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Concurso público da Polícia Federal: O candidato tem direito de acessar as duas correções da prova discursiva?

Defende-se o direito do candidato da PF de acessar as duas correções da prova discursiva, em nome da transparência, Justiça e do devido processo legal.

30/10/2025

A aprovação em um concurso público é, para muitos brasileiros, mais do que uma opção profissional: é um verdadeiro projeto de vida, um sonho construído com sacrifício, noites sem dormir e uma resiliência que poucos compreendem. No concurso da Polícia Federal - especialmente para o cargo de delegado -, a prova discursiva é um divisor de águas: ela separa aqueles que dominam tecnicamente o Direito de quem, por circunstâncias injustas, pode ter sua trajetória interrompida.

O edital da PF estabelece que a prova discursiva deve ser corrigida por dois avaliadores distintos. Em teoria, esse modelo serviria para garantir maior imparcialidade e rigor técnico. Entretanto, na prática, surge um problema decisivo: o candidato não tem acesso às duas correções individualizadas. Recebe apenas o espelho final, já “processado” pela banca examinadora, sem conhecer o que cada avaliador anotou, pontuou ou descontou.

E isso muda tudo. Como apresentar um recurso administrativo eficaz sem saber quais pontos foram considerados incorretos? Como contestar eventual erro material, injustiça ou divergência técnica significativa? Como demonstrar que o texto atendeu ao conteúdo jurídico exigido, se ninguém sabe por que o avaliador não reconheceu o argumento ou a fundamentação apresentada?

Sem acesso às razões da nota, o direito ao recurso torna-se apenas simbólico, uma ficção procedimental. O candidato tem um “direito”, mas não possui os meios para exercê-lo. E como ensinou Norberto Bobbio: “direito sem garantia não é direito, mas retórica vazia”. Assim, a ausência de transparência na correção viola diretamente:

Mais grave ainda: muitas vezes, as notas dos avaliadores são diferentes entre si. Por trás da média aritmética burocrática, pode existir prejuízo oculto, erro grotesco, subjetividade não controlada. Quando o Estado exige objetividade máxima do candidato, deve oferecer objetividade mínima na correção.

Nossos Tribunais Superiores são firmes: avaliações subjetivas devem ser motivadas e passíveis de reexame administrativo ou judicial. E, diante da omissão da banca, resta ao candidato - já fragilizado emocionalmente - buscar proteção judicial para ter garantido algo simples: saber onde errou.

A boa notícia é que há solução. O Judiciário tem reconhecido o direito de acesso às correções individuais, bem como determinado nova avaliação quando comprovado erro ou ilegalidade. Em muitos casos, isso significa reclassificação, convocação para as fases seguintes e até posse sub judice.

A mensagem deste artigo é clara: não desista. Se há algo no processo que não parece justo, talvez realmente não seja. O sonho de servir à Polícia Federal não pode ser destruído por um ato administrativo secreto e imotivado. O candidato não está pedindo privilégio - está exigindo legalidade.

O concurso público é o caminho republicano para ingressar em carreiras de Estado. Mas ele somente cumpre essa função se for guiado pela transparência, pela Justiça e pelo respeito aos direitos fundamentais. Defender isso é defender o próprio Estado de Direito.

Se você acredita que foi prejudicado na prova discursiva da PF ou de qualquer outro concurso, busque orientação de quem realmente entende do assunto. Advocacia especializada não é custo: é a ponte entre o seu esforço e o resultado justo que você merece.

Ricardo Fernandes
Professor, Escritor, Pesquisador, Palestrante, Policial Miltiar da Reserva. É Advogado Especialista em Concurso Público, Direito da PCD, Direito Internacional. Direito Processual Civil, Administrativo

Ana Paula Gouveia Leite Fernandes
Administradora e Advogada; Especialista em Concurso Público, Direito do Trabalho e Previdenciário.

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