Em texto publicado anteriormente1, defendemos que os honorários advocatícios de sucumbência, em incidentes de desconsideração da personalidade jurídica, devem ser fixados por equidade, à luz do art. 85, § 8.º, do CPC, tanto em casos de procedência quanto em casos de improcedência do pedido. Assim consideramos porque não há, no julgamento do incidente, qualquer impacto no valor da dívida cobrada. Por esse motivo, o benefício econômico é inestimável.
Na ocasião, mencionamos que se iniciara, no STJ, o julgamento do REsp 2.146.753/RN. Pontuamos que o voto do relator ministro Moura Ribeiro2, único proferido até então, havia sido no sentido de que não seria possível a fixação dos honorários pelo critério equitativo, à luz do Tema 1.076. Ele manifestara, então, o entendimento de que no caso poderia ser identificado proveito econômico, pois este, ainda que não pudesse ser mensurado, não seria inestimável. Também constou de seu voto que não se aplicaria ao caso o posicionamento da 1ª Seção da Corte, manifestado no julgamento dos EREsp 1.880.560/RN, de cuja ratio se extrai que, em caso de exclusão de litisconsorte do polo passivo do processo de execução sem que tenha havido impacto na dívida executada, os honorários advocatícios deverão ser fixados por apreciação equitativa. A seu ver, aquele precedente não se aplicaria à hipótese em julgamento porque, aqui, não estaria em jogo apenas a questão processual relativa à ilegitimidade, mas também alegações de fraude, confusão patrimonial e má-fé que embasaram o pedido.
No artigo antes referido, manifestamos nossa discordância quanto a esse modo de pensar, fundamentalmente, porque: (i) o precedente da Corte Especial, segundo o qual o indeferimento do incidente de desconsideração da personalidade jurídica dá ensejo à fixação de verba honorária em favor do advogado de quem foi indevidamente chamado a litigar em juízo, contém orientação expressa no sentido de que, embora a matéria atinente aos critérios para fixação dos honorários sucumbenciais não tenha sido objeto do recurso que se encontrava em julgamento, “[...] haja vista a semelhança das hipóteses fáticas, deve-se atentar para o recente julgado da 1ª Seção [...]”3; e (ii) o alcance da controvérsia nos incidentes de desconsideração da personalidade jurídica se limita - ou deveria se limitar - à ocorrência ou não de abuso da personalidade jurídica, à luz do art. 50 do CC, e não à dívida em si, que somente será objeto de discussão em momento processualmente posterior à procedência do pedido veiculado no incidente, quando a pessoa “desconsideranda” passará à condição de executada.
O julgamento do REsp 2.146.753/RN findou-se em 11/11/2025. O relator, ministro Moura Ribeiro, modificou seu voto após a apresentação de voto-vista pelo ministro Ricardo Villas Bôas Cueva. O acórdão proferido pela 3ª turma do STJ foi unânime no sentido de que admitir a fixação dos honorários advocatícios de sucumbência em incidente de desconsideração da personalidade jurídica por equidade4.
Esse entendimento, a nosso ver, é absolutamente acertado, e se coaduna com a opinião que havíamos manifestado, no artigo antes referido.
Da fundamentação do voto do relator constou que “[...] a não inclusão dos sócios (ou das empresas) no polo passivo da lide - situação que se equipara à sua exclusão quando indicado desde o princípio para integrar a relação processual - não implica a extinção da execução, nem a redução do valor cobrado, evidenciando a irrelevância patrimonial da controvérsia”, e que, se arbitrados os honorários à luz do art. 85, § 2.º, do CPC, “[...] poder-se-ia chegar à absurda situação, vedada pelo próprio § 2.º do art. 85 do CPC, de condenação da parte exequente ao pagamento de verba honorária superior ao limite de 20%, o que não se pode admitir”.
Trata-se, como defendemos no artigo anteriormente referido, da solução juridicamente adequada. Esta recentíssima definição da 3ª turma do STJ no julgamento do REsp 2.146.753/RN consolida, de forma clara e definitiva, a compreensão de que a fixação dos honorários sucumbenciais em incidentes de desconsideração da personalidade jurídica deve observar o critério equitativo, à luz do art. 85, § 8.º, do CPC. Ao reconhecer a natureza inestimável do proveito econômico nessas hipóteses, o acórdão reafirma a coerência do sistema, prestigia o precedente da 1ª Seção do Tribunal (fixado no julgamento do EREsp 1.880.560/RN, acima mencionado) e evita distorções que poderiam conduzir à fixação de honorários em patamares incompatíveis com a lógica do processo executivo.
Este posicionamento representa um movimento significativo em direção à uniformização da jurisprudência sobre o tema, reforçando que o incidente de desconsideração deve se ater à verificação do abuso da personalidade jurídica, sem projetar efeitos indevidos sobre a dívida executada ou sobre questões outras que extrapolam a inteligência do art. 50 do CC.
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1 Disponível em: https://www.medina.adv.br/conteudos/publicacoes/honorarios-de-sucumbencia-em-idpj-devem-ser-fixados-por-equidade. Acesso em 5 dez 2025.
2 Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=JQYnlO1MfEw&t=129s. Acesso em 15 jul. 2025.
3 STJ, REsp n. 2.072.206/SP, relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva, Corte Especial, julgado em 13/2/2025.
4 STJ, REsp n. 2.146.753/RN, relator Ministro Moura Ribeiro, Terceira Turma, julgado em 11/11/2025.