O que é multiparentalidade?
A multiparentalidade é o reconhecimento jurídico de que uma pessoa pode ter mais de um pai e mais de uma mãe no registro civil - desde que haja vínculo afetivo, convivência e responsabilidade.
Não se trata de adoção nem de substituição de filiação, mas sim da inclusão de uma nova figura parental ao lado da biológica ou já registrada.
Com a ampliação desse reconhecimento, surgem novas perguntas jurídicas, especialmente em processos de inventário: como fica a partilha quando há mais de dois pais ou mães?
A multiparentalidade já é reconhecida no Brasil?
Sim. Em 2016, o STF fixou entendimento favorável à multiparentalidade:
RE 898.060/SC (Tema 622)
"O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, fixou tese nos seguintes termos: "A paternidade socioafetiva, declarada ou não em registro público, não impede o reconhecimento do vínculo de filiação concomitante baseado na origem biológica, com os efeitos jurídicos próprios"
Com base nesse julgado, cartórios passaram a aceitar registro civil com três ou mais genitores, e o Judiciário tem avançado na extensão dos efeitos sucessórios a todos os pais e mães reconhecidos.
O que dizem as decisões judiciais?
Em 2022, o TJ/SP decidiu que um pai socioafetivo (registrado posteriormente ao pai biológico) tinha os mesmos direitos sucessórios, incluindo quota na herança.
E, a 3ª turma do STJ também já sinalizou, em diversos julgados, que a socioafetividade gera efeitos patrimoniais, inclusive no Direito Sucessório.
Efeitos práticos em inventários e partilhas
Quando há mais de dois genitores reconhecidos juridicamente, os filhos passam a ter vínculo com todos - inclusive para fins de herança.
Ou seja:
- O filho pode herdar de todos os pais ou mães registrados, inclusive o socioafetivo;
- O pai ou mãe também pode ser herdeiro do filho multiparental;
- Os bens podem ser divididos entre três ou mais genitores, conforme o caso.
Isso altera significativamente o formato tradicional de partilha e exige planejamento sucessório detalhado para evitar litígios entre herdeiros e companheiros.
Como isso se aplica na prática?
Exemplo comum:
- Um homem cria a filha da esposa desde pequena, como se fosse sua;
- Anos depois, o pai biológico reaparece e é incluído no registro civil;
- Agora, a filha possui dois pais: um biológico e um socioafetivo.
Se um dos pais falecer, ambos os pais (ou mães) terão direito à herança da filha, assim como ela poderá ser herdeira dos dois.
Como garantir seus direitos na partilha com mais de dois pais ou mães?
- Verifique se a certidão de nascimento reconhece oficialmente todos os pais ou mães;
- Saiba que vínculos afetivos reconhecidos pela Justiça geram direito à herança;
- Se houver mais de um genitor, os bens podem ser divididos proporcionalmente;
- Um testamento claro pode evitar disputas entre genitores e companheiros/as; e,
- O apoio jurídico certo ajuda a respeitar os vínculos afetivos e garantir segurança patrimonial.
Em alguns casos, o ideal é buscar testamento com cláusulas claras para evitar conflito entre os pais/mães em caso de morte do filho ou vice-versa.
Conclusão:
A multiparentalidade é uma realidade reconhecida pelos tribunais e pelos cartórios. Seus efeitos vão muito além do emocional: envolvem direitos patrimoniais e sucessórios que precisam ser respeitados.
Inventários, testamentos e partilhas devem ser ajustados para essa nova configuração familiar, sob pena de injustiças e conflitos familiares duradouros.
A orientação de um advogado que atua com Direito de Família e Sucessões é essencial para garantir que os vínculos afetivos também tenham proteção patrimonial.