A legislação recuperacional brasileira, inspirada no modelo norte-americano, incorporou ao seu ordenamento jurídico o denominado período de suspensão, mais conhecido como stay period.
O stay period representa o mecanismo central de toda recuperação judicial, funcionando como verdadeiro pilar de sustentação do processo. Trata-se de medida que suspende o curso da prescrição, impede o prosseguimento de execuções individuais e obsta qualquer forma de expropriação de bens do devedor relacionados a créditos sujeitos à recuperação (art. 6º, incisos I, II e III, da lei 11.101/05).
Não obstante, ainda que os créditos extraconcursais – aqueles elencados no art. 49, §§ 3º e 4º, da lei 11.101/05 - não se submetam aos efeitos da recuperação judicial (em especial à novação decorrente da homologação do plano), a legislação recuperacional revela que os atos expropriatórios oriundos de execuções individuais podem ser suspensos, desde que recaiam sobre bens de capital essenciais à manutenção da atividade empresarial durante o período do stay.
Na redação original da lei 11.101/05, o prazo do stay period era fixado em improrrogáveis 180 (cento e oitenta) dias. O intuito do legislador, à época, era estabelecer um período ideal para o processamento da recuperação o qual seria suficiente para que a assembleia geral de credores fosse convocada e deliberasse sobre o plano de recuperação judicial.
Todavia, o prazo não se revelava suficiente até a deliberação do plano de recuperação judicial e, como consequência, o exaurimento do prazo resultava em uma verdadeira corrida dos credores com a retomada das execuções individuais e a liquidação desordenada do patrimônio da devedora.
A concepção original, fundada no princípio da celeridade processual, mostrou-se dissociada da realidade, pois o processo recuperacional é, por natureza, complexo, com multiplicidade de prazos concomitantes, diversidade de credores e alto grau de litígios paralelos.
Com o advento da lei 14.112/20, que modificou parcialmente a lei 11.101/05, o legislador corrigiu parte dessa dissonância, prevendo a possibilidade de prorrogação excepcional do stay period por mais 180 (cento e oitenta) dias, desde que o devedor não tenha dado causa ao atraso do procedimento (art. 6º, § 4º, da LRF).
Contudo, a despeito da tentativa de correção do legislador, na prática, em muitas ocasiões a prorrogação do prazo do stay ainda não tem se tornado eficaz, de molde a trazer segurança aos envolvidos no processo de reestruturação.
Pois bem.
O objetivo essencial do stay é assegurar um fôlego financeiro à empresa com a suspensão das execuções e garantir condições de paridade entre a devedora e seus credores, permitindo a construção de uma negociação coletiva que concilie o interesse comum da classe credora com a preservação da empresa, em consonância com os princípios insculpidos no art. 47, da lei de recuperação e falências.
Logo, a superação do prazo sem deliberação sobre o plano, compromete sobremaneira o núcleo primordial do instituto da recuperação judicial e estimula a satisfação individual de créditos em detrimento do interesse coletivo.
Neste sentido, verifica-se que os credores com maior assessoramento jurídico - em regra, os de maior porte - acabam por se beneficiar em detrimento dos menores, notadamente os integrantes da classe trabalhista, que, via de regra, figuram entre os mais vulneráveis no processo recuperacional.
Em termos mais amplos, sustenta-se que a retomada prematura de execuções após o decurso do prazo do stay period configura verdadeira afronta ao princípio da par conditio creditorum.
Ainda que a prorrogação por 180 (cento e oitenta) dias represente um avanço, a realidade mostra que, em processos de grande porte – sobretudo aqueles que envolvem centenas ou milhares de credores -, o lapso máximo de um ano ainda se mostra insuficiente. O problema não reside apenas na complexidade do processo, mas também na estrutura deficitária do Poder Judiciário.
Segundo dados da Serasa Experian1, apenas no ano de 2024 foram ajuizados mais de 2.200 (dois mil e duzentos) pedidos de recuperação judicial, representando um crescimento de 61,8% (sessenta e um vírgula oito por cento) em comparação ao ano anterior.
Por sua vez, no relatório “Justiça em Números de 2024”2 elaborado pelo CNJ, aponta a existência de apenas 11 (onze) unidades judiciárias de competência especializada em falência e recuperação judicial no Brasil, cada qual sobrecarregada com uma média de 1.697 (um mil seiscentos e noventa e sete) processos em tramitação.
