O VI Congresso Nacional da Câmara de Mediação e Arbitragem Especializada realizado pela CAMES na quinta-feira, 6/11, das 13h30 às 18h30, na ESPM, consolidou-se como um dos principais fóruns de discussão sobre os rumos da arbitragem no país. O evento, que reuniu magistrados, advogados e acadêmicos no prestigioso ambiente acadêmico da Escola Superior de Propaganda e Marketing, abordou questões fundamentais que permeiam a prática arbitral contemporânea, desde os princípios basilares do instituto até os desafios impostos pelas novas tecnologias.
Eficiência econômica da arbitragem
O VI Congresso abordou a questão dos custos da arbitragem através da apresentação de Carlos Alberto Vilela Sampaio, diretor Geral e presidente do Conselho Deliberativo da CAMES.
Carlos Vilela Sampaio destacou que a CAMES desenvolveu uma tabela de custos mais eficiente economicamente quando comparada a outras instituições arbitrais e, em alguns casos, quando comparada com os custos do Poder Judiciário. “Nossa política de precificação visa democratizar o acesso à arbitragem, tornando-a viável para disputas de diferentes portes”, afirmou.
A análise comparativa demonstrou que, em causas de valores intermediários, os custos na CAMES podem ser inferiores aos de demandas judiciais completas. “Quando somamos custas processuais, honorários recursais e o custo do tempo em processos que levam anos, a arbitragem frequentemente se revela mais econômica”, explicou Carlos Vilela Sampaio.
O presidente enfatizou que a eficiência vai além das taxas:
“A previsibilidade de prazos, a especialização dos árbitros e a definitividade da decisão representam valor mensurável para as partes”.
Carlos Vilela Sampaio assegurou que os custos acessíveis não comprometem a qualidade técnica e destacou a transparência como diferencial: “A CAMES disponibiliza publicamente sua tabela completa de custos, permitindo planejamento financeiro preciso desde o início”.
Dever de revelação como pilar da confiança
Um dos pontos centrais do congresso foi a discussão sobre o dever de revelação dos árbitros, tema que tem gerado intensos debates na comunidade jurídica. O juiz do TJ/SP e professor Frederico Messias trouxe uma perspectiva equilibrada sobre a questão, enfatizando que "o Dever de Revelação é o pilar da confiança da arbitragem".
Messias, que possui vasta experiência tanto na magistratura quanto na docência, alertou para um aspecto crucial: "A violação do Dever de Revelação não gera a automática anulação da decisão arbitral". Segundo o magistrado, essa compreensão é fundamental para evitar a banalização das ações anulatórias, que podem comprometer a eficácia do procedimento arbitral.
O professor também destacou a necessidade de autocontenção do Poder Judiciário: "Do Poder Judiciário exige-se a necessária autocontenção na análise da ação anulatória para não se transformar em órgão revisor de mérito". Essa observação reflete uma preocupação recorrente no meio arbitral sobre a interferência judicial excessiva, que pode desnaturar o instituto.
Capilarização do Instituto da Arbitragem no Brasil
Além disso, outro tema que despertou debates profundos foi o crescente grau de dispersão da arbitragem como instituto jurídico no Brasil, que se encontra cada vez mais difundido e especializado para lidar com diferentes áreas do direito.
O tema foi apresentado pelo advogado Caetano Berenguer, especialista em resolução de conflitos e sócio da renomada banca Bermudes Advogados: “Hoje, podemos observar um desenvolvimento cada vez mais capilarizado da arbitragem para abordar inúmeros temas e áreas do direito, que vão desde controvérsias societárias e de mercado de capitais até o Direito Familiar e Sucessório, chegando, inclusive, às relações de consumo”, registrou Berenguer.
O advogado observou, no entanto, que o desenvolvimento do instituto não está isento de desafios e peculiaridades de ordem prática: “Naturalmente, à medida que a arbitragem cresce e se desenvolve, cabe a nós, enquanto operadores do direito, definir como, onde, de que forma e em quais circunstâncias específicas devemos admitir, ou não, a aplicação da arbitragem, tomando o cuidado de separar o que é patrimonial do que é existencial, além do que é disponível do que é indisponível”.
