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TRT-11: Inconstitucional cobrança de custas de beneficiário de gratuidade que faltou a audiência

Corte entendeu que o §3º do artigo 844 da CLT viola o princípio constitucional de acesso à Justiça.

4/3/2020

O Pleno do TRT da 11ª região declarou a inconstitucionalidade do §3º do art. 844 da CLT, inserido pela reforma trabalhista. O dispositivo condiciona a propositura de nova ação trabalhista ao pagamento de custas processuais pelo beneficiário da justiça gratuita que tiver o processo arquivado após falta injustificada à audiência. 

Origem

A arguição de inconstitucionalidade teve origem em um processo no qual o reclamante deixou de comparecer a uma audiência e foi condenando, pelo juízo de 1º grau, ao pagamento das custas processuais, apesar de ter os benefícios da justiça gratuita concedidos.

Desempregado, o autor interpôs recurso ordinário objetivando obter os benefícios da justiça gratuita e a isenção do pagamento das custas, arguindo a inconstitucionalidade dos dispositivos legais presentes na reforma trabalhista.

A instauração do incidente foi acolhida por maioria da 3ª turma do TRT da 11ª região, com a suspensão do julgamento do feito e remessa dos autos para apreciação do Tribunal Pleno.

A tese trazida à apreciação pela 3ª turma foi a de inconstitucionalidade da expressão “ainda que beneficiário da justiça gratuita”, constante do parágrafo 2º, e da íntegra do parágrafo 3º, ambos do art. 844, da CLT, na atual redação definida pela lei 13.467/17.

Conforme os dois parágrafos introduzidos pela reforma trabalhista, o trabalhador que faltar à audiência inicial do processo deverá pagar custas, mesmo sendo beneficiário da justiça gratuita (§ 2º), e o cumprimento desta obrigação é pré-requisito para ajuizamento de nova demanda (§3º).

Acolhimento parcial

Segundo a desembargadora Ormy da Conceição Dias Bentes, relatora, a garantia de assistência jurídica integral e gratuita contida na Constituição alcança também o direito à gratuidade de Justiça, cuja disciplina está inserida nos artigos 789 da CLT, e artigos 98 a 101 do CPC.

“Com efeito, se é do Estado a obrigação de promover assistência jurídica integral e gratuita ao hipossuficiente, a imposição do pagamento de custas processuais ao beneficiário da justiça gratuita nos casos de arquivamento da ação pelo não comparecimento do obreiro à audiência inaugural afronta diretamente o art. 5º, XXXV e LXXIV, da Constituição da República.”

Apontou, ainda, que pela interpretação do dispositivo constitucional, o único requisito para obtenção do benefício da gratuidade de justiça é a insuficiência de recursos, de modo que atendidos os requisitos para a concessão da gratuidade, “a conclusão lógica é de que, se o Estado deve prestar assistência jurídica integral, não pode, ao mesmo tempo, fazer com que a parte beneficiária tenha de arcar com as custas do processo, quando a despesa pode comprometer sua própria subsistência e de sua família".

Para a magistrada, a imposição de pagamento de custas ao trabalhador hipossuficiente e o condicionamento do ingresso de nova demanda ao recolhimento referido, equivale a “retirar ou, pelo menos, dificultar ao extremo”, o exercício do direito fundamental ao acesso à Justiça, previsto no artigo 5º da Constituição: "XXXV - a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito".

Afirmou, ainda, que obrigar o pagamento de custas pelo beneficiário da gratuidade de justiça assume feição de sanção processual de cunho punitivo, o que não pode ser chancelado ao fulminar, praticamente, a possibilidade de acesso à Justiça, “precisamente daquele que não dispõe de recursos para suportar tal encargo”.

“Enquanto cidadãos carecedores de recursos encontram na Justiça Comum amplo acesso para defesa de seus direitos fundamentais, especialmente os direitos prestacionais inerentes ao mínimo existencial (verbas alimentares, benefícios previdenciários e assistenciais, medicamentos, serviços básicos de saúde e assistência social etc.), o trabalhador sem recursos é compelido a utilizar verbas alimentares, indispensáveis a seu sustento, auferidas em processo trabalhista, para pagar custas e despesas processuais.”

Assim, em acolhimento parcial, o Pleno declarou a inconstitucionalidade apenas do §3º do art. 844 da CLT, por violação ao princípio constitucional de acesso à Justiça.

Confira a íntegra do acórdão.

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