Migalhas Quentes

Paulo Bonavides publica carta em defesa ao refúgio concedido a Cesare Batistti

8/9/2009


Manifesto

Jurista e professor Paulo Bonavides em defesa ao refúgio concedido a Cesare Batistti

Um dos mais reverenciados constitucionalistas no Brasil, Paulo Bonavides, elaborou uma carta, a ser entregue aos Ministros do STF, com veemente defesa do ato do Ministro Tarso Genro que concedeu refúgio ao ex-ativista Cesare Battisti.

Após comentar os anos de chumbo na Itália, criticar os processos baseados em delação premiada contra réus revéis e defender a soberania nacional, referiu-se ao processo como uma revanche histórica contra os perdedores da guerra fria. O julgamento está previsto para amanhã, 9/9/09.

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Fortaleza, 3 de setembro de 2009

Por solicitação do Dr. Luís Roberto Barroso, examinei os aspectos principais envolvidos no requerimento de extradição do cidadão italiano CESARE BATTISTI, em curso perante o Supremo Tribunal Federal. Enuncio a seguir, objetivamente, minha opinião e minhas conclusões a respeito.

Cesare Battisti participou da luta política na Itália na segunda metade da década de 70 do século passado. Há mais de trinta anos, portanto. Foi preso em 1979 e condenado por pertencer a uma organização subversiva e pela prática de ações subversivas. Nenhuma delas envolvendo violência física. Em 1981, fugiu da prisão, refugiando-se no México e depois na França. Depois da fuga, foi julgado uma segunda vez, à revelia. Acusado por um “arrependido”, que se beneficiou da delação premiada, foi condenado por quatro mortes que teriam sido cometidas pela organização política a que pertencia. A essa altura, Cesare Battisti já se encontrava na França, onde recebeu abrigo político. Ali, trabalhou honestamente como zelador, tornou-se escritor reconhecido, casou-se e teve duas filhas. Jamais esteve envolvido em qualquer outro episódio de natureza política ou criminal.

Da descrição acima, formei duas convicções. A primeira, a de que as circunstâncias do segundo processo impediram uma defesa adequada, havendo forte suspeita de que a sentença seja injusta. Condenar uma pessoa que já fora anteriormente julgada – sem ter sido sequer acusada de homicídio – em um segundo julgamento, baseado em delação premiada e sem que se tenha defendido pessoalmente, parece-me inaceitável. Minha segunda convicção é a de que, independentemente da culpabilidade ou não, passados trinta anos, já não há mais qualquer sentido em mandar Cesare Battisti para a prisão. Fui contemporâneo do ardor revolucionário do movimento socialista e vi muitos jovens, aqui e alhures, se envolverem em uma luta que, tragicamente, não levou a lugar nenhum. Passadas as décadas, no entanto, já não há mais lugar para esse acerto de contas com o passado, uma espécie de revanche histórica contra os perdedores da guerra fria.

De tudo o que sei, vi e li sobre os anos de chumbo na Itália, considero acertada a decisão do Ministro de Estado da Justiça, Tarso Genro, de conceder refúgio a Cesare Battisti, diante do fundado temor de que sua condenação tenha se dado em um ambiente de perseguição política. E, naturalmente, se a sentença condenatória pode ter sido fruto de uma perseguição política, sua execução nos dias de hoje consumaria irremediavelmente tal perseguição. Além disso, a reação exacerbada da Itália bem revelam que, ainda hoje, passados tantos anos, os ânimos políticos continuam exacerbados e os riscos de perseguição ainda subsistem.

Ainda que não estivesse convencido – como estou – de tudo que vai afirmado acima, penso ser meu dever defender o ato do Ministro da Justiça, endossado pelo Presidente da República, como um ato de soberania nacional, que deve ser respeitado pela Itália, pelos outros países e pelos poderes constituídos no Brasil. Por essas razões, me alinho à posição manifestado pelo Instituto dos Advogados Brasileiros e pela Comissão de Assuntos Constitucionais da Ordem dos Advogados do Brasil no sentido de defender a soberania nacional e a posição do Governo brasileiro. O refúgio deve ser respeitado e a extradição deve ser extinta.

Esta é a minha opinião, s.m.j.

Paulo Bonavides

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