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OAB/SP e desafios da Justiça do Trabalho na era da uberização: Entre o Direito Digital e a proteção ao trabalhador

Uma das questões centrais é a terceirização irrestrita, normatizada pela lei 13.429/17 e referendada pelo STF no Tema 725 de repercussão geral, que permite a terceirização inclusive das atividades-fim das empresas.

1/3/2024

No cenário atual, a interferência do Supremo Tribunal Federal (STF) na competência dos casos analisados pela Justiça do Trabalho, particularmente aqueles que envolvem a relação entre motoristas de aplicativos e empresas como Uber, tem gerado um debate amplo e complexo, especialmente no que diz respeito ao Direito Digital e ao Direito do Trabalho. Este debate foi intensificado pela manifestação nacional da Justiça do Trabalho contra decisões do STF, que apontam para uma potencial precarização do trabalho e questionam o futuro da regulamentação das relações laborais na era digital.

Uma das questões centrais é a terceirização irrestrita, normatizada pela lei 13.429/17 e referendada pelo STF no Tema 725 de repercussão geral, que permite a terceirização inclusive das atividades-fim das empresas. Essa decisão do STF representa um marco na forma como as relações de trabalho são concebidas, especialmente no contexto da digitalização e da chamada "uberização" do trabalho. A Justiça do Trabalho, tradicionalmente encarregada de analisar as relações de trabalho, vê sua competência questionada por decisões que tendem a validar formas de contratação que podem desvirtuar os direitos trabalhistas, como a "pejotização", onde empregados são contratados como pessoas jurídicas, uma prática que mascara a relação de emprego.

A Ordem dos Advogados do Brasil seção São Paulo (OAB/SP) tem tomado uma posição ativa neste cenário, assinando uma carta em defesa da competência constitucional da Justiça do Trabalho. Esta carta alerta sobre a importância do respeito aos direitos trabalhistas e o risco fiscal e previdenciário decorrente da validação de contratações fraudulentas. A OAB-SP e outras 66 entidades representativas da advocacia, magistratura, ministério público, academia e movimento sindical, uniram-se em defesa do Direito do Trabalho, destacando o papel fundamental da Justiça do Trabalho na arrecadação de bilhões de reais em impostos e na manutenção dos direitos trabalhistas conquistados ao longo das décadas.

As ações do STF, como a decisão monocrática que removeu da Justiça do Trabalho a análise do vínculo empregatício de motoristas de aplicativos, direcionando-a para a Justiça comum, são vistas pela OAB-SP como um esvaziamento preocupante da Justiça do Trabalho, que compromete sua existência e função social. Essa decisão e outras semelhantes levantam questões sobre o futuro da proteção dos trabalhadores na era digital, especialmente aqueles vinculados a plataformas de aplicativos.

Este cenário complexo exige uma reflexão profunda sobre o equilíbrio entre a inovação tecnológica e a proteção dos direitos trabalhistas. A manifestação da Justiça do Trabalho, apoiada pela OAB-SP e outras entidades, é um chamado para a sociedade civil se mobilizar em defesa dos direitos trabalhistas e da competência da Justiça do Trabalho, garantindo que as transformações no mundo do trabalho não comprometam os direitos básicos dos trabalhadores.

A convergência entre o Direito Digital e o Direito do Trabalho nesta questão reflete os desafios de adaptar as leis trabalhistas a uma economia cada vez mais digitalizada, onde as formas tradicionais de emprego são desafiadas por novos modelos de negócios baseados em tecnologia. A resposta a esses desafios passará necessariamente pelo diálogo entre os diversos setores da sociedade, incluindo o poder judiciário, a advocacia, os sindicatos e as empresas de tecnologia, buscando soluções que promovam um equilíbrio justo entre inovação e proteção dos trabalhadores.

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Fontes:

