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Dupes e propriedade intelectual: O limite entre inspiração e violação na era do consumo

Imitações desafiam os direitos autorais ao equilibrar acesso, inovação e proteção de criações originais.

29/10/2025

Dupe é um termo que evoluiu de sua definição tradicional de “engano” para um fenômeno cultural que está remodelando o comportamento do consumidor e desafiando as estruturas estabelecidas de propriedade intelectual. O que começou como uma tendência nas redes sociais transformou-se em um movimento que suscita questões complexas sobre inovação, acessibilidade e os limites da proteção da PI. Em diversas redes sociais, em particular no TikTok, vídeos com as hashtags #dupe e #dupes alcançam bilhões de visualizações.

Traduz-se Dupe como "cópia", "réplica" ou "imitação". No contexto comercial, um dupe é um produto que imita outro, mais conhecido e geralmente mais caro, mas com qualidade e durabilidade que variam. Dupe não utiliza a marca registrada do produto original para evitar problemas legais.

Seus defensores argumentam que essas práticas estimulam a inovação, ao obrigar as marcas a justificar preços mais elevados com diferenças reais de qualidade, e não apenas com o prestígio associado ao nome. Já os críticos sustentam que essa visão simplifica demais a questão, desconsiderando o valor do trabalho de design original e a relevância de proteger a inovação criativa.

Para marcas de luxo, o fenômeno dos dupes apresenta um desafio maior. Além da potencial perda de receita, elas enfrentam a diluição de seu apelo exclusivo e o comprometimento de  investimento em pesquisa, desenvolvimento e marketing.

Em 2023, o Tribunal Distrital de Nova York decidiu a favor da famosa casa francesa de moda de luxo  Hermès contra os criadores das MetaBirkins - NFTs que retratavam versões digitais da bolsa Birkin cobertas de pele -, estabelecendo precedente importante sobre a proteção de marcas no ambiente virtual e impactando os setores da moda e da arte digital.

Criadores independentes pequenos são mais vulneráveis, porque carecem dos recursos para proteger legalmente seus designs ou combater a cópia generalizada.

Exemplos de dupes não faltam no Brasil. Vão desde as bolsas inspiradas na icônica Hermès Kelly encontradas em lojas como Renner, passando pela base Matte da Tracta, que se tornou uma alternativa popular à famosa Estée Lauder Double Wear e pela  Air Fryer da Mondial, que é um exemplo de sucesso como alternativa à popular Air Fryer da Philips Walita. 

O fenômeno “Stanley Cup” também mostra essa dinâmica, onde a popularidade tanto do design original do copo isolado quanto de seus vários dupes foi amplificada através dos canais de mídia social mostrando como as tendências virais podem beneficiar criadores originais enquanto criam oportunidades para imitadores

Atualmente, soluções de IA baseadas em aprendizado de máquina combinam imagens microscópicas, visão computacional e análise de dados para autenticar produtos, identificar diferenças sutis e detectar falsificações em tempo real. Essas tecnologias monitoram descrições, padrões de vendas, preços e comportamentos de vendedores, sinalizando atividades suspeitas em diversos canais. Ao analisar esses elementos, a IA consegue identificar indícios de cópias e, assim, fortalecer os mecanismos de proteção disponíveis aos titulares dos direitos violados.

O debate em torno dos dupes mostra um dilema da economia contemporânea: como conciliar o direito de acesso a produtos e tendências com a proteção efetiva da criação intelectual e do investimento em inovação? Se, por um lado, as imitações democratizam o consumo e estimulam a competitividade, por outro, podem desvalorizar o trabalho criativo, enfraquecer marcas e desincentivar o desenvolvimento de novos produtos.

O caminho mais promissor parece ser a combinação  de evolução legislativa, estratégias empresariais criativas, investimento em tecnologia e uma reflexão social mais ampla sobre o valor da originalidade.

Em um mercado global cada vez mais veloz e interconectado, a capacidade de adaptar-se a esse novo cenário definirá não apenas o sucesso comercial, mas também os contornos da própria propriedade intelectual na próxima década.

Rafaela Borges Walter
Sócia do Dannemann Siemsen graduada em Direito pela PUC-Rio, L.L.M. em Direito da Propriedade Intelectual pela Philipps Universität Marburg, na Alemanha, pós-graduada em Direito Societário de Mercados de Capitais pela FGV-Rio, com MBA em Management pela PUC-Rio e Mestrado em Administração com Ênfase em Organizações pela PUC-Rio.

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