Há muito temos tratado da relação direta entre o Direito Tributário e o Direito do Trabalho, com enfoque na conformidade, que devem ser observados de forma interdisciplinar, para que as normas sejam efetivamente cumpridas, sem que se abram riscos numa ou noutra área nas rotinas empresariais.
Os conflitos entre as áreas residem em diversos pontos conceituais que divergem (ou até convergem em face das empresas) sob a ótica das respectivas autoridades fiscais e judiciárias, como o tratamento de verbas remuneratórias como indenizatórias, as “pejotizações”, os pagamentos baseados em ações, os prêmios, além dos benefícios concedidos a empregados.
A reforma trabalhista de 2017 (lei 13.467) buscou solucionar pontos controversos, que davam margem para questionamentos fiscais, como foi o caso da força normativa dos acordos e convenções coletivas de trabalho. O art. 611-A da CLT foi taxativo ao dispor que “a convenção coletiva e o acordo coletivo de trabalho têm prevalência sobre a lei” em uma série de matérias, incluindo remuneração, jornada e benefícios.
Destaca-se que as normas coletivas não são opcionais entre empresas e empregados. Possuem força coercitiva estatal. O não cumprimento de uma cláusula de concessão de benefícios, como plano de saúde ou vale-alimentação acarreta multas administrativas do Ministério do Trabalho, ações judiciais trabalhistas e risco de paralisação da força de trabalho. Portanto, sob a ótica empresarial e operacional, esses custos são tão obrigatórios quanto o pagamento de energia elétrica ou compra de matéria-prima.
Apesar dessa obrigatoriedade, da relevância e essencialidade desses gastos nas atividades operacionais, o que ensejaria possibilidade de crédito da Contribuição ao PIS e da COFINS, a Receita Federal do Brasil sempre manteve o entendimento de que despesas decorrentes de acordos e convenções coletivos não se enquadram no conceito de “imposição legal” para fins de creditamento dessas contribuições.
A solução de consulta COSIT 57/23 evidencia essa visão fiscalista, em contrariedade com a reforma trabalhista: reconhece o crédito para o vale-transporte, porque existe previsão expressa na lei 7.418, de 1985, mas nega para o vale-alimentação e planos de saúde, mesmo que previstos em normas coletivas, sob o argumento de que faltaria a “previsão legal estrita”.
Uma série de benefícios, portanto, atualmente concedidos aos empregados, pelas empresas, não geram crédito da contribuição ao PIS e da COFINS, sob o argumento da inferioridade normativa dos instrumentos coletivos em relação à lei.
Em contrapartida, a reforma tributária, regulamentada pela LC 214, de 2025, ao instituir o IBS - Imposto sobre Bens e Serviços e a CBS - Contribuição Social sobre Bens e Serviços, propõe a adoção da “não-cumulatividade plena” ou do “crédito financeiro amplo”, fazendo referência expressa aos instrumentos coletivos de trabalho.
Apesar do texto ser expresso, quanto à vedação do crédito sobre materiais de uso e consumo (art. 47), o art. 57, parágrafo 3º, traz exceção quanto aos “bens e serviços de uso ou consumo pessoal utilizados preponderantemente na atividade econômica do contribuinte”, elencando, inclusive, os planos de saúde, fornecimento de vale-transporte, de vale-refeição e vale-alimentação destinados “a empregados e seus dependentes em decorrência de acordo ou convenção coletiva de trabalho”.
A expressão “utilizados preponderantemente na atividade econômica do contribuinte” leva à conclusão de que os créditos deverão ser restritos aos gastos com o pessoal diretamente alocado na produção dos bens ou serviços, seguindo o entendimento atual das autoridades fiscais.
De toda forma, finalmente, o texto regulamentador da reforma tributária foi cristalino ao tratar da possibilidade de crédito de IBS e CBS sobre os benefícios a empregados, quando houver previsão de obrigatoriedade nos instrumentos coletivos.
Com isso, dentre os procedimentos para a devida transição do atual sistema tributário para o que virá a partir de 2026, as empresas deverão iniciar imediatamente a revisão da redação de seus instrumentos coletivos, bem como verificar quais os benefícios são concedidos por políticas internas e buscar sua migração para os acordos coletivos e, assim, garantir a elegibilidade ao crédito no novo regime.
A reforma tributária, ao elevar as convenções coletivas ao status de fonte geradora de crédito tributário, harmoniza o Direito Tributário com o Direito do Trabalho, encerrando entendimentos divergentes entre as áreas e beneficiando aos empresários e empregados.