Migalhas de Peso

Do viral ao processo: O preço de crescer sem blindagem jurídica no mundo digital

Impérios digitais desabam sem base contratual. Do contrato social aos de parceria, cada cláusula é um tijolo que sustenta, ou derruba, o sucesso empresarial.

29/10/2025

Ela começou dançando no quarto, com o celular apoiado em uma pilha de livros.

Publicava vídeos curtos no TikTok e no Instagram, apenas por diversão.

Mas os vídeos viralizaram, e o que era passatempo virou negócio.

Vieram as “publis”, os contratos de parceria e, com eles, o pedido das empresas: “precisa emitir nota fiscal”. Sem saber ao certo o que era isso, abriu um MEI.

Pouco tempo depois, faturava o equivalente a R$ 100 mil por mês.

Um investidor apareceu prometendo “resolver a parte chata” enquanto ela apenas criava conteúdo.

Assinou o que lhe colocaram à frente. Anos depois, ao tentar retirar dinheiro da própria empresa, ouviu que “não podia”. O contrato limitava seus saques a R$ 400 mil por ano, e cláusulas ocultas cediam sua imagem e parte do lucro. A criadora que havia se tornado referência nacional agora enfrentava um pesadelo jurídico.

Essa história, real e comum, ilustra um problema crescente: empreendedores digitais que constroem verdadeiros impérios sem estrutura contratual sólida.

E no universo online, onde um post vale milhões, a ausência de respaldo jurídico pode custar a própria marca.

O contrato como pilar de sustentabilidade empresarial

Empresas digitais nascem todos os dias. Mas poucas nascem juridicamente preparadas. Muitos criadores, sócios e startups ainda veem o contrato como “burocracia”, quando na verdade ele é o elemento que dá forma, força e previsibilidade às relações comerciais.

O contrato social é o primeiro desses instrumentos, o core legal que define poder, lucros e responsabilidades.

É nele que se estabelecem quem decide, quem retira, quem responde e como se dá a entrada e saída de sócios ou investidores. Mas ele é apenas o começo.

O crescimento empresarial exige uma teia de instrumentos jurídicos igualmente estratégicos:

Todos esses documentos, quando bem elaborados, formam o arcabouço jurídico que sustenta a empresa, o equivalente à fundação de um prédio.

Sem eles, o sucesso é apenas uma estrutura bonita, mas construída sobre areia.

Os números que assustam (e explicam)

Empresas que adotam assessoria jurídica preventiva têm até 70% menos litígios ao longo da operação.

Mais de 90% das empresas brasileiras enfrentam problemas jurídicos evitáveis, segundo dados recentes.

Em 2023, mais de 35 milhões de processos no Brasil tiveram origem em contratos mal feitos. (Fontes: CNJ, Serasa Experian e FGV Direito SP, 2024).

Os números mostram o óbvio: quem economiza em contratos paga caro em disputas.

O perigo invisível dos prestadores de serviço

No ecossistema digital, é comum trabalhar com freelancers, produtores, editores, social media, fotógrafos, designers e programadores. Sem contratos adequados, o empresário corre o risco de ser processado como se esses colaboradores fossem empregados CLT.

Esse é um erro que fere de morte não apenas o caixa, mas também a reputação da marca. No universo em que a credibilidade é o maior ativo, um processo trabalhista pode destruir em dias o que levou anos para ser construído.

Cláusulas mal elaboradas, ou ausentes, sobre propriedade intelectual, confidencialidade e exclusividade são os principais gatilhos de litígio.

E o que é pior: podem causar perda de controle sobre conteúdos, estratégias e até sobre o próprio nome comercial.

Assessoria jurídica: Custo ou investimento?

Muitos empreendedores digitais enxergam o jurídico como despesa.

Mas, no mercado moderno, assessoria jurídica é estratégia de crescimento.

Ter contratos sólidos é ter previsibilidade. É saber o que se pode, o que se deve e o que se evita. É o que permite que o criador, a startup ou a marca cresçam sem medo, com segurança jurídica, tributária e reputacional.

Um bom advogado não é quem “apaga incêndios”, mas quem evita que eles comecem. No mundo corporativo, chamamos isso de risk management.

No jurídico, chamamos de prevenção contratual.

Impérios digitais precisam de alicerces jurídicos

A criadora da nossa história poderia ter evitado o caos se tivesse, desde o início, um contrato social estruturado e uma assessoria jurídica contínua.

O sucesso digital é veloz, mas a segurança jurídica é o que o torna duradouro.

No fim das contas, contrato não é papel, é proteção. É o que separa quem faz sucesso de quem permanece no sucesso. E, no universo dos negócios digitais, crescer sem contrato é como subir em um palco sem saber se há chão embaixo.

Aliane Leite
Advogada especialista em Direito Contratual e Empresarial, Planejamento Patrimonial e Estruturação de Holdings | Experiência Corporativa em Customer Success. Siga @alianeleite no Instagram.

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