O ministro Luís Roberto Barroso, presidente do CNJ, advertiu que “não existe nenhum Judiciário no mundo com o volume de litigiosidade que o Brasil tem”, ressaltando que “por todo o país, os juízes brasileiros julgam mais de 2 mil processos por ano”.
Esse cenário demonstra que o modelo legislativo, ao fixar prazos rígidos, não concilia adequadamente a efetividade da máquina judiciária à duração média de um processo de recuperação judicial.
Não se afigura razoável que a empresa e a coletividade de credores sejam prejudicadas por uma falha estrutural que, em última análise, privilegia credores isolados em detrimento do coletivo. Permitir a retomada de execuções individuais após o escoamento do prazo do stay period equivale a legitimar a violação à paridade entre credores.
A jurisprudência brasileira ainda não consolidou entendimento sobre o tema, restando a solução sujeita à sensibilidade de cada magistrado - ora com postura mais legalista, ora com viés teleológico:
DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PEDIDO DE NOVA PRORROGAÇÃO DO PRAZO DO "STAY PERIOD". INDEFERIMENTO. RECURSO DESPROVIDO. I. Caso em Exame Agravo de instrumento interposto contra decisão que indeferiu o pedido de nova prorrogação do "stay period" no processo de recuperação judicial de Coldemar Resinas Sintéticas Ltda. II. Questão em Discussão A questão em discussão consiste em determinar se é possível a concessão de uma segunda prorrogação do "stay period" além do prazo legalmente permitido. III. Razões de Decidir Prorrogação do "stay period" admissível, por igual período e uma única vez, em caráter excepcional (lei 11 .101/05, art. 6º, § 4º). Prorrogação já operada na espécie e que, portanto, inviabiliza o pedido de nova prorrogação, ante expressa vedação legal. IV. Dispositivo Recurso desprovido
(TJ/SP - Agravo de instrumento: 23631682920248260000 Campinas, relator.: Maurício Pessoa, Data de julgamento: 27/2/2025, 2ª Câmara Reservada de Direito Empresarial, Data de publicação: 27/2/2025)
*****
DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE NOVA PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD ALÉM DO LIMITE LEGAL DE 360 DIAS. RECURSO PROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento contra decisão que prorrogou o stay period por mais 90 dias, ultrapassando o limite de 360 dias do art. 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/2005. 2. O agravante alega ilegalidade na decisão que excede o prazo fixado pela lei e afronta a jurisprudência do STJ, requerendo o reconhecimento do encerramento da suspensão. A recuperanda apresentou contrarrazões, alegando necessidade para preservar suas atividades. II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO 3. A questão em discussão consiste em saber se é possível nova prorrogação do stay period na recuperação judicial após o alcance do prazo máximo de 360 dias, previsto no art . 6º, § 4º, da lei 11.101/05. III. Razões de decidir 4. O art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05 estabelece prazo de 180 dias para o stay period, admitindo uma única prorrogação, em caráter excepcional, desde que o devedor não tenha concorrido para o atraso. 5. Após a reforma promovida pela lei 14.112/20, ficou consolidado que não há margem para nova prorrogação do stay period além do limite legal. 6. A ausência de realização da assembleia geral de credores, ainda que por motivos atribuídos à necessidade de retificação da lista de credores, não justifica o descumprimento do prazo legal, por se tratar de norma cogente. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Agravo de instrumento provido para obstar nova prorrogação do stay period. Agravo interno prejudicado. Tese de julgamento: “1. O prazo do stay period na recuperação judicial é de 180 dias, prorrogável uma única vez por igual período, totalizando 360 dias, nos termos do art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05. 2. Ultrapassado esse prazo, não é possível nova extensão, ainda que para preservar negociações ou bens essenciais, sob pena de violação à literalidade da lei e à jurisprudência consolidada do STJ.”
