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Proposta do semipresidencialismo no Brasil

O sistema apresentado pela PEC possui maior maleabilidade em relação ao presidencialismo, contanto com interessantes ferramentas que viabilizam a superação de crises políticas.

19/4/2022

(Imagem: Arte Migalhas)

Chama atenção os últimos atos do Legislativo em, se não acelerar, prover a rápida discussão e votação de proposta semipresidencialista para o Governo do Brasil, em pleno ano de eleição da Chefia do Executivo.

A ideia nasceu em 1995, por meio da Proposta de EC 20, quando o então Deputado Eduardo Jorge sugeriu que o Brasil estabelecesse em seu Governo o Sistema Parlamentarista.

Abraçando as linhas do parlamentarismo, estabelece normas para a nomeação e destituição do Conselho de Ministros, disciplinando os institutos da moção de censura e do voto de confiança, bem como criando a hipótese de dissolução da Câmara dos Deputados e de convocação de novas eleições.

Ao tratar questões relativas ao Presidente da República, a PEC toma dimensões interessantes, propondo uma peculiaridade em relação aos sistemas parlamentaristas mais tradicionais: o Presidente da República deverá ser eleito por sufrágio universal, direto e secreto.

O mais curioso: Competirá ao Presidente da República, livremente, escolher e nomear o primeiro-ministro, sendo necessário ouvir apenas o partido ou coligação majoritária na Câmara dos Deputados, que deverá aprovar o programa de governo apresentado sob pena de ter de ser feita nova indicação.

Ademais, o Primeiro-Ministro se incumbe das funções típicas da chefia de Estado, como a de dissolver a Câmara dos Deputados em casos de crise, manter relações com Estados estrangeiros, declarar guerra e celebrar a paz, ratificar tratados internacionais e outras atribuições assemelhadas.

Com essa característica eletiva peculiar, nasce um sistema com contornos presidencialista, surgindo aquilo que, em terrae brasilis, apelidou-se de “semipresidencialismo”, ou seja, um sistema misto com características do parlamentarismo e do presidencialismo. Exemplificando, podem-se citar os moldes estabelecidos pela atual Constituição francesa.

Quanto às funções de Governo propriamente ditas, a PEC expõe que ficam ao cargo do Conselho de Ministros, composto pelo primeiro-ministro e os Ministros de Estado, sendo responsabilidade destes a direção superior da administração federal.

A proposta também sugere a adoção dos institutos parlamentaristas conhecidos como moção de censura e o voto de confiança. A primeira destina-se a demonstrar a insatisfação com a condução do Programa de Governo, podendo ser suscitada após seis meses da posse do primeiro-ministro por iniciativa de um quinto e pelo voto da maioria absoluta da Câmara dos Deputados. Quando utilizada, deve acompanhar a indicação de novo nome para a ocupação do cargo com o respectivo Programa de Governo. Quanto ao voto de confiança, trata-se de ferramenta a disposição do primeiro-ministro que pode solicitá-lo à Câmara dos Deputados, se rejeitado, como consequência tem-se a imediata exoneração do Conselho.

Vale mencionar que a proposta prevê duas hipóteses de dissolução da Câmara com consequente convocação de novas eleições: quando a maioria parlamentar que aprovou a investidura do primeiro-ministro nega apoio à execução de seu programa de governo; ou quando é dado à Câmara o poder/dever de escolha do primeiro-ministro e nenhum candidato alcança maioria absoluta de votos, caso em que, o Presidente poderá optar entre nomear o mais votado ou simplesmente dissolver a Câmara, recomeçando todo o processo.

Essas são as linhas gerais estabelecidas pela PEC que a partir de 1997 teve instituída Comissão Especial para discussão do tema, onde foram eleitos Presidente o Deputado Franco Montoro, Relator o Deputado Odacir Klein e Sub-relator o Deputado Bonifácio de Andrada.

Na prática, o sistema presidencialista adotado no Brasil consagra o Presidente como poderes distintos, praticamente invencível a qualquer crítica ou embate político que poderia suscitar um impeachment.

Ademais, outro argumento muito repetido por aqueles que defendem o presidencialismo é o de que o plebiscito de 1993 teria criado uma barreira insuperável para implantar o sistema parlamentarista.

Não obstante, entendemos ser esta uma análise superficial, haja vista que o plebiscito de 1993, tinha um caráter transitório, ou seja, consumiu-se no instante em que foi realizado.

Ao trazer as figuras do primeiro ministro e do conselho de ministros, o modelo descentraliza prerrogativas das mãos de um só governante, o que pode evitar abusos e proporcionar um funcionamento equilibrado dos poderes. Nada obstante, a nomeação do primeiro-ministro pelo próprio presidente acaba por desmantelar a própria ideia de democracia parlamentarista.

É louvável a necessidade de aprovação pela Câmara dos Deputados ao Plano de Governo apresentado pelo primeiro-ministro, uma vez que possibilita um amplo diálogo e relacionamento entre esses diferentes representantes do povo.

Conclui-se que de fato o sistema apresentado pela PEC possui maior maleabilidade em relação ao presidencialismo, contanto com interessantes ferramentas que viabilizam a superação de crises políticas.

Ainda, podemos acrescentar que o sistema parlamentarista sugerido pela PEC combinado com o voto distrital misto, garantiria o processo democrático com ampla e efetiva participação da sociedade nas decisões do Governo.

Para o ideal de representação democrática o Presidente da República deve continuar a ser eleito enquanto que o chefe de governo, o primeiro-ministro, seja eleito por voto não secreto da maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional.

Esse sistema conduziria ao diálogo entre Executivo e Legislativo e assegura a maior representatividade da população nas duas esferas de poder.

Cristiano Quinaia
Mestre em Direito Constitucional. Zapatero Advogados.

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