O STF considerou válida a fixação de multas administrativas com base no salário-mínimo, ao entender que o valor pode servir apenas como referência numérica, desde que não seja utilizado como fator de reajuste econômico.
A maioria dos ministros seguiu o voto do relator, Gilmar Mendes, que ressaltou que a Constituição veda apenas o uso do salário-mínimo como indexador econômico.
O processo, com repercussão geral reconhecida, foi julgado no plenário virtual, encerrando-se nesta terça-feira, 4.
Confira como ficou o placar:
Entenda
O caso teve origem em uma autuação do CRF-SP - Conselho Regional de Farmácia do Estado de São Paulo contra uma drogaria, com base na lei 5.724/71. A norma prevê multa de um a três salários-mínimos para estabelecimentos que realizem atividades privativas de farmacêuticos sem a presença de um profissional habilitado.
O Tribunal de origem considerou a regra inconstitucional, com base no dispositivo da Constituição que proíbe a vinculação do salário-mínimo “para qualquer fim”. A drogaria alegou que a multa viola essa norma ao utilizar como referência um indexador vedado, o que poderia gerar incertezas jurídicas e distorções com a variação do mínimo.
Voto do relator
Segundo Gilmar Mendes, o art. 7º, IV, da Constituição veda o uso do salário-mínimo como fator de indexação econômica, mas não impede sua utilização como referência numérica para fins pontuais. Para S.Exa, a sanção aplicada no caso não se confunde com benefícios sujeitos a reajustes automáticos.
“A imposição de multa constitui evento pontual, decorrente de infração específica”, afirmou o relator. O ministro ressaltou que a jurisprudência do STF já admite essa distinção, citando precedentes que reconhecem a validade do uso do salário-mínimo em cálculos de pensão alimentícia, pisos salariais e penalidades processuais, desde que desvinculado de reajustes periódicos.
Gilmar Mendes também alertou para os impactos práticos de uma eventual declaração de inconstitucionalidade. Segundo ele, isso poderia gerar insegurança jurídica e comprometer a atuação de diversos órgãos fiscalizadores, que utilizam o salário-mínimo como parâmetro para a aplicação de multas e outras obrigações.
Ao final, propôs a seguinte tese de repercussão geral:
“A fixação de multa administrativa em múltiplos do salário-mínimo não viola o disposto no art. 7º, IV, da Constituição Federal."
Os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin, Flávio Dino, Nunes Marques e Edson Fachin seguiram o entendimento do relator.
- Leia o voto do relator.
Voto divergente
Abrindo divergência, o ministro Dias Toffoli ressaltou que a fixação de multas administrativas em múltiplos do salário-mínimo viola o art. 7º, IV, da Constituição, pois o dispositivo tem por objetivo impedir que o salário-mínimo seja utilizado como fator de indexação econômica.
Para S.Exa., a norma da lei 5.724/71, que vincula as penalidades ao salário-mínimo, gera reajustes automáticos indevidos e compromete a finalidade social do instituto.
O ministro recordou precedentes do STF, como a ADIn 1.425, em que se afirmou que a proibição busca evitar que “interesses estranhos aos versados na norma constitucional venham a ter influência na fixação do valor mínimo a ser observado”. Citou ainda julgados como o RE 201.729 e o RE 565.714, que reforçaram a impossibilidade de vinculação do salário-mínimo para quaisquer finalidades remuneratórias ou punitivas.
Para Toffoli, a utilização do salário-mínimo como base de cálculo de multas administrativas representa “desvio de finalidade da função social do instituto” e produz efeitos econômicos desproporcionais, especialmente para pessoas físicas e jurídicas sujeitas à fiscalização. O ministro destacou que outras legislações que tratam de sanções administrativas, como o Código de Trânsito Brasileiro e a lei 9.605/98 (infrações ambientais), utilizam valores nominais em moeda corrente, sem qualquer vinculação ao salário-mínimo.
Ao final, o ministro propôs a seguinte tese de repercussão geral:
“A fixação de multa administrativa em múltiplos do salário-mínimo viola o disposto no art. 7º, IV, da Constituição Federal.”
Os ministros Luiz Fux, Cármen Lúcia e André Mendonça acompanharam o voto de Toffoli.
- Processo: ARE 1.409.059
Leia o voto de Toffoli.