(TJ/MT - Agravo de instrumento: 10181419620258110000, relator.: ANGLIZEY SOLIVAN DE OLIVEIRA, Data de julgamento: 25/09/2025, 4ª Câmara de Direito Privado, Data de publicação: 25/9/2025)
*****
DIREITO EMPRESARIAL. RECURSO DE AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE INDEFERIU O PEDIDO DE PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD. PREVISÃO LEGAL DA POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO POR MAIS 180 DIAS. ART. 6º, § 4º, DA LEI 11.101/05. AUSÊNCIA DE CONDUTA PROTELATÓRIA DA RECUPERANDA. PRORROGAÇÃO PARA ALÉM DO LIMITE LEGAL (360 DIAS). NECESSIDADE DE DELIBERAÇÃO PRÉVIA E FAVORÁVEL DA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. I. CASO EM EXAME1. Agravo de instrumento interposto contra decisão do juízo recuperacional que indeferiu pedido de prorrogação do stay period até a homologação do plano de recuperação judicial, sob o fundamento de ausência de previsão legal e falta de demonstração de fato imprevisível para justificar a medida. 2. Recurso interposto pela recuperanda, sustentando a possibilidade legal de prorrogação por mais 180 dias, nos termos do art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05, com base na ausência de conduta que contribuísse para o esgotamento do prazo. 3. Decisão liminar na qual se deferiu a prorrogação por mais 180 dias, prazo posteriormente vencido antes do julgamento do mérito do recurso. II. QUESTÕES EM DISCUSSÃO 4. A questão em discussão consiste em saber se é juridicamente possível prorrogar o prazo de suspensão das ações e execuções contra a empresa em recuperação judicial (stay period), além dos 180 dias iniciais, na forma do art. 6º, § 4º, da Lei n. 11.101/2005, quando não há indícios de que a recuperanda tenha concorrido para o esgotamento do prazo .III. RAZÕES DE DECIDIR 5. O art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05 permite a prorrogação do prazo de 180 dias do stay period, uma única vez, desde que o devedor não tenha concorrido para a superação desse prazo.6. A decisão agravada incorreu em ero ao afirmar inexistência de previsão legal para o pedido de prorrogação, contrariando o texto legal expresso. 7. O Administrador Judicial atestou que a recuperanda tem agido com celeridade e não apresentou conduta que motivasse a superação do prazo inicial. 8. A ausência de deliberação favorável da assembleia de credores impede nova prorrogação além dos 360 dias totais permitidos legalmente. 9. Recurso parcialmente provido para confirmar a liminar que prorrogou o prazo do stay period por mais 180 dias, sendo inviável a prorrogação adicional sem deliberação da Assembleia Geral de Credores. IV. DISPOSITIVO E TESE 10. Recurso conhecido e parcialmente provido para confirmar a decisão liminar que prorrogou o stay period por mais 180 dias, nos termos do art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05.Tese de julgamento: A prorrogação do prazo de suspensão das ações contra empresa em recuperação judicial (stay period) é admitida uma única vez, por mais 180 dias, desde que não haja demonstração de conduta protelatória da recuperanda; eventual prorrogação além desse limite depende de deliberação prévia e favorável da assembleia geral de credores .
(TJ/PR 00451894320248160000 Maringá, relator.: Espedito Reis do Amaral, Data de julgamento: 9/6/2025, 17ª Câmara Cível, Data de Publicação: 12/6/2025)
******
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO QUE PRORROGOU O STAY PERIOD POR MAIS DE 180 DIAS. RECURSO DO CREDOR. STAY PERIOD. PLEITO DE REFORMA DA DECISÃO SOB O ARGUMENTO DE QUE SE TRATA DE MEDIDA EXCEPCIONAL PREVISTA NO ART. 6º, §4º, DA LEI 11.101/05 QUE PERMITE UMA ÚNICA PRORROGAÇÃO. AFIRMAÇÃO DE QUE A DECISÃO DO JUÍZO FOI GENÉRICA E SEM FUNDAMENTAÇÃO ADEQUADA, CAUSANDO PREJUÍZO AOS CREDORES. NÃO ACOLHIMENTO. INTERPRETAÇÃO À LUZ DO ART. 47 DA LEI DE FALÊNCIAS E RECUPERAÇÃO JUDICIAL. AUSÊNCIA DE DEMONSTRAÇÃO DE ATOS PROCRASTINATÓRIOS POR PARTE DA RECUPERANDA. SUSPENSÃO DO FEITO ACERTADA. DECISÃO MANTIDA. HONORÁRIOS RECURSAIS INCABÍVEIS. RECURSO CONHECIDO E DESPROVIDO. PREJUDICADO AGRAVO INTERNO.
