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Obrigatoriedade de registro de empresas em conselhos profissionais

Tem se tornado recorrente a exigência de anuidades e inscrições de empresas junto aos conselhos de classe profissionais.

12/6/2025

Antes de avançarmos sobre a análise quanto à obrigatoriedade do registro de empresas junto aos conselhos profissionais, torna-se indispensável analisarmos a relevância da CNAE atribuída às empresas notificadas.

Isso porque, a Classificação Nacional de Atividades Econômicas - ou simplesmente CNAE - se refere a uma padronização dos códigos de identificação das atividades econômicas existentes no território nacional. Muito além do que uma simples classificação ou formalidade, esta ferramenta direciona o enquadramento das empresas no âmbito das normas administrativas e tributárias que regulam nossa economia.

Com base nestes dados, além dos conselhos profissionais, os órgãos administrativos e fiscais da União, Estados e municípios a utilizam para regular as formalidades pertinentes a cada setor. 

Com este contexto, além de nortear o segmento e demais obrigações das empresas, a CNAE tem servido para atribuir, dentre outras exigências (enquadramento sindical, benefícios trabalhistas e/ou tributários, aumento de tributos e etc.), o reconhecimento de determinada empresa como sendo uma integrante de determinada classe profissional.

Mas será que o simples enquadramento da CNAE é suficiente para obrigar o registro em um conselho profissional?

CNAE não é tudo!

Conforme disposição da lei 6.839/19801, a obrigatoriedade de registro nos conselhos profissionais decorre do exercício efetivo de atividades técnicas que são privativas dos profissionais que esses conselhos regulamentam e fiscalizam. No caso de conselhos como o CREA, CRC, CRMV, CRA, entre outros, a exigência de registro se aplica às empresas que realizam atividades que são exclusivas da profissão regulamentada — como, por exemplo, engenharia, contabilidade, medicina veterinária, administração e outras áreas técnicas específicas.

Em diversas normas que instituem os conselhos profissionais, podemos extrair a expressão só é permitido o exercício da profissão e/ou o exercício é assegurado aos portadores de diplomas, conforme art. 2º da lei 5.517/68 e art. 2º da lei 5.194/66, respectivamente o regulamento dos médicos veterinários e o regulamento dos engenheiros.

Assim, não basta que a CNAE da empresa esteja relacionada a uma atividade técnica, torna-se indispensável que, de fato, haja a prestação/execução de atos privativos da profissão regulamentada e que exijam a atuação exclusiva de profissionais habilitados, como engenheiros, arquitetos, agrônomos, contadores, administradores, médicos veterinários, entre outros.

A comprovação de execução de atos privativos é tão relevante, que mesmo na exigência de contratação de médicos veterinários, em estabelecimento de comércio de produtos veterinários e fármacos, se não houver a administração de fármacos no local, tal exigência se mostra indevida, conforme entendimento exarado pelo STJ no julgamento do REsp 1.338.942-SP.

Embora recorrente tal prática pelos conselhos de classe, há diversos posicionamentos jurisprudenciais que afastam a exigência de inscrição e/ou recolhimento de anuidades, quando as empresas não exercem atividades privativas da profissão regulamentada, conforme destaques:

O caso não merece maiores digressões, dado o julgamento em incidente de recursos repetitivos no REsp 1.338.942/SP, relator Og Fernandes, TRF-3, 1ª seção, julgado em 26/4/17, DJe 3/5/17, Tema 616 STJ, que na questão submetida a julgamento “Cinge-se a discussão em saber se estabelecimentos comerciais que vendem animais vivos e medicamentos veterinários estão, ou não, obrigados a efetuar o registro no respectivo Conselho de Medicina Veterinária”, firmou a tese abaixo, com delimitação do julgado em embargos de declaração, DJe 4/5/18. Tema 616 STJ “À míngua de previsão contida da Lei n. 5.517/68, a venda de medicamentos veterinários - o que não abrange a administração de fármacos no âmbito de um procedimento clínico - bem como a comercialização de animais vivos são atividades que não se encontram reservadas à atuação exclusiva do médico veterinário. Assim, as pessoas jurídicas que atuam nessas áreas não estão sujeitas ao registro no respectivo Conselho Regional de Medicina Veterinária nem à obrigatoriedade de contratação de profissional habilitado”.2

O objeto social da empresa apelada é o comércio varejista de equipamentos de informática, suprimentos e prestação de serviços de conserto e manutenção (ID 89986633, fl. 15). Esta é a atividade básica exercida pela empresa, que não pode ser considerada como exclusiva de profissionais de engenharia . Assim, incabível a exigência de registro junto ao CREA/SP. 6. Manifestação do próprio CONFEA, em procedimento de consulta, a concluir que não cabe registro dos profissionais de informática no CREA, por falta de amparo legal.3

Conclusão

Além da questão controvertida sobre a exigência de registro de empresas em conselhos de classe, muitas vezes sem amparo normativo adequado (vale outra análise), a obrigatoriedade de registro da pessoa jurídica no conselho de fiscalização profissional impõe-se, apenas e tão somente, quando houver incontroversa atividade básica, ou o serviço prestado a terceiro e que, esteja compreendida entre os atos privativos da profissão regulamentada.

Independente do objeto social da sociedade empresária, a lei 6.839/1980 que trata sobre o registro de empresas nas entidades fiscalizadoras do exercício de profissões, em seu art. 1º aborda “atividade básica ou em relação àquela pela qual prestem serviços a terceiros", o que denota que o critério condutor da inscrição junto ao conselho profissional é a atividade básica e não a CNAE.

_____________

1 https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l6839.htm

2 STJ - REsp: 1338942 SP 2012/0170967-4, Relator: Ministro OG FERNANDES, Data de Julgamento: 26/04/2017, S1 - PRIMEIRA SEÇÃO, Data de Publicação: DJe 03/05/2017

3 TRF-3 - ApCiv: 00119293920084036302 SP, Data de Julgamento: 11/02/2020, Data de Publicação: e - DJF3 Judicial 1 DATA: 14/02/2020

Harrisson Barboza de Holanda
Advogado. Pós-Graduado em Direito Tributário pela Fundação Getúlio Vargas - SP. Sócio do escritório Holanda Advogados.

Marcella Nunes Marchesano
Advogada da equipe de Direito Tributário no escritório Holanda Mancuzo Advogados - HMADV. Graduada em Direito pela Universidade São Francisco. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Presbiteriana Mackenzie.

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