de transparência: Desenvolvimento de plataformas públicas acessíveis que detalhem a alocação e os resultados das receitas tributárias.
- Educação tributária: Investimentos em campanhas educativas que expliquem à população como os impostos são aplicados podem ampliar a aceitação pública das reformas.
6. Discussão: Resistências e estratégias para superá-las
6.1 Resistências políticas e sociais
- Setores empresariais: Empresários resistem a novas alíquotas que aumentem a carga tributária já elevada.
- Grupos corporativos: Servidores públicos organizados frequentemente se opõem a reformas que impliquem em cortes de benefícios.
- População em geral: A desconfiança no uso eficiente dos impostos reduz a aceitação de mudanças tributárias.
6.2 Estratégias de superação
- Diálogo amplo e participativo: Expandir mecanismos de consulta pública e engajar setores empresariais e trabalhistas no processo de formulação das reformas.
- Implementação gradual: Promover mudanças de maneira escalonada para evitar crises de adaptação.
- Compensações diretas: Criar incentivos financeiros para mitigar impactos econômicos nos setores mais afetados.
- Consultoria externa: Com o objetivo de modernizar o gerenciamento das instituições, imprimindo transparência e fixando parâmetros para os gastos, com a finalidade de uma eficiente economia financeira e consequente diminuição da carga fiscal que afeta direta e indiretamente pessoas físicas e jurídicas.
- Planejamento estratégico: Com pessoas gabaritadas e fora dos quadros dos governos, com visão, missão e objetivos definidos, levando-se em consideração dados e indicadores, inclusive financeiros, para que seja possível administrar corretamente as finanças, identificar desperdícios e fazer os cortes necessários, inclusive tributários.
7. Conclusão
A crescente carga tributária brasileira está profundamente associada à falta de responsabilidade fiscal e eficiência na gestão pública, perpetuando um ciclo de déficits e aumento de impostos. Reformas amplas e progressivas, focadas na simplificação tributária, aumento da transparência e implementação de políticas fiscais baseadas em resultados, são essenciais para reverter essa dinâmica.
O sucesso dessa empreitada depende de diálogo e consenso entre os diversos atores sociais e políticos, bem como do compromisso do governo Federal em priorizar boas práticas de gestão pública. Desta forma, é possível garantir um sistema tributário mais justo, eficiente, e alinhado às necessidades do crescimento sustentável e à redução das desigualdades sociais.