(TJ/SC, AI 5038059-89.2024.8.24.0000, 2ª Câmara de Direito Comercial, relator para acórdão GETÚLIO CORRÊA, julgado em 10/12/2024)
*****
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. DECISÃO QUE INDEFERIU UMA SEGUNDA PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD. RECURSO DA RECUPERANDA. ALEGADA NECESSIDADE DE MANUTEÇÃO DOS BENS EM SUA POSSE. TOGADO A QUO QUE NÃO ANALISOU A QUESTÃO, ENTENDENDO-A POR PREJUDICADA. ANÁLISE DIRETAMENTE POR ESTA CORTE QUE ENSEJARIA SUPRESSÃO DE INSTÂNCIA. NÃO CONHECIMENTO DO RECURSO NO PONTO. MÉRITO. DEFENDIDA NECESSIDADE DE PRORROGAÇÃO DO PERÍODO DE BLINDAGEM ATÉ A SUBMISSÃO DO PLANO RECUPERACIONAL À ASSEMBLEIA DE CREDORES. ACOLHIMENTO. TUTELA ANTECIPADA RECURSAL CONCEDIDA PARA O FIM DE PARA SE CONSIDERAR PRORROGADO O STAY PERIOD ATÉ A HOMOLOGAÇÃO DO PLANO RECUPERACIONAL. ESPECIFICIDADES QUE AUTORIZAM A PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD. NÃO EVIDENCIADA A CONTRIBUIÇÃO DA RECUPERANDA PARA A DEMORA NO TRÂMITE PROCESSUAL. INDEFERIMENTO DA PRORROGAÇÃO DO PERIODE DE SUSPENSÃO QUE, POR OUTRO LADO, TRARIA PREJUÍZOS À RECUPERAÇÃO JUDICIAL. OBSERVÂNCIA AO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA. DECISÃO PARCIALMENTE REFORMADA. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO, E NESTA EXTENSÃO, PROVIDO. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO PREJUDICADOS.
(TJ/SC - Agravo de instrumento: 50212615320248240000, relator.: Stephan K. Radloff, Data de julgamento: 5/11/2024, 2ª Câmara de Direito Comercial)
*****
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD, PELA SEGUNDA VEZ, ATÉ DATA DE REALIZAÇÃO DA ASSEMBLEIA. POSSIBILIDADE. EXCEPCIONALIDADE. RECURSO DESPROVIDO. - Considerando que a prorrogação se deu por meio de fixação de data limite, qual seja, a realização da assembleia geral de credores, eventualmente já realizada quando da inclusão deste feito em pauta de julgamento, bem como a ausência de comprovação de conduta desidiosa por parte da recuperanda, ante a complexidade da demanda, e, ainda, considerando as finalidades perquiridas com o instituto recuperacional, mostra-se plenamente possível a prorrogação do stay period, tendo em vista que a suspensão de todas as ações e execuções em face do devedor tem o condão de viabilizar a própria recuperação judicial.
(TJ/MG - Agravo de instrumento: 3478551-35 .2023.8.13.0000 1 .0000.23.071331-5/006, relator.: des.(a) Moacyr Lobato, Data de julgamento: 12/6/2024, 21ª Câmara Cível Especializada, Data de publicação: 18/6/2024)
*****
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRAZO DE SUSPENSÃO. STAY PERIOD. PRORROGAÇÃO. ART. 6º, § 4º, DA LEI 11.101/05. POSSIBILIDADE. AUSÊNCIA DE QUALQUER EVIDÊNCIA NO SENTIDO DE QUE AS RECUPERANDAS TENHAM CONTRIBUÍDO, DE ALGUMA FORMA, PARA A SUPERAÇÃO DO LAPSO TEMPORAL. PROCESSO DE RECUPERAÇÃO QUE É SENSIVELMENTE COMPLEXO E BUROCRÁTICO. PRECEDENTES. RECURSO DESPROVIDO. 1. "Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial suspende o curso da prescrição e de todas as ações e execuções em face do devedor, inclusive aquelas dos credores particulares do sócio solidário. (...) § 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal. (Redação dada pela lei 14.112, de 2020)"; 2. "A jurisprudência deste Tribunal Superior tem mitigado a regra do art . 