Extensão de cláusulas compromissórias: Evolução ou relativização?
Outro tema que gerou discussões acaloradas foi a extensão da cláusula compromissória a terceiros, apresentado pelo advogado Gabriel Orleans e Bragança. O jurista, conhecido por sua expertise em direito empresarial e arbitragem, provocou reflexões importantes sobre os limites dessa prática.
"A extensão da cláusula compromissória a sociedades do mesmo grupo ou a terceiros vinculados ao conflito tem sido admitida em algumas hipóteses pela doutrina e pela jurisprudência arbitral", observou Orleans e Bragança. No entanto, o advogado levantou questionamentos fundamentais sobre essa tendência: "Mas até que ponto essa flexibilização preserva a essência consensual da arbitragem?"
A questão ganha relevância especial no contexto das estruturas empresariais contemporâneas, cada vez mais complexas. Orleans e Bragança provocou o auditório com uma reflexão crucial: "Estaríamos diante de uma evolução necessária para lidar com a complexidade das estruturas empresariais contemporâneas - ou de uma relativização perigosa do princípio da autonomia da vontade, capaz de fragilizar a própria legitimidade do procedimento arbitral?"
Inteligência artificial: Oportunidades e desafios éticos
A incorporação da inteligência artificial aos procedimentos arbitrais foi outro tema de destaque, apresentado pela desembargadora aposentada e advogada Christine Santini. Com uma carreira consolidada na magistratura e na advocacia, Santini trouxe uma visão pragmática sobre a inevitabilidade da transformação digital.
"As inovações tecnológicas são realidade e inexorável é sua incorporação ao quotidiano dos profissionais do Direito", afirmou a jurista, reconhecendo que a resistência à tecnologia não é uma opção viável para o futuro da arbitragem.
Contudo, Santini enfatizou a importância de estabelecer parâmetros éticos claros: "Transparência, inclusão, responsabilidade, imparcialidade, confiabilidade da base de dados e segurança são fundamentais para a preservação do devido processo legal". Esses princípios, segundo a desembargadora, devem nortear qualquer implementação tecnológica no âmbito arbitral.
A especialista concluiu sua apresentação defendendo uma abordagem proativa: "Necessária, portanto, é a visão proativa do uso de inteligência artificial em procedimentos arbitrais e sua implementação com preservação da ética".
CAMES e o fortalecimento da arbitragem brasileira
A realização do VI Congresso Nacional na ESPM reforça o papel da CAMES como uma das principais instituições de arbitragem do país. Fundada com o objetivo de promover métodos alternativos de resolução de conflitos, a câmara tem se destacado pela qualidade de seus procedimentos e pela constante busca por aperfeiçoamento técnico.
O evento demonstrou a maturidade do debate arbitral no Brasil, onde questões complexas são discutidas com profundidade técnica e visão crítica. A diversidade de perspectivas apresentadas pelos palestrantes evidencia a riqueza do ambiente acadêmico e profissional que cerca a arbitragem nacional.
Perspectivas para o futuro
As discussões do VI Congresso Nacional da CAMES revelam uma arbitragem brasileira em constante evolução, enfrentando desafios contemporâneos sem perder de vista seus princípios fundamentais. A busca pelo equilíbrio entre inovação e tradição, eficiência e segurança jurídica, permanece como o grande desafio para os próximos anos.
O sucesso do evento na ESPM reafirma a importância do diálogo constante entre os operadores do direito para o aperfeiçoamento contínuo do instituto arbitral, garantindo que ele continue sendo uma alternativa eficaz e confiável para a resolução de conflitos no cenário jurídico brasileiro.
O VI Congresso Nacional da CAMES demonstrou mais uma vez a vitalidade da arbitragem brasileira e a necessidade de constante reflexão sobre seus rumos futuros, sempre com foco na preservação da confiança e da eficácia que caracterizam este importante instituto de resolução de conflitos.