O PL 3.716/19, atualmente aguardando pauta na CCJC - Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania, de autoria da deputada federal professora Dorinha Seabra Rezende (DEM-TO), propõe a inclusão dos §§ 8º, 9º e 10 ao art. 15 da lei 8.906, de 4 de julho de 1994 (Estatuto da Advocacia e da OAB). O texto sugerido é o seguinte:
Art.15
§ 8º As sociedades de advogados podem firmar entre si consórcio para prestação de serviços jurídicos, delimitando cada qual o âmbito de atuação e as responsabilidades perante si e perante terceiros.
§ 9º Somente podem participar do consórcio a que se refere o § 8º, a sociedade de advogados com registro dos seus atos constitutivos aprovado no Conselho Seccional da OAB, em cuja base territorial tiver sede.
§ 10 O disposto nos §§ 8º e 9º se aplica à sociedade unipessoal de advocacia. (NR)
A Comissão Nacional de Sociedades de Advogados do Conselho Federal da OAB, sob relatoria do advogado Antônio Chaves Abdalla, emitiu uma nota técnica contrária à aprovação do projeto, apontando que a legislação vigente já contempla mecanismos adequados para parcerias entre sociedades de advogados. A seguir, apresento uma análise detalhada dos principais pontos abordados.
Natureza jurídica do consórcio
O consórcio, conforme disposto nos arts. 278 e 279 da lei 6.404/1976 (lei das sociedades por ações), é caracterizado como um contrato entre sociedades para a execução de determinado empreendimento. Não se trata de uma sociedade propriamente dita, porque o consórcio não possui personalidade jurídica. As consorciadas se obrigam apenas nas condições previstas no contrato.
Por outro lado, o art. 16 da lei 8.906/1994 veda o registro e funcionamento de sociedades de advogados que apresentem características de sociedades empresárias. Assim, a previsão de consórcios, como proposta no PL 3.716/19, não se alinha à natureza jurídica das sociedades de advogados, que não podem adotar práticas empresariais.
Mecanismos já previstos na legislação
A legislação atual há muito oferece instrumentos robustos para a colaboração entre sociedades de advogados, sem a necessidade de criação de consórcios. O provimento 112/06 e o provimento 170/16 da OAB regulamentam ajustes e distratos de associação ou colaboração entre sociedades de advogados, que devem ser averbados à margem do registro da sociedade.
Além disso, a lei 14.365/22, sancionada em 2 de junho de 2022, trouxe alterações significativas ao Estatuto da Advocacia, incluindo o § 9º ao art. 15, que estabelece:
Art.15,§9º
A sociedade de advogados e a sociedade unipessoal de advocacia deverão recolher seus tributos sobre a parcela da receita que efetivamente lhes couber, com a exclusão da receita que for transferida a outros advogados ou a sociedades que atuem em forma de parceria para o atendimento do cliente.
Essa disposição é suficiente e resolve a questão tributária mencionada na justificativa do PL 3716/19, permitindo que as sociedades colaborem sem incorrer em bitributação. Além disso, o § 8º do art. 22 considera como honorários convencionados aqueles decorrentes da indicação de clientes entre advogados ou sociedades de advogados, reforçando a viabilidade de parcerias formais.
Redundância e Inadequação do PL 3.716/19
O PL 3716/19 apresenta uma redação que, além de ser anterior à lei 14.365/22, não traz inovações práticas para o regime jurídico das sociedades de advogados. A proposta é redundante, porque:
- A legislação já permite associações e parcerias entre sociedades de advogados, com registro e transparência garantidos pela OAB.
- A responsabilidade civil e disciplinar dos advogados e das sociedades está claramente definida no Estatuto da Advocacia, não havendo necessidade de delimitação adicional no âmbito de consórcios.
A questão tributária foi solucionada pela lei 14.365/22, que assegura a tributação proporcional à receita efetivamente recebida individualizada por sociedade.
A aprovação do PL 3.716/19 seria inócua e desnecessária, configurando um caso de bis in idem legislativo.
Considerações finais
Conforme bem apontado na nota técnica da Comissão Nacional de Sociedades de Advogados, a legislação vigente já atende às necessidades de colaboração entre sociedades de advogados, sem comprometer a transparência, a responsabilidade ou a segurança jurídica. A recente atualização trazida pela lei 14.365/22 reforça ainda mais a desnecessidade de alterações no Estatuto da Advocacia para permitir consórcios. Dessa forma, conclui-se que o PL 3.716/19 não deve ser aprovado, porque não apresenta justificativa suficiente para modificar a lei 8.906/1994.