Sintrajufe
Jornal da Advocacia OAB/SP

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Colunistas

Coriolano Aurélio de Almeida Camargo Santos é advogado e Presidente da Digital Law Academy. Ph.D., ocupa o cargo de Conselheiro Estadual da Ordem dos Advogados do Brasil, Seção São Paulo (OAB/SP), com mandatos entre 2013-2018 e 2022-2024. É membro da Comissão Nacional de Inteligência Artificial do Conselho Federal da OAB. Foi convidado pela Mesa do Congresso Nacional para criar e coordenar a comissão de Juristas que promoveu a audiência pública sobre a criação da Autoridade Nacional de Proteção de Dados, realizada em 24 de maio de 2019. Possui destacada carreira acadêmica, tendo atuado como professor convidado da Università Sapienza (Roma), IPBEJA (Portugal), Granada, Navarra e Universidade Complutense de Madrid (Espanha). Foi convidado pelo Supremo Tribunal Federal em duas ocasiões para discutir temas ligados ao Direito e à Tecnologia. Também atua como professor e coordenador do programa de Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) da Escola Superior de Advocacia Nacional do Conselho Federal é o órgão máximo na estrutura da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB). Foi fundador e presidente da Comissão de Direito Digital e Compliance da OAB/SP (2005-2018). Atuou como Juiz do Tribunal de Impostos e Taxas de São Paulo (2005-2021) e fundou a Comissão do Contencioso Administrativo Tributário da OAB/SP em 2014. Na área de arbitragem, é membro da Câmara Empresarial de Arbitragem da FECOMERCIO, OAB/SP e da Câmara Arbitral Internacional de Paris. Foi membro do Conselho Jurídico da FIESP (2011-2020) e diretor do Departamento Jurídico da mesma entidade (2015-2022). Atualmente desempenha o papel de Diretor Jurídico do DEJUR do CIESP. Foi coordenador do Grupo de Estudos de Direito Digital da FIESP (2015/2020). Foi convidado e atuou como pesquisador junto ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em 2010, para tratar da segurança física e digital de processos findos. Além disso, ocupou o cargo de Diretor Titular do Centro do Comércio da FECOMERCIO (2011-2017) e foi conselheiro do Conselho de Tecnologia da Informação e Comunicação da FECOMERCIO (2006-2010). Desde 2007, é membro do Conselho Superior de Direito da FecomercioSP. Atua como professor de pós-graduação da Universidade Presbiteriana Mackenzie desde 2007, nos cursos de Direito e Tecnologia, tendo lecionado no curso de Direito Digital da Fundação Getúlio Vargas, IMPACTA Tecnologia e no MBA em Direito Eletrônico da EPD. Ainda coordenou e fundou o Programa de Pós-Graduação em Direito Digital e Compliance do Ibmec/Damásio. É Mestre em Direito na Sociedade da Informação pela FMU (2007) e Doutor em Direito pela FADISP (2014). Lecionou na Escola de Magistrados da Justiça Federal da 3ª Região, Academia Nacional de Polícia Federal, Governo do Estado de São Paulo e Congresso Nacional, em eventos em parceria com o Departamento de Justiça dos Estados Unidos, INTERPOL e Conselho da Europa. Como parte de sua atuação internacional, é membro da International High Technology Crime Investigation Association (HTCIA) e integrou o Conselho Científico de Conferências de âmbito mundial (ICCyber), com o apoio e suporte da Diretoria Técnico-Científica do Departamento de Polícia Federal, Federal Bureau of Investigation (FBI/USA), Australian Federal Police (AFP) e Guarda Civil da Espanha. Além disso, foi professor convidado em instituições e empresas de grande porte, como Empresa Brasileira de Aeronáutica (EMBRAER), Banco Santander e Microsoft, bem como palestrou em eventos como Fenalaw/FGV.GRC-Meeting, entre outros. Foi professor colaborador da AMCHAM e SUCESU. Em sua atuação junto ao Conselho Nacional de Política Fazendária (CONFAZ), apresentou uma coletânea de pareceres colaborativos à ação governamental, alcançando resultados significativos com a publicação de Convênios e Atos COTEPE voltados para a segurança e integração nacional do sistema tributário e tecnológico. Também é autor do primeiro Internet-Book da OAB/SP, que aborda temas de tributação, direito eletrônico e sociedade da informação, e é colunista em Direito Digital, Inovação e Proteção de Dados do Portal Migalhas, entre outros. Em sua atuação prática, destaca-se nas áreas do Direito Digital, Inovação, Proteção de Dados, Tributário e Empresarial, com experiência jurídica desde 1988.

Leila Chevtchuk, eleita por aclamação pelos ministros do TST integrou o Conselho Consultivo da Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados do Trabalho – ENAMAT. Em 2019 realizou visita técnico científica a INTERPOL em Lyon na França e EUROPOL em 2020 em Haia na Holanda. Desembargadora, desde 2010, foi Diretora da Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 2ª região. Pela USP é especialista em transtornos mentais relacionados ao trabalho e em psicologia da saúde ocupacional. Formada em Direito pela USP. Pós-graduada pela Universidade de Lisboa, na área de Direito do Trabalho. Mestre em Relações do Trabalho pela PUC e doutorado na Universidade Autôno de Lisboa.