Migalhas Quentes

STJ recomenda cautela a magistrados no julgamento de casos de abandono afetivo

A 3ª turma negou indenização para filha.

1/1/2016

Os ministros da 3ª turma do STJ recomendaram muita prudência aos magistrados de todo o país quando forem julgar casos de abandono afetivo. O alerta foi dado ao analisarem o recurso especial com o qual uma filha tentou, junto ao tribunal, receber indenização do pai, porque considera que ele não cumpriu a obrigação paterna de cuidado e de afeto, o que caracteriza o abandono afetivo. Ela buscava a compensação econômica alegando ter sofrido danos morais com a situação.

Ao negarem o recurso, os ministros alertaram para a complexidade das relações familiares e que o reconhecimento do dano moral por abandono afetivo é uma situação excepcionalíssima, por isso é preciso prudência do julgador na análise dos requisitos necessários à responsabilidade civil. Para os ministros, é preciso evitar que o Poder Judiciário seja transformado numa indústria indenizatória.

A criança nasceu de um relacionamento extraconjugal, e alegou que só foi registrada pelo pai aos 10 anos de idade, após entrar na Justiça com uma ação de reconhecimento de paternidade. No recurso ao STJ, ela alegou receber tratamento desigual em relação aos filhos do casamento do pai e que ele raramente a visitava. Segundo ela, “o desprezo pela sua existência lhe causou dor e sofrimento”, além de problemas como baixa autoestima, depressão, fraco desempenho escolar e transtorno de déficit de atenção.

O pai contestou as alegações. Disse que até a filha completar 10 anos de idade, não sabia que era seu pai. Em sua defesa, ele garantiu nunca ter se recusado a fazer o teste de DNA e que após o resultado fez acordo na Justiça para o pagamento de pensão alimentícia e passou a ter contato com a filha.

Para o homem, a indenização só seria cabível se fosse comprovado que ele nunca quis reconhecer que é o pai da menina, e na opinião dele, isso nunca aconteceu.

Previsão legal

O relator, ministro Moura Ribeiro, reconheceu que a doutrina especializada, com base nos princípios da dignidade da pessoa humana, da afetividade e da proteção integral da criança e do adolescente, é quase unânime no sentido de reconhecer que a ausência do dever legal de manter a convivência familiar pode causar danos a ponto de comprometer o desenvolvimento pleno e saudável do filho, razão pela qual o pai omisso deve indenizar o mal causado. Ele destacou, entretanto, a ausência de lei no Brasil sobre o tema.

Não há legislação específica no nosso ordenamento jurídico tratando do tema abandono afetivo, mas existe uma movimentação concreta nesse sentido. Recentemente, especificamente aos 2/10/2015, o Projeto de Lei do Senado Federal nº 700, de 2007, que propõe alteração na Lei nº 8.069/1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), após oito anos de tramitação, foi aprovado por aquela Casa Legislativa, e agora seguiu para apreciação da Câmara do Deputados.”

Caso a proposta seja alterada, explicou o ministro, o abandono afetivo passará realmente a ser previsto em lei, mas, até lá, “recomenda-se que deve haver uma análise responsável e prudente dos requisitos autorizadores da responsabilidade civil nos casos de abandono afetivo, fazendo-se necessário examinar as circunstâncias do caso concreto, a fim de se verificar se houve a quebra do dever jurídico de convivência familiar”. Ou seja, é preciso provar que a conduta do pai trouxe reais prejuízos à formação do indivíduo.

Nexo causal

No caso apreciado, apesar de o TJ/DF, responsável pela apreciação das provas, reconhecer que o ideal seria um contato maior entre pai e filha, a conclusão do colegiado foi de que a filha não conseguiu comprovar a relação entre a conduta do pai e os danos por ela alegados.

Esses elementos, de fato, demonstram que o recorrido poderia ter falhado em alguns deveres inerentes à paternidade responsável. No entanto, não se pode afirmar que houve um abandono completo da filha ou desprezo por ela. Ele não descumpriu totalmente seu dever de cuidado, pois existia algum contato e aproximação afetiva entre eles, e ela recebe dele auxilio material que lhe proporciona acesso a educação e saúde.”

O relator também destacou a ausência de um laudo psicossocial que, em sua opinião, seria uma prova técnica indispensável de que realmente houve omissão do pai e que isso provocou abalos psicológicos à filha (nexo de casualidade). Os relatórios médicos e escolares apresentados, segundo o ministro, em nenhum momento associaram os alegados distúrbios emocionais da criança à ausência da figura paterna.

Atento aos elementos constantes dos autos e à orientação jurisprudencial desta Corte, não vislumbro a configuração de nexo causal entre o alegado dano psicológico sofrido pela recorrente com a suposta ausência do dever de cuidado do recorrido, pois não houve a demonstração desse liame e, o dano, sozinho, não causa a responsabilidade civil.”

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Leia mais

Migalhas Quentes

Pai deve indenizar filho por abandono afetivo

8/9/2015
Migalhas de Peso

O STJ e o Dano Moral por Abandono Afetivo

14/4/2014
Migalhas de Peso

Da possibilidade de indenização por danos morais decorrentes de abandono afetivo

26/6/2013
Migalhas Quentes

Pai é condenado a indenizar filho por abandono afetivo

29/5/2013
Civilizalhas

Brevíssimas ilações sobre o abandono afetivo

16/5/2012
Migalhas Quentes

Pai é condenado a indenizar filha em R$ 200 mil por abandono afetivo

2/5/2012

Notícias Mais Lidas

Servidores não devolverão verbas recebidas de boa-fé, decide Nunes Marques

28/4/2024

Certidão da OAB não comprova atividade jurídica para fins de concurso

27/4/2024

"Vocês chegam para pesar em gastos", diz juiz a servidores em posse

29/4/2024

Morre o advogado Juliano Costa Couto, ex-presidente da OAB/DF

28/4/2024

Juíza determina prisão de jornalista que ofendeu promotor e magistrado

29/4/2024

Artigos Mais Lidos

Burnout e INSS: Como conseguir aposentadoria ou auxílio-doença?

29/4/2024

A validade da cláusula de não concorrência nos contratos de franquia

29/4/2024

Facilitando o divórcio: O papel do procedimento extrajudicial na dissolução do casamento

29/4/2024

Lei 14.846/24 e a nova medida especial de proteção ao trabalho realizado em arquivos, em bibliotecas, em museus e em centros de documentação e memória

29/4/2024

Correios são condenados pelo TST a pagar indenização de R$ 20 mil a empregado que sofreu 4 assaltos

29/4/2024