Em 2022, escrevi sobre a liberdade de expressão e a paródia no cinema, analisando o filme O Povo Contra Larry Flynt, baseado em fatos reais. O caso envolvia uma sátira publicada pela revista Hustler, de Larry Flynt, com uma entrevista fictícia e ofensiva ao pastor Jerry Falwell. A Suprema Corte dos EUA decidiu que, mesmo sendo de mau gosto, a paródia era protegida pela Primeira Emenda. Para a corte americana, figuras públicas não podem ser indenizadas por sátiras ou críticas, pois o humor é uma forma legítima de expressão.
Lembrei desse episódio ao acompanhar a condenação criminal do humorista Léo Lins, sentenciado a mais de 8 anos de prisão por piadas consideradas discriminatórias. Embora controverso e frequentemente ofensivo, Léo Lins se defende com base na liberdade artística e no humor como crítica social. Em seu show, fez piadas sobre nordestinos, pessoas com deficiência, negros, judeus, autistas, entre outros. A Justiça Federal brasileira entendeu que suas falas ultrapassaram os limites da liberdade de expressão e configuraram discurso de ódio.
A comparação entre os dois casos evidencia um abismo entre os sistemas jurídicos dos EUA e do Brasil no tratamento do humor. Enquanto a Suprema Corte americana protege até discursos dolorosos para garantir o debate público, o Judiciário brasileiro tem atuado como mediador do que é engraçado e do que é ofensivo. Aqui, a liberdade de expressão pode ser relativizada diante de outros direitos, como a dignidade e a não discriminação.
Como cidadão, identifico-me mais com a visão americana. Acredito que o Judiciário não deve julgar o conteúdo do humor. Piadas de mau gosto continuam sendo piadas. Como afirmou a Suprema Corte dos EUA no caso Snyder v. Phelps (2010): "Não podemos reagir à dor punindo o orador. Protegemos até discursos dolorosos para garantir que o debate público não seja sufocado."