Migalhas Quentes

Difícil acesso - cidadãos não conseguem fazer justiça

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25/5/2006

 

Difícil acesso

 

Pesquisa mostra a dificuldade do cidadão comum de chegar à Justiça em 9 capitais

 

No Rio de Janeiro, um juiz auxiliar realiza audiências de conciliação dentro de um cofre, no subsolo de imóvel cedido pelo Banco do Brasil.

 

No Amapá, um juizado itinerante sobe o rio num barco. A "sala de audiências", onde a juíza celebra casamentos ou decide casos de trabalho escravo, à noite vira dormitório.

 

Em Minas, nos dias de jogos, um juiz criminal, um promotor, um defensor público e um delegado decidem sobre conflitos numa sala improvisada no estádio do Mineirão.

 

Esses são exemplos de juizados especiais, a porta de acesso à Justiça para o cidadão comum. O modelo substituiu os juizados de pequenas causas criados em 1984. Em geral, as instalações são precárias, faltam conciliadores, acumulam-se reclamações de consumidores, principalmente contra as empresas de telefonia.

 

A Secretaria de Reforma do Judiciário, órgão do Ministério da Justiça, divulga hoje uma pesquisa sobre Juizados Especiais Cíveis realizada em nove capitais entre 2004 e 2006, com base em processos distribuídos em 2002. As principais reclamações envolvem relações de consumo (37,2%), acidentes de trânsito (17,5%) e cobrança de dívidas (14,8%).

 

O objetivo do juizado especial é obter o acordo, evitando-se o processo. Mas é considerada muito baixa a taxa de conciliação (34,5%). São baixos os índices de recursos (31,2%) e de reforma de sentenças (12,4%). Muitos acordos não são cumpridos. Quando é necessária a execução da sentença, o processo pode demorar 649 dias.

 

Reclamações

 

Em 93,7% dos casos, os reclamantes são pessoas físicas, com os mais variados problemas. Cita-se uma ação de indenização contra funerária, porque o travesseiro do defunto era muito baixo. Há pedido de indenização por propaganda enganosa para aumentar o tamanho do pênis. Uma prostituta moveu ação contra um delegado, alegando ter fornecido "serviços a mais" e recebido a menos.

 

"Esses juizados são muito procurados, mas sofrem o mesmo problema do juízo comum: não têm atendimento rápido", diz Maria Tereza Sadek, cientista política e pesquisadora do Centro Brasileiro de Estudos e Pesquisas Judiciais (Cebepej), que participou da pesquisa.

 

Muitos casos envolvem baixos valores. Foi movida ação de danos morais por erro de R$ 0,50 no troco de cigarros. Empresa de energia foi acionada por cobrança indevida de R$ 0,01. Instituição financeira obteve acordo para pagar indenização em 85 parcelas de R$ 20.

 

Os serviços de telecomunicações aparecem como principal reclamação na categoria "relação de consumo". Atingem 44,2% em Fortaleza; 41,9% em Macapá; 33,6% no Rio e 32,4% em Salvador. A média é de 22,8% das reclamações. Em seguida, vêm queixas sobre transações comerciais (19,3%) e serviços bancários (11,8%).

 

A pesquisa foi encomendada ao governo pela Telemar. Isso não impediu o Cebepej de revelar que a empresa chega a ocupar dependências de juizados especiais, para prestar esclarecimentos e reduzir conflitos. "Não recebi pressão do governo nem da Telemar", diz Sadek.

 

"Identificado o problema, temos de trabalhar políticas para minimizar esse tipo de litígio e fortalecer um sistema de conciliação prévia", diz o secretário de Reforma do Judiciário, Pierpaolo Bottini. Ele diz que não houve nenhum constrangimento com a Telemar.

 

No juizado especial de Montese, bairro de Fortaleza, 90% das queixas referem-se à Telemar, por cobranças incorretas. Ali, um escritório paulista de advocacia faz a defesa da empresa. Num juizado em Belém, há uma sala exclusivamente para a Telemar. Uma funcionária, "não autorizada a celebrar acordos", presta informações.

 

Num dos juizados especiais do Rio funciona o chamado "Expressinho" (sala reservada à Telemar para tentativa de resolução dos conflitos). Isso não conseguiu reprimir as ações. Contratada para implantar sistema de gestão, a Fundação Getúlio Vargas recomendou a retirada do espaço. A pesquisa cita que a empresa obteve maior volume de acordos no Rio.

 

Em São Paulo, os juizados especiais possuem instalações modestas, são pouco informatizados. São propostas cerca de 500 causas por dia contra a Telefonica. Há cerca de 55 mil ações para discussão da obrigatoriedade da assinatura básica.

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