6º, § 4º, da lei 11.101/05, há de ser flexível aplicação do tendo em vista que tal determinação se mostra de difícil conciliação com o escopo maior de implementação do plano de recuperação da empresa." (STJ - AgInt nos EDcl no CC: 190951 GO 2022/0259051-0, Relator.: ministro João Otávio de Noronha, Data de Julgamento: 28/5/2024, S2 - Segunda Seção, Data de Publicação: DJe 4/6/2024); 3. "(...) O mero decurso do prazo de 180 dias previsto no art. 6º, § 4º, da LFRE não é bastante para, isoladamente, autorizar a retomada das demandas movidas contra o devedor, uma vez que a suspensão também encontra fundamento nos arts. 47 e 49 daquele diploma legal, cujo objetivo é garantir a preservação da empresa e a manutenção dos bens de capital essenciais à atividade na posse da recuperanda. Precedentes. (...)" (REsp 1.610.860/PB, rel. ministra Nancy Andrighi, 3ª turma, julgado em 13/12/2016, DJe 19/12/2016); 4. Na hipótese, o pedido de recuperação judicial foi ajuizado em 26/1/2023, sendo deferido o seu processamento em 6/3/2023 e determinado, entre outros, "a suspensão de todas as ações e execuções contra a requerente, na forma do art. 6º da lei 11 .101/05 e mais as exceções previstas no art. 49, parágrafos 3º e 4º da mesma Lei"; 5. Considerando não se vislumbrar qualquer evidência de que as Recuperandas tenham concorrido de modo desidioso para o escoamento do primeiro período do prazo do de blindagem, não se vislumbra óbice ao deferimento de sua prorrogação, mitigando-se a aplicação do art. 6º, § 4º, da lei 11.101/2005; 6. Permitir o prosseguimento das ações e execuções em face das recuperandas iria de encontro aos princípios da universalidade e unidade do juízo e da preservação das empresas, motivo pelo qual deve mantida a decisão do juízo singular; 7. Recurso desprovido.
(TJ/RJ - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 00781530820248190000, relator.: des(a). LUIZ FERNANDO DE ANDRADE PINTO, Data de julgamento: 19/3/2025, 3ª CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 18ª CÂMARA CÍVEL), Data de Publicação: 21/03/2025))
*****
AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO EMPRESARIAL E PROCESSUAL CIVIL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL DE EMPRESAS. DECISÃO INTERLOCUTÓRIA QUE DEFERIU NOVO PRAZO DE PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD. AUSÊNCIA DE ILEGALIDADE. APLICAÇÃO DA PREVISÃO CONTIDA NO ART. 6º, § 4º, DA LEI 11.101/05 POR INTERPRETAÇÃO SISTEMÁTICA. PROCESSO COMPLEXO. ENTENDIMENTO JURISPRUDENCIAL NO SENTIDO DE AUTORIZAR NOVA PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD, DESDE QUE SEJA OBSERVADA A REGULARIDADE DA RECUPERAÇÃO JUDICIAL E QUE NÃO HAJA PROVA DE COMPORTAMENTO DESIDIOSO DO ADMINISTRADOR JUDICIAL E DAS RECUPERANDAS. HOMENAGEM AO PRINCÍPIO DA PRESERVAÇÃO DA EMPRESA E DOS EMPREGOS DOS FUNCIONÁRIOS QUE LÁ LABORAM. DECISUM QUE NÃO MERECE REFORMA. AGRAVO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.
