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A banalização da sustentação oral no mundo digital: um chamado ao profissionalismo

Tathiana Pitas

Estudem, preparem-se, e acima de tudo, respeitem o Tribunal, o processo e o seu cliente.

20/7/2023
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Por que sempre ouvimos que a Sustentação Oral não muda votos?

Quando comecei a frequentar o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região em meados de 2002 encantei-me com tudo, principalmente com as sessões de julgamento nas quais grandes advogados de forma solene e extremamente respeitosa se dirigiam à Tribuna e realizavam suas sustentações orais. Parecia até que eu estava em um filme hollywoodiano.

Lembro-me ainda hoje de que as primeiras sustentações que realizei, eu ficava ansiosa, tinha um frio na barriga, um leve tremor nas pernas e na voz.

Ensaiava várias vezes a minha fala para que eu conseguisse passar as informações com a maior clareza possível. Ensaio este que ainda hoje não dispenso.

Importante dizer que nestes anos que se passaram, embora eu tenha realizado mais de mil e quinhentas sustentações orais, ainda assim, percebo que o treino em cada processo é algo que diferencia o advogado, por mais que ele saiba sustentar com maestria.

Atualmente, tenho visto a banalização deste ato tão nobre e importante.

Eu chamo isto de Experimentar a Tribuna.

As sessões por videoconferência certamente vieram para solucionar um problema que nós nos deparamos com a pandemia. 

Ela nos ajudou a movimentar os processos que estavam parados e deu voz aos advogados que precisavam sustentar em seus processos de grande relevância.

Possibilitou aos advogados que se encontravam em cidades fora da sede do Tribunal, a acessarem os Tribunais e realizarem sua sustentação oral. O que ocorre até hoje.

Por outro lado, a sessão por videoconferência trouxe-nos também diversas situações inusitadas: ausência da vestimenta correta, (até sem calça já vimos), sustentação sendo feita em uma rede de balançar, e dezenas de outras cenas curiosas.

Mas a pergunta mais importante que levanto é: por que há várias sustentações que claramente não foram preparadas?

Será a barreira da tela que permite isso? 

Realmente, acredito que a tela nos dê mais coragem de enfrentar situações que pessoalmente seriam mais difíceis, talvez até impossíveis.

Lembro-me ainda quando o número de sustentações por sessão chegava no máximo a 40, no TRT da 15ª; com a videoconferência possibilitou-se que um maior número de sustentações acontecesse. 

Hoje, por exemplo, em uma sessão de julgamento chegamos a espantosas 80 sustentações em um dia. 

Imaginem, então, metade destas sustentações sendo realizadas sem nenhum preparo, ou pior ainda, sem necessidade (leitura de recursos, informações jogadas sem contexto, ausência de preparo da oratória, etc).

Se cada sustentação demorar cerca de 5 minutos (metade do tempo regimental, na maioria dos Tribunais do Trabalho) teremos mais de 3 horas de sessão de julgamento, de fala sem nenhuma relevância, ou mesmo sustentações que não farão diferença no resultado útil do processo.

O que eu quero dizer é que ao “Experimentar a Tribuna” e utilizar-se de um tempo preciso de todos, estamos fazendo com que metade da sessão de julgamento não tenha relevância. 

Na realidade, estamos cansando, estressando, exaurindo todos os envolvidos, sem alcançar qualquer objetivo. 

Contudo, algum dia, aquele processo de extrema relevância pode ser o seu, e por haver muitas “Experiências na Tribuna” talvez o seu processo seja o último naquele dia cansativo de sustentações.

A sustentação oral em minha opinião é um dos atos mais importantes dentro do processo, e por ter essa importância, deve ser assim prestigiado. 

Trata-se de um dos únicos atos que podemos dar voz ao nosso cliente, expressar por meio de nossa fala e atitude as emoções que estão presas na escrita.

Por isso “Experimentar a Tribuna” é algo que atrapalha tanto. 

Como eu disse no início desta narrativa, estar perante o Tribunal é um ato solene, e de extremo respeito ao processo. 

Ao nos encaminharmos à Tribuna estamos cumprindo de forma total a ampla a defesa e o contraditório do nosso cliente.

Voltando à pergunta inicial desse texto, "Por que sempre ouvimos que a Sustentação Oral não muda votos?".

A resposta é que a Sustentação Oral, na verdade, tem o poder de mudar votos e decidir processos, mas somente se for feita de maneira correta. Não é a quantidade de palavras floreadas que você usa, nem a sua capacidade de recitar o latim jurídico, mas sim a qualidade de seu preparo e apresentação que podem, verdadeiramente, fazer a diferença.

Quando bem-feita, a Sustentação Oral se torna uma ferramenta poderosa na mão do advogado, capaz de virar o jogo, ganhar um caso que parecia perdido ou consolidar uma vitória que estava pendente. Ela é a oportunidade de dar voz ao cliente, transmitindo as emoções e argumentos que as palavras escritas não conseguem expressar sozinhas. É um ato de respeito ao processo e uma honra à profissão.

No entanto, uma Sustentação Oral malfeita, sem preparo, com uma oratória fraca e sem a apresentação correta dos fatos do processo, pode transformar uma vitória certa em uma derrota amarga. Pode tirar a credibilidade do advogado, criar um ambiente de cansaço e exaustão, e, pior de tudo, prejudicar o cliente que confiou em sua competência.

Portanto, caros colegas, eu insisto: não "Experimentem a Tribuna". Não banalizem este ato tão nobre e importante. Estudem, preparem-se, e acima de tudo, respeitem o Tribunal, o processo e o seu cliente. Afinal, a Sustentação Oral pode não mudar todos os votos, mas certamente tem o poder de mudar o destino de um processo. E este poder está nas suas mãos.

Autor

Tathiana Pitas Advogada especializada em Tribunais; 2. Professora da Pós-Graduação de Direito e Processo Trabalho - Unitá Faculdade, Campinas; 3. Professora de Sustentação Oral e criadora do método TP de Sustentação Oral; 4. Pós-Graduada, PUC - SÃO PAULO - Direito e Processo do Trabalho, 2014; 5. Especialista pelo CEPE - Ciclo de Estudos de Política e Estratégia - UNESP - ADESG; 6. Graduação, UNIVERSIDADE DE FRANCA, conclusão 2001.

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