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Meios alternativos de resolução de litígios online: considerações sobre ORD, ADR e as plataformas digitais

A sociedade da informação influencia a resolução de conflitos com avanços tecnológicos. Alternativas como mediação e arbitragem ganham destaque, desafiando a cultura judicial tradicional do país.

7/1/2024

No atual estágio de desenvolvimento de nossa sociedade, adjetivada como Sociedade da Informação, são relevantes os recursos tecnológicos e comunicacionais, a microeletrônica, a inteligência artificial e as redes sociais. Nesta direção, as formas de resolução de conflitos também receberam impactos das mudanças trazidas pela revolução tecnológica incessante de nossos dias.

A transmissão de dados e de informações alterou a maneira como os indivíduos e as empresas se relacionam entre si e com o Poder Judiciário, demandando da ciência jurídica uma releitura de diversos de seus paradigmas e conceitos.

Apesar de nosso país possuir uma nítida cultura voltada para o monopólio da jurisdição como meio de solução de conflitos, têm se multiplicado no ordenamento jurídico com notável aceitação nos mercados e no meio empresarial, a utilização de meios alternativos de resolução de conflitos. Desde a promulgação da lei 9.307/96, a lei de Arbitragem, o mercado tem se voltado cada vez mais para as formas mais ágeis e econômicas de solução de disputas, por meio principalmente da mediação e da arbitragem, o que parte da doutrina tem denominado ADR (Alternative Dispute Resolution).

Os avanços digitais já permitem que a solução alternativa de litígios migre para a internet, propiciando a evolução da ADR para a ODR (Online Dispute Resolution), ou seja, a resolução de conflitos entre as partes por meios virtuais. Ou seja, a tecnologia modificou profundamente as maneiras pelas quais as pessoas buscam a solução de suas demandas e a abordagem de seus conflitos.

Um dos pontos mais interessantes dos métodos de resolução de conflitos online é que não estamos diante, tão somente, de um artifício de substituição dos ambientes físicos por meios virtuais e tecnológicos para que as partes busquem a solução amistosa para litígios tradicionais. A ODR traz consigo procedimentos e ambientes inexistentes nas técnicas tradicionais de solução de

litígios, os quais certamente nos mostram a existência de uma nova maneira de encarar tais demandas.

A Resolução de Disputas Online pode ser classificada em síncrona e assíncrona, a depender do tempo da comunicação entre as partes. A ODR síncrona é aquela na qual as partes debatem e negociam se comunicando de maneira imediata e em um mesmo ambiente virtual. Ou seja, existe um diálogo virtual em tempo real, onde os interessados estabelecem um canal de comunicação aberto para o envio e recepção de mensagens. Já a ODR assíncrona, por sua vez, é aquela na qual a comunicação entre as partes não ocorre em uma troca simultânea de informações, mas sim por meio de e-mails ou chats de troca de mensagens com o tempo de fala mais dilatado.

Em alguns casos, a ODR assíncrona pode facilitar a troca de documentos e informações durante as negociações, bem como viabilizar uma melhor utilização de ferramentas como inteligência artificial e algoritmos, visando a obtenção das decisões mais adequadas aos interesses das partes.

Um bom exemplo pode ser apontado na possibilidade de gestão de documentos e automatização de acordos por meio de plataformas de negociação online. Basta que imaginemos uma empresa com uma grande rede de filiais que deseja evitar a judicialização em massa por parte de seus clientes. A plataforma de acordos pode localizar dentro da base de dados aqueles clientes que atendam ao determinado perfil estipulado pela empresa e a abordagem. Com isso, as negociações podem ser feitas na própria plataforma, ou por meio de aplicativos de comunicação, e os ajustes firmados por meio de assinatura digital eletrônica. E tudo isso sem a necessidade de deslocamentos, reuniões presenciais e assinatura de vias físicas em papel.

As negociações online possuem uma série de vantagens em relação aos métodos tradicionais, como sua agilidade, a redução de custos operacionais para as partes envolvidas, o aumento na produtividade dos profissionais, bem como a maior comodidade para todos.

A ampla disseminação de legaltechs e lawtechs nos últimos anos tem nos demonstrado que empresas com alta litigiosidade, grandes litigantes, e com perfil altamente tecnológico, se inclinam para a adoção de ferramentas tecnológicas de ODR. A área da ciência jurídica que mais se beneficia destas inovações atualmente é o direito do consumidor, mas logo muitas outras especialidades estarão usufruindo destes recursos.

Embora nosso país ainda esteja distante de outros em matéria de utilização de técnicas de ODR, a intensa digitalização de nossos mercados e relações têm colaborado com o avanço destes recursos. É interessante lembrarmos que Machado de Assis já a muitos anos afirmou que “não importa o minuto que passa, mas o minuto que vem”, e o passar dos dias nos mostra o acerto do dramaturgo. Não só o Poder Judiciário e a Administração Pública como um todo, mas também e o mundo corporativo, vêm investindo bastante na digitalização de processos, o que torna a adoção de ODR questão de tempo.

Paulo Roberto Vigna
Advogado, sócio do escritório Vigna Advogados Associados e da VignaTax Consultoria Fiscal e Tributária, Mestre em Relações Sociais do Direito, com MBA em Gestão de Empresas pela FGV.

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