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Juiz marca audiência presencial citando poesias: “cruzamento de almas”

No despacho, o magistrado disse que "querem implantar uma engenharia na qual o Judiciário é apenas uma tela ambulante".

2/6/2023

“Socorro! Eu não estou sentindo nada… (MPB)

não porque estou ‘doente dos olhos’, mas porque ‘pensar’ também é refletir a empiria, o mundo da vida, o imponderável, os afetos. (Fernando Pessoa).”

Foi com o trecho acima que o juiz do Trabalho Adriano Antonio Borges, da 2ª vara do Trabalho de Itabira/MG, começou um despacho determinando que audiência fosse presencial.

Em tom poético, o magistrado diz que a Constituição preconiza a segurança social e jurídica, a autodeterminação da pessoa, a cidadania “civil”, a “inafastabilidade” do Judiciário, a “proteção” em face da automação e a igualdade substantiva.

“Sendo assim, não podemos permitir, data venia, um estado ‘suicidário’, que além de necropolítico, se distancia ‘presencialmente’ do seu povo, reproduzindo, como nunca, mais uma espécie de desigualdade substantiva, ‘plataformizando’ a consciência de todos, expropriando a liberdade da presença, aumentando o histórico de violência afetiva desse país, dispersando o individual e o coletivo, enaltecendo uma espécie de escravidão cibernética.”

Mais adiante, Adriano afirma que querem transformar o “juiz em máquina de ler QR Code facial; querem impedir o cruzamento de almas no ambiente físico da audiência; querem impedir o evangélico Joanino de vermo-nos face a face; querem assassinar a física e a metafísica da dialética; querem reduzir a vida a uma tela; querem colonizar nossos sonhos de liberdade, igualdade e de ‘reconhecimento e consenso’; querem ignorar a hipossuficiência tecnológica do trabalhador; querem terceirizar a vontade do trabalhador que sequer sabe o que é juiz 100% digital; querem implantar uma engenharia na qual o Judiciário é apenas uma tela ambulante, com representantes e participantes morfologicamente incompletos (só se vê os rostos nas telas do computador); querem mimetizar a vida, as esperanças, o desejo de justiça, o abraço da presença, o sorriso da companhia e a doce e inefável brisa do perdão em uma tela de celular”.

Para finalizar, destacou:

“Somos inteiramente de carne e osso; de alma e coração; de dor e alegria; de presença, não de solidão; de raiva e euforia; de amor e ódio; de Deus e do diabo; de Apolo e de Dionísio; de Fausto e de Mefistófeles; de vida e de morte; de luz e de sombra; do Ser e de Não-ser, predicados ‘incabíveis’ numa tela, e também porque este juiz, com todo respeito, em audiências virtuais, é acometido por uma concepção paranoica de identidade, por um estranhamento e por uma náusea Clariciana, e também por outras circunstâncias cuja memória, coração e razão não conseguem expressar, aqui na terra do poeta, na segunda Vara de Itabira- MG, humildemente, não se pratica, em tempos não excepcionais, o juízo 100% digital com a presença virtual das partes, procuradores e testemunhas.”

Juiz escreveu despacho em forma de poesia.(Imagem: Arte Migalhas)

Veja o despacho.

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