Na trajetória do candidato ao cargo de delegado da Polícia Federal, a prova discursiva não é apenas um momento de avaliação: é a expressão escrita de anos de estudo, amadurecimento intelectual e dedicação absoluta ao ideal de servir o país. É a hora da verdade, em que o concurseiro mostra não só conhecimento técnico, mas sua identidade jurídica. Por essa razão, quando a banca atribui uma nota - sobretudo quando essa nota resulta na eliminação - espera-se que ela explique o porquê.
Entretanto, embora o edital da Polícia Federal determine que cada resposta seja avaliada por dois examinadores distintos, o candidato não recebe a motivação individual dessas correções. O que chega até ele é apenas um número e um espelho padronizado, que não revela quais argumentos foram ignorados, quais falhas foram identificadas ou qual critério levou aos descontos aplicados.
Aqui reside o problema central: nota sem motivação é arbitrariedade.
Como ensinou Rui Barbosa, “a força do Direito deve superar o direito da força”. Quando a Administração Pública se nega a justificar uma decisão que impacta diretamente um direito - como a continuidade no concurso - ela rompe com a lógica democrática que legitima sua própria atuação.
A motivação não é formalidade dispensável: é garantia constitucional. A Constituição impõe a publicidade e a motivação dos atos administrativos (art. 37, caput), enquanto a lei 9.784/1999 exige que decisões que afetem direitos sejam fundamentadas de maneira clara (art. 50). Ou seja, não se trata de favor ao candidato, mas de dever do Estado.
A jurisprudência tem reconhecido isso com firmeza: quando a banca não indica de forma minimamente objetiva quais critérios justificaram a nota, viola o contraditório, a ampla defesa e a razoabilidade. Em diversos precedentes, tribunais têm determinado nova correção ou acesso integral às avaliações, especialmente quando há divergência relevante entre os examinadores - e esse é exatamente o caso da PF.
Sem motivação, o candidato não sabe se perdeu ponto por conteúdo, por estrutura, por linguagem ou por interpretação equivocada do avaliador. Não sabe o que melhorar. Não consegue demonstrar erro. Não pode recorrer de forma efetiva. Um recurso sem direção não passa de retórica - e o Direito não se compadece de formalidades vazias.
Há ainda um segundo efeito silencioso: a falta de motivação viola a isonomia. Se dois candidatos recebem notas semelhantes ou diferentes sem que se saiba por quais critérios, o concurso deixa de ser objetivo. A justiça perde espaço para o acaso.
O sonho de se tornar delegado da Polícia Federal não pode ser submetido ao silêncio da banca examinadora. Quem se prepara para defender a lei e investigar o crime merece ser avaliado com respeito aos direitos constitucionais.
A prova discursiva deve ser um campo de luz - não de sombras. Ao candidato injustiçado, deixamos esta mensagem: não aceite a nota como destino. Se o Estado se omite na motivação, o Judiciário existe para restaurar o curso da legalidade.
Seu mérito precisa aparecer. Sua voz precisa ser ouvida. Seu sonho merece continuar.