Por unanimidade, a 11ª câmara do TRT da 15ª região majorou de R$ 5 mil para R$ 30 mil a indenização por danos extrapatrimoniais devida a advogada que sofreu violência de gênero praticada pelo presidente do sindicato em que trabalhava.
Determinou-se também, de ofício, que a entidade implemente medidas obrigatórias de prevenção e enfrentamento à discriminação de gênero.
O colegiado destacou que a conduta configurou grave violência institucional, sobretudo por partir de quem tinha o dever de proteger os trabalhadores.
Entenda o caso
A trabalhadora foi contratada como advogada em abril de 2022 e dispensada sem justa causa seis meses depois. Na ação, relatou ter sido alvo de expressões ofensivas e discriminatórias por parte do presidente da entidade, que teria utilizado termos como “vagabunda”, “miserável” e “desgraçada”, além de comentários depreciativos sobre sua aparência e insinuações quanto à sua moral.
O juízo da 3ª vara do Trabalho de Jundiaí/SP reconheceu o dano e fixou indenização em R$ 5 mil. O sindicato recorreu, alegando ausência de provas e buscando desqualificar a testemunha da autora com base em antecedentes criminais.
A trabalhadora, por sua vez, pleiteou a majoração da indenização, argumentando que a violência ultrapassava o mero abuso diretivo e configurava discriminação de gênero.
Violência institucional e perspectiva de gênero
Ao analisar o caso, o relator, desembargador João Batista Martins César, destacou que a violência sofrida não se limitou ao âmbito individual, mas se inseriu em um contexto de desigualdade estrutural de gênero, reforçada pela posição de poder do agressor.
Aplicando o Protocolo do CNJ para Julgamento com Perspectiva de Gênero, concluiu que a prova testemunhal, ainda que indireta, era suficiente e coerente para demonstrar um ambiente de trabalho hostil e discriminatório.
O relator enfatizou que a tentativa de desqualificar a testemunha com base em elementos alheios ao processo reproduzia estereótipos de gênero, como a crença de que mulheres exageram ao relatar violência, e contrariava parâmetros internacionais de proteção, incluindo a Convenção de Belém do Pará e a Opinião Consultiva OC-27/21 da Corte Interamericana.
Para o magistrado, a conduta atribuída ao presidente do sindicato revela contradição flagrante com os princípios históricos da representação sindical, ao transformar um espaço destinado à proteção trabalhista em local de revitimização.
Diante da gravidade da violência, da posição hierárquica do agressor e do caráter pedagógico da reparação, fixou a indenização em R$ 30 mil.
Além disso, determinou a expedição de ofício ao Ministério Público do Trabalho, nos termos do art. 530 da CLT, que veda a ocupação de cargos de direção sindical por dirigentes que pratiquem atos de má conduta, com possível enquadramento na lei de improbidade administrativa.
Medidas obrigatórias de prevenção e combate à violência de gênero
Reconhecendo que a discriminação produz efeitos coletivos e estruturais, o TRT-15 impôs ao sindicato a adoção de medidas preventivas:
- capacitação obrigatória de gestores e lideranças sobre violência e discriminação de gênero;
- campanha educativa anual no mês de março, com mensagens nos comprovantes de pagamento;
- elaboração ou revisão de código de conduta, com procedimentos claros para denúncias e sanções;
- criação de canal sigiloso de denúncias, com equipe capacitada e sem revitimização;
- apresentação de relatórios semestrais sobre a implementação das medidas;
O descumprimento acarretará multa diária de R$ 300, revertida a atividades educativas.
Para o relator, essas medidas são imprescindíveis para restaurar a integridade institucional da entidade e concretizar a igualdade substantiva prevista na Constituição e em tratados internacionais.
- Processo: 0011234-37.2023.5.15.0096
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