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Homem em transição de gênero tem demissão discriminatória revertida

Além de ser reintegrado ao cargo, o trabalhador também será indenizado pelos danos morais sofridos.

12/7/2021

Terá direito a reintegração ao cargo, bem como indenização no valor de R$ 30 mil a título de danos morais, funcionário que passava por processo de transição de gênero e foi demitido dois dias antes de realizar cirurgia de mastectomia masculinizadora. A decisão é da juíza do Trabalho Jaeline Boso Portela de Santana Strobel, em exercício na 11ª vara do Trabalho de Brasília, que reconheceu como discriminatória a demissão.

Além de ser reintegrado ao cargo, o trabalhador também será indenizado pelos danos morais sofridos.(Imagem: Freepik)

O funcionário afirmou que iniciou processo de transição de gênero no período em que era membro da CIPA - Comissão Interna de Prevenção de Acidentes e contava com estabilidade no emprego. No decorrer do processo, com suas alterações fisionômicas se tornando cada vez mais visíveis, passou a receber tratamento desrespeitoso de seus superiores, em um cenário de discriminação e preconceito.

Sustentou, ainda, que após ter deixado a CIPA e comunicado ao superior que realizaria cirurgia de mastectomia masculinizadora, foi demitido sem justa causa dois dias antes da data agendada para a realização do procedimento cirúrgico.

Em contestação, a empresa negou que tenha havido discriminação e que o trabalhador foi dispensado, sem justa causa, por decorrência da sua opção pela transição de gênero. Destacou, inclusive, que não houve a prática de quaisquer atos que pudessem caracterizar constrangimentos rotineiros em seu desfavor.

Após análise dos fatos, a magistrada entendeu pela procedência do pedido.

Na sentença, a juíza declarou nula a dispensa por reconhecê-la discriminatória e julgou procedente o pedido de reintegração, nas mesmas condições anteriores à demissão, com a indenização dos salários relativos ao período entre a dispensa, até a efetiva data e reintegração ao emprego.

De acordo com a magistrada, depoimentos das testemunhas chamadas pela empresa não foram coesos ao tentar explicar os motivos da demissão e, ainda, houve contradição das histórias apresentadas. 

Mesmo tendo pleno conhecimento do processo de transição de gênero, iniciado durante o período de mandato como membro da CIPA, e da necessidade da realização do procedimento cirúrgico que afastaria o trabalhador por muitos dias do trabalho, a empresa prosseguiu com a demissão, efetivando o afastamento dois dias antes da intervenção.

“Conduta como a praticada pela reclamada não pode ser tolerada em um Estado Democrático de Direito.”

Além disso, a magistrada destacou que mesmo ciente de que o trabalhador precisava realizar a cirurgia, com base em laudos médicos apresentados – pelo risco do crescimento de nódulos – e que vivia um momento delicado em sua vida pessoal, a empresa dispensou o empregado, deixando de traçar um diagnóstico de sua saúde física e emocional, desrespeitando com isso as normas de segurança e medicina do trabalho.

Direito de personalidade

Quando a CF/88 coloca como direito humano fundamental o direito à vida, esse direito, segundo a magistrada, vai muito além de respirar.

Os direitos de personalidade, o que inclui a forma de escolher as diretrizes de vida são irrenunciáveis, intransmissíveis e dizem respeito tão apenas ao seu detentor, integrando a esfera de sua intimidade e privacidade.

“É em preservação deste bem tão precioso que acolho a tese prefacial, dado que se mostra a melhor forma de garantir a observância à dignidade da pessoa humana, aos direitos da personalidade, ao direito da saúde, ao valor social do trabalho e à cidadania”.

Dano moral

Para a magistrada, o trabalhador teve atingida sua esfera moral ao ser exposto à situação angustiante de ficar sem emprego e sustento, sendo lançado ao mercado de trabalho durante momento pessoal delicado de pleno conhecimento da empregadora, a apenas dois dias da realização de procedimento cirúrgico.

Desse modo, tais situações trouxeram dor e sofrimento ao trabalhador. Ademais, ainda que assim não fosse, nos casos de dispensa discriminatória, o sofrimento é presumido, concluiu a magistrada arbitrando indenização por danos morais no valor de R$ 30 mil.

O tribunal não divulgou o número do processo.

Informações: TRT da 10ª região. 

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