(TJ/RJ - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 00677801520248190000, Relator.: Des(a). FERNANDO FERNANDY FERNANDES, Data de Julgamento: 28/11/2024, SEXTA CAMARA DE DIREITO PRIVADO (ANTIGA 13ª CÂMARA CÍVEL), Data de Publicação: 2/12/2024)
*****
DIREITO EMPRESARIAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PRORROGAÇÃO DO STAY PERIOD. POSSIBILIDADE EXCEPCIONAL DE NOVA PRORROGAÇÃO. RECURSO DESPROVIDO. I. CASO EM EXAME 1. Agravo de instrumento interposto por Banco do Brasil S/A contra decisão interlocutória proferida pelo Juízo da Vara de Feitos Especiais da Capital nos autos de recuperação judicial, na qual se deferiu tutela de urgência para suspender execuções em face da recuperanda, com fundamento na essencialidade dos bens penhorados à manutenção da atividade empresarial. O agravante sustenta que houve violação ao art . 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/2005, em razão de sucessivas prorrogações do período de suspensão, e requer a reforma da decisão. Pedido de efeito suspensivo indeferido; agravo interno desprovido. II . QUESTÃO EM DISCUSSÃO 2. A questão em discussão consiste em definir se é juridicamente admissível nova prorrogação do stay period, mesmo após o prazo previsto no art. 6º, § 4º, da Lei nº 11.101/2005, diante da ausência de realização da Assembleia Geral de Credores e da necessidade de preservar a função social da empresa em recuperação. III. RAZÕES DE DECIDIR 3. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça admite a prorrogação do prazo do stay period em caráter excepcional, desde que demonstradas peculiaridades no caso concreto e a ausência de conduta desidiosa por parte da recuperanda. 4. A decisão agravada fundamenta-se na constatação de que a Assembleia Geral de Credores ainda não foi realizada, sendo inviável deliberar sobre o plano de recuperação judicial sem a suspensão das execuções em curso. 5. A manutenção da suspensão das ações contra a recuperanda visa resguardar a viabilidade da recuperação judicial e assegurar o cumprimento dos objetivos traçados no art. 47 da lei 11 .101/05, especialmente a preservação da empresa e a função social que exerce. 6. A ausência de demonstração de prejuízo concreto ao agravante e a inexistência de comportamento procrastinatório da recuperanda reforçam a adequação da prorrogação excepcional do stay period. IV. DISPOSITIVO E TESE 7. Recurso desprovido. Tese de julgamento: 1. É admissível, em caráter excepcional, nova prorrogação do stay period após o prazo previsto no art. 6º, § 4º, da lei 11.101/05, quando a Assembleia Geral de Credores ainda não foi realizada e restar demonstrado que a medida é necessária para a preservação da empresa e a consecução dos objetivos da recuperação judicial.
(TJ/PB - AGRAVO DE INSTRUMENTO: 08265142620248150000, relator.: Gabinete 24 - desª. Túlia Gomes de Souza Neves, 3ª Câmara Cível)
Com efeito, o STJ3 já admitiu a prorrogação do stay period para além do limite legal, desde que comprovada a necessidade para o sucesso da recuperação judicial e a inexistência de culpa da devedora pelo atraso.
Nessa perspectiva, é papel do juiz analisar casuisticamente a pertinência da prorrogação, mesmo além do prazo legal de um ano, até a realização da assembleia e, eventualmente, até a decisão de homologação do plano – ressalvada a hipótese de comprovada inércia ou má-fé da devedora -, de molde a assegurar o interesse maior da coletividade, afinal, permitir a retomada de execuções individuais sem se aguardar a deliberação dos credores sobre o plano do devedor, é ferir de morte os princípios basilares da preservação da empresa (art. 47, da lei 11.101/05) e da par conditio creditorum.
O debate permanece aberto, mas é certo que a concretização do stay period depende de um olhar realista sobre o sistema judicial brasileiro, sob pena de o instituto perder sua essência e comprometer a própria função social da empresa em crise.
_______
1 https://www.serasaexperian.com.br/sala-de-imprensa/indicadores/brasil-registra-22-mil-pedidos-de-recuperacao-judicial-em-2024-o-maior-numero-da-serie-historica-aponta-serasa-experian/#:~:text=2025-,Brasil%20registra%202%2C2%20mil%20pedidos%20de%20recupera%C3%A7%C3%A3o%20judicial%20em,da%20Serasa%20Experian%2C%20Camila%20Abdelmalack.
2 https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2024/05/justica-em-numeros-2024-v-28-05-2024.pdf
3 RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. SUSPENSÃO DE AÇÕES E EXECUÇÕES. STAY PERIOD. ARTIGO 6º, § 4º. DA LEI Nº 11.101/2005. PRORROGAÇÃO. INDEFERIMENTO. REEXAME DE CIRCUNSTÂNCIAS FÁTICAS. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA Nº 7/STJ.
1. Prevalece na jurisprudência desta Corte Superior o entendimento de que, em casos excepcionais, o prazo previsto no § 4º do artigo 6º da Lei nº 11.101/2005 pode ser prorrogado, desde que comprovada a necessidade de tal prorrogação para o sucesso da recuperação e não reste evidenciada a negligência da parte requerente.
2. O exame das especificidades fáticas que eventualmente recomendem o provimento do pleito de prorrogação do stay period é tarefa que incumbe exclusivamente às instâncias de cognição plena, haja vista a inteligência da Súmula nº 7/STJ. Precedentes.
3. Recurso especial não conhecido.
(REsp 1.920.816/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Terceira Turma, julgado em 9/6/2025, DJEN de 12/6/2025.)