As mudanças climáticas passaram de uma preocupação ambiental e chegaram ao mundo do trabalho, com riscos jurídicos inteiramente novos para as empresas. Aquecimento global, ondas de calor, secas prolongadas, tempestades intensas e outros fenômenos climáticos impactam diretamente a saúde física e mental dos trabalhadores, ampliam a responsabilidade dos empregadores e, na prática, ameaçam o direito a um ambiente de trabalho seguro previsto na Constituição Federal brasileira e na CLT.
No agronegócio, setor-chave da economia brasileira, o impacto é evidente. Em determinadas circunstâncias, trabalhadores podem ficar expostos a calor extremo, desidratação e risco de insolação. Além disso, defensivos químicos se tornam mais presentes em razão da propagação de pragas e eventos climáticos extremos aumentam a probabilidade de acidentes graves no campo.
Os efeitos das alterações climáticas, contudo, não ficam restritos aos trabalhos operacionais e manuais. Também atingem os escritórios e ambientes corporativos, sobretudo aqueles inseridos em grandes centros, cuja tônica é o crescimento urbano desordenado. Ambientes mal climatizados, quedas de energia, enchentes urbanas e piora da qualidade do ar comprometem o bem-estar, a produtividade e até a segurança dos profissionais.
Do ponto de vista jurídico, o passivo potencial é elevado. Empresas podem ser responsabilizadas sob os aspectos civil, trabalhista, administrativo e previdenciário por não adotar medidas de prevenção. Além de indenizações por danos morais, materiais e estéticos, há a possibilidade de reintegração de empregados, pagamento de salários durante afastamentos, autuações por auditores fiscais, ações civis públicas promovidas pelo Ministério Público do Trabalho e aumento do Fator Acidentário de Prevenção, que eleva a carga previdenciária. Casos recentes de incêndios em plantações, mortes de trabalhadores e acidentes decorrentes de enchentes mostram que a crise climática já chegou aos tribunais - e à opinião pública.
Nesse cenário, a omissão é um risco que vai além das condenações judiciais: também é um risco reputacional. Em uma era marcada pela hiperexposição das informações, acidentes e doenças relacionadas a condições ambientais extremas ganham espaço na mídia e nas redes sociais, muitas vezes acompanhadas de narrativas que enfatizam o descaso da empresa com a saúde de seus trabalhadores. Esse enquadramento fragiliza a imagem daquela organização perante consumidores, investidores e parceiros comerciais, que cada vez mais condicionam suas escolhas a critérios de sustentabilidade e responsabilidade social.
A proximidade da COP30 - a 30ª Conferência das Partes da ONU sobre Mudança Climática, que ocorrerá em novembro em Belém - reforça ainda mais a relevância do tema. O Brasil estará no centro das atenções mundiais, e incidentes climáticos envolvendo trabalhadores podem ser utilizados como exemplos negativos em debates internacionais, projetando para além das fronteiras nacionais uma percepção de omissão e descaso, tanto do setor privado quanto do poder público. Uma crise similar próxima ao evento pode fazer a narrativa de falha sistêmica de governança ambiental e social se espalhar, transformando tragédias em símbolos de irresponsabilidade. Nesse contexto, cada acidente de trabalho associado a eventos climáticos extremos pode se converter em um emblema de atraso, afetando reputação, valor de mercado e competitividade.
A resposta do setor empresarial deve ser a ação preventiva e integrada. Planos de contingência para eventos extremos, infraestrutura de proteção no campo e nos escritórios, fornecimento de equipamentos adequados, acesso constante a melhorias e busca pelo aperfeiçoamento são as primeiras medidas. Tecnologias sustentáveis, como irrigação inteligente e manejo integrado de pragas, por sua vez, reduzem a dependência de insumos químicos. Programas de capacitação contínua e de saúde mental, direito à desconexão e descanso, fortalecem a cultura de prevenção. E a inclusão do tema climático em relatórios de sustentabilidade - alinhados a padrões como GRI, SASB e TCFD - demonstra transparência e compromisso.
As empresas que compreenderem essa nova realidade vão reduzir seus passivos jurídicos e reforçar sua credibilidade no mercado. As que ignorarem os riscos climáticos, ao contrário, estarão mais expostas a ações judiciais, custos previdenciários crescentes e riscos reputacionais. Isso porque o direito a um ambiente de trabalho saudável, já consolidado constitucionalmente, se tornou inseparável da agenda climática. Em tempos de COP30 no Brasil, proteger trabalhadores é também proteger a imagem institucional e a competitividade no mercado global.