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FGV Direito SP lança o projeto Mapas da (In)Justiça

Estudo revela que nenhum policial foi responsabilizado por abordagens letais em São Paulo entre 2018 e 2024. Em 62% dos casos, as vítimas eram negras.

6/5/2025

Mapa de (In)justiça(Imagem: Divulgação )
O Centro de Pesquisa Aplicada em Direito e Justiça Racial da FGV Direito SP lançou o projeto "Mapas da (In)Justiça" — uma plataforma interativa que possibilita a consulta a investigações e crimes contra pessoas negras no Estado de São Paulo.

O projeto foi construído com base em uma pesquisa que investigou o papel dos órgãos da Justiça na apuração dessas ocorrências entre 2018 e 2024, com ênfase na responsabilização de agentes de segurança pública e no papel das instituições que compõem esse sistema no Estado.

Foram analisados documentos extraídos de 859 procedimentos criminais, sobretudo boletins de ocorrência, relatórios e laudos, pareceres do Ministério Público e decisões judiciais.

A principal constatação, segundo o projeto, é que, nesse período, nenhum policial foi responsabilizado por abordagens violentas contra a população no Estado de São Paulo. Desse total, em 62% dos casos, as vítimas eram negras.

Os dados reunidos revelam um cenário de persistente impunidade, no qual a atuação policial letal é sistematicamente legitimada por narrativas oficiais, sustentadas em registros documentais marcados por seletividade racial, apagamentos e omissões técnicas”, explica Julia Drummond, coordenadora-geral do Mapas da (In)Justiça.

"A análise dos boletins de ocorrência, por exemplo, mostra que categorias genéricas como “prática de crime” ou “atitude suspeita” são amplamente mobilizadas para justificar abordagens violentas."

 

A pesquisa aponta que as omissões investigativas também são estruturantes desse quadro. “A precariedade das perícias, a ausência de exames básicos — como o de resíduo de pólvora — e a demora na emissão de laudos, com notável racialização dos atrasos, expõem fragilidades sistemáticas na apuração dos fatos e contribuem para a consolidação da narrativa policial”, explicam os pesquisadores.

Outro ponto destacado, segundo os pesquisadores, é a corroboração dessas versões pelo Poder Judiciário, que não apenas desresponsabiliza os agentes, como também inverte a lógica da proteção da vida, atribuindo às vítimas a responsabilidade por sua própria morte.

O ciclo de impunidade que emerge dessa análise é profundamente atravessado por marcadores raciais, evidenciando que o sistema de justiça criminal, longe de ser neutro, opera como vetor de reprodução das desigualdades estruturais que marcam a sociedade brasileira.

Segundo os pesquisadores, é necessário ampliar o debate público para a formulação de políticas voltadas à reversão desse quadro. “O enfrentamento da violência estatal exige o fortalecimento dos mecanismos de controle externo, o aprimoramento das práticas investigativas e, sobretudo, o compromisso político com a vida da população — principalmente da população negra, que segue sendo a principal vítima da violência institucionalizada.

Apesar de ainda persistirem importantes barreiras à transparência e à obtenção de dados públicos, os resultados da pesquisa indicam, segundo os pesquisadores, pequenos avanços na interoperabilidade entre os órgãos do sistema de justiça criminal paulista, notadamente pela adoção da numeração única do CNJ no inquérito policial eletrônico, o que viabilizou a construção da base de dados.

A plataforma Mapas da (In)Justiça oferece visualizações interativas sobre a letalidade policial no Estado de São Paulo, incluindo dados sobre o perfil das vítimas, infraestrutura urbana e etapas da investigação e do processo judicial. A base de dados completa utilizada na pesquisa — incluindo os prompts usados na aplicação de IA — encontra-se disponível no portal Dataverse FGV (clique aqui), com possibilidade de download e reúso. O estudo completo está disponível aqui!

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