Migalhas de Peso

Nova norma do CFM sobre bariátrica e a compatibilização dos planos de saúde

Enquanto a medicina evolui, a burocracia resiste: a nova norma do CFM amplia o acesso à cirurgia bariátrica, mas o rol da ANS permanece uma barreira. Como paciente deve agir diante da divergência?

23/5/2025

Em 15 de maio de 2025, o CFM - Conselho Federal de Medicina publicou a resolução 2.429/25, atualizando os critérios clínicos para indicação da cirurgia bariátrica e metabólica no Brasil.

A nova norma amplia o acesso ao procedimento, sobretudo entre adolescentes, e exclui métodos considerados ultrapassados ou de alto risco.

Contudo, essa atualização médica entra em aparente conflito com as DUT - Diretrizes de Utilização da ANS - Agência Nacional de Saúde Suplementar, que continuam a restringir a cobertura da cirurgia pelos planos de saúde a critérios mais rígidos.

O resultado: uma crescente judicialização e insegurança para pacientes que, embora preencham os requisitos médicos, enfrentam negativas administrativas por parte das operadoras.

Neste artigo, analisamos as principais mudanças trazidas pelo CFM, os limites da ANS e os caminhos legais disponíveis para a garantia do direito à saúde.

O que mudou com a nova resolução do CFM?

A resolução CFM 2.429/25 revogou a anterior (resolução CFM 2.172/17) e promoveu importantes alterações na regulamentação da cirurgia bariátrica e metabólica no país. Dentre os principais pontos:

Com essas atualizações, o CFM visa alinhar a prática médica brasileira às diretrizes internacionais e evidências científicas mais recentes.

E a ANS? Regras para cobertura pelos planos permanecem rígidas.

A cobertura da cirurgia bariátrica pelos planos de saúde é regida pelas DUT do anexo II da resolução normativa ANS 465/21, que exigem o seguinte:

Essas exigências são mais restritivas que os critérios médicos atualizados pelo CFM, o que cria um descompasso regulatório.

Impasse entre CFM e ANS: e o direito à saúde?

A divergência entre as normas médicas e administrativas expõe os pacientes a uma situação de vulnerabilidade.

Muitos se veem aptos do ponto de vista médico, mas têm o pedido de cirurgia negado pelos planos de saúde com base na DUT da ANS.

Nesses casos, a jurisprudência tem sido clara ao reconhecer que:

“Não é razoável que o plano de saúde negue cobertura de procedimento prescrito por profissional médico com base apenas em diretrizes da ANS, quando houver evidências clínicas e respaldo técnico que justifiquem a conduta.”

Além disso, o STJ entende que:

“A recusa imotivada pela operadora de plano de saúde quanto à cobertura de tratamento prescrito por médico assistente é abusiva e representa descumprimento do contrato.”

Qual o caminho do paciente diante da negativa?

Diante da negativa de cobertura com base nas DUTs da ANS, o paciente pode:

  1. Pedir a revisão da negativa com a apresentação de um novo relatório médico mais detalhado e fundamentado às recomendações dispostas pelo CFM;
  2. Protocolar reclamação na ANS, solicitando análise do caso concreto;
  3. Buscar apoio jurídico especializado para promover ação judicial com pedido de liminar, juntando prescrição médica, exames e histórico clínico.

Conclusão: hora de compatibilizar ciência médica e regulação

A resolução CFM 2.429/25 representa um avanço importante no combate à obesidade grave no Brasil, ao atualizar os critérios de indicação da cirurgia bariátrica com base nas evidências mais atuais.

No entanto, a permanência das diretrizes restritivas da ANS gera uma lacuna perigosa entre ciência e burocracia, prejudicando o acesso ao tratamento.

É urgente que a ANS revise suas diretrizes de utilização à luz da nova resolução médica, sob pena de manter um sistema de saúde suplementar que, na prática, nega tratamentos respaldados pela comunidade científica.

Enquanto isso não acontece, cabe ao Judiciário exercer seu papel constitucional de garantir o direito à vida e à saúde, fazendo prevalecer o interesse do paciente frente às limitações contratuais e administrativas.

_______

Processo nº 1009730-30.2021.8.26.0001

STJ, REsp 1.712.163/SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão

Aline Vasconcelos
Advogada especialista em Direito da Saúde, com 15 anos de experiência na defesa de pacientes contra planos de saúde e na garantia de acesso a tratamentos e direitos essenciais.

Veja mais no portal
cadastre-se, comente, saiba mais

Artigos Mais Lidos

Abertura de empresas e a assinatura do contador: Blindagem ou burocracia?

3/12/2025

Como tornar o ambiente digital mais seguro para crianças?

3/12/2025

Recuperações judiciais em alta em 2025: Quando o mercado nos lembra que agir cedo é um ato de sabedoria

3/12/2025

Seguros de danos, responsabilidade civil e o papel das cooperativas no Brasil

3/12/2025

ADPF do aborto - O poder de legislar é exclusivamente do Congresso Nacional

2/12/2025