O auxílio-alimentação é um dos principais componentes da política de benefícios adotada por empresas públicas e privadas no Brasil, e tem objetivo de contribuir para a subsistência e bem-estar do trabalhador, sua natureza jurídica levanta debates relevantes, especialmente no campo do Direito do Trabalho.
Nesse contexto, diante da evolução do benefício, surge a dúvida: o auxílio-alimentação deve ser considerado uma verba de natureza indenizatória ou pode ser caracterizado como parcela de natureza salarial, gerando reflexos em direitos trabalhistas como férias, 13º salário, FGTS e verbas rescisórias?
Inicialmente, cumpre mencionar que o auxílio-alimentação é uma prestação fornecida pelo empregador ao empregado para garantir condições mínimas de alimentação, visando preservar sua saúde e produtividade.
A CLT não estabelece a obrigatoriedade do pagamento de auxílio-alimentação, partindo do princípio de que o salário deve ser suficiente para cobrir as despesas alimentares do trabalhador. Vejamos:
§ 2o As importâncias, ainda que habituais, pagas a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação, vedado seu pagamento em dinheiro, diárias para viagem, prêmios e abonos não integram a remuneração do empregado, não se incorporam ao contrato de trabalho e não constituem base de incidência de qualquer encargo trabalhista e previdenciário.
No entanto, muitas empresas optam por conceder esse benefício de forma voluntária, seja como uma estratégia de valorização do colaborador, seja por meio da adesão ao PAT - Programa de Alimentação do Trabalhador, previsto na lei 6.321/1976.
Primeiramente, a lei 6.321, de 14/4/1976, trata-se de uma legislação brasileira que instituiu o PAT - Programa de Alimentação do Trabalhador, tendo como objetivo melhorar as condições nutricionais dos trabalhadores de baixa renda, contribuindo para a sua saúde e desempenho no trabalho.
A lei permite que as empresas forneçam alimentação aos seus empregados por meio de refeitórios, cestas de alimentos ou vale-refeição, com incentivos fiscais, como a dedução das despesas com alimentação do lucro tributável. Essa legislação busca promover a segurança alimentar e o bem-estar do trabalhador, ao mesmo tempo em que estimula a produtividade e reduz os índices de faltas e doenças ocupacionais.
Nesse sentido, a discussão sobre a natureza jurídica do auxílio-alimentação gira em torno de dois conceitos principais:
Natureza indenizatória: Não integra o salário, pois tem como objetivo repor gastos do trabalhador com alimentação, sendo, portanto, uma vantagem de cunho assistencial. A adesão ao PAT é fator decisivo para garantir essa natureza.
Natureza salarial: Ocorre quando o auxílio é habitual, sem a vinculação ao PAT, ou mesmo quando há pagamentos em espécie, o que, segundo a jurisprudência consolidada, configura verba de natureza salarial.
Em adverso à CLT, a jurisprudência do TST tem caminhado no sentido de considerar a habitualidade e a forma de concessão como critérios essenciais para definir a natureza jurídica do auxílio-alimentação.
A súmula 241 do TST entende que o vale refeição possui natureza salarial, integrando a remuneração do trabalhador. Vejamos:
"O vale para refeição, fornecido por força do contrato de trabalho, possui natureza salarial, integrando a remuneração do empregado para todos os efeitos legais, salvo se previsto em norma coletiva ou se fornecido por liberalidade do empregador em decorrência da adesão ao Programa de Alimentação do Trabalhador (PAT).”
Assim, se o empregador não adere ao PAT ou realiza o pagamento em dinheiro, o valor passa a ser interpretado como salário in natura, com todas as implicações legais e trabalhistas.
O Tribunal Regional da 12ª Região, possui entendimento, de que o auxílio alimentação pago em dinheiro possui caráter contraprestativo e deve sim integrar ao salário. Vejamos:
AUXILIO-ALIMENTAÇÃO. PAGAMENTO EM DINHEIRO. NATUREZA SALARIAL. Nos termos do artigo 457, § 2º, da CLT, com redação dada pela Lei 13.467/2017, as importâncias, ainda que habituais, recebidas pelo empregado a título de ajuda de custo, auxílio-alimentação (salvo se pago em dinheiro), diárias para viagem, prêmios e abonos, não integram a remuneração e nem se incorporam ao contrato de trabalho, não constituindo, portanto, base de incidência de encargos trabalhistas e previdenciários. Ao contrário, o auxílio-alimentação pago em dinheiro diretamente à trabalhadora possui caráter contraprestativo e deve integrar o salário. (TRT da 12ª Região; Processo: 0000796-15.2023.5.12.0005; Data de assinatura: 07-02-2025; Órgão Julgador: Gab. Des. Gracio Ricardo Barboza Petrone - 4ª Turma; Relator(a): GRACIO RICARDO BARBOZA PETRONE)
Desse modo, a natureza jurídica do auxílio-alimentação depende fundamentalmente da forma como ele é concedido e da regularidade da adesão ao PAT - Programa de Alimentação do Trabalhador. Quando observadas as normas legais, como a vedação ao pagamento em espécie e a correta destinação dos valores, o auxílio tem natureza indenizatória, sem repercussões nas demais verbas trabalhistas. No entanto, o desvirtuamento da finalidade do benefício ou sua concessão de forma habitual e sem respaldo legal pode conferir-lhe caráter salarial.
Portanto, cabe ao empregador observar com rigor os requisitos legais e regulamentares, a fim de evitar passivos trabalhistas decorrentes do reconhecimento judicial de natureza salarial ao auxílio-alimentação. Já para o trabalhador, é fundamental compreender seus direitos e identificar eventuais irregularidades na forma de concessão do benefício.
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1 https://www.gov.br/trabalho-e-emprego/pt-br/servicos/empregador/programa-de-alimentacao-do-trabalhador-pat
2 https://jurisprudencia.tst.jus.br/?tipoJuris=SUM&orgao=TST&pesquisar=1
3 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del5452.htm
4 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6321.htm#:~:text=L6321&text=LEI%20No%206.321%2C%20DE%2014%20DE%20ABRIL%20DE%201976.&text=Disp%C3%B5e%20sobre%20a%20dedu%C3%A7%C3%A3o%2C%20do,programas%20de%20alimenta%C3%A7%C3%A3o%20do%20trabalhador.
5 https://exame.com/carreira/guia-de-carreira/pagamento-do-vale-alimentacao/
6 https://www.ticket.com.br/blog/pessoas-e-gestao/quem-se-enquadra-no-pat-entenda-o-que-diz-a-lei/#:~:text=%C3%89%20o%20Programa%20de%20Alimenta%C3%A7%C3%A3o,6%C2%B0