sábado, 4 de maio de 2024

Arquivo do dia 20/10 de 2016

PILULAS

Na semana passada, Moro recebeu denúncia contra Eduardo Cunha. Na ocasião, este rotativo observava o tom crítico do magistrado de Curitiba que, com ares professorais, apontava que o libelo original, de autoria do procurador-Geral da República, tinha "evidente" erro de imputação. Migalhas não disse, mas é claro que a censura de Moro era extensiva ao STF, uma vez que a Corte tinha recebido a denúncia dita capenga. No mesmíssimo processo acima mencionado, sem que houvesse novidade fática, surgiu um "pedido instrumental", seja lá o que for isso, com o requerimento da prisão. Novamente Moro deixa no ar uma reprovação ao Supremo, uma vez que os fatos são os mesmos do pedido de prisão feito por Janot, e que o STF não se dignou a apreciar... Deus nos livre de querer defender Cunha (tanglomanglo, mangalô três vezes), mas fato é que os fundamentos da decisão de Moro são, no mínimo, inusitados, para não dizer outra coisa. Acompanhe-nos, migalheiro. Diz o notável magistrado que, sendo a corrupção sistêmica e profunda, "impõe-se a prisão preventiva para debelá-la, sob pena de agravamento progressivo do quadro criminoso". E mais, que "impor a prisão preventiva em um quadro de corrupção e lavagem de dinheiro sistêmica é aplicação ortodoxa da lei processual penal". No caso específico do famigerado réu, Moro afirma que "considerando o histórico de conduta e o modus operandi, remanescem riscos de que, em liberdade, possa o acusado Eduardo Cosentino da Cunha, diretamente ou por terceiros, praticar novos atos de obstrução da Justiça". Ou seja, riscos de que possa... Como, no entanto, estamos a falar de um réu cuja prisão foi gostosamente esperada e saborosamente anunciada, ninguém está muito preocupado com esse negócio de lei. De fato, para o povo isso são filigranas de somenos importância. Mais importante que a lei é o lenhador da Federal. Ah... suspiram as moças. Voz isolada na imprensa é a da professora Eloísa Machado de Almeida, que no Estadão fala em um "vale-tudo judicial". Judiciosa, ela observa que, quando se permite que um juiz determine a perda de liberdade de uma pessoa, sem provas de que ela estaria obstruindo um processo, viola-se a lei. E isso é assim, diz ela, mesmo que essa pessoa seja Cunha. Tendo sido levantado o sigilo, veja a íntegra do "pedido instrumental" do MPF e da decisão de Moro. ______________ Ainda sobre a prisão de Cunha... 1 - Ontem em Brasília falava-se, de um lado, que Cunha foi preso para que abrisse o bico, e, de outro, para que fechasse o bico. O tempo dirá quem estava com a razão. 2 - Indômito, Cunha pode vir a delatar. E, neste caso, calcula-se que tenha no arsenal umas 200 autoridades com foro privilegiado para entregar. Somados estes às outras duas centenas que a Odebrecht está delatando, teremos nos próximos meses mais 400 réus no Supremo. Isso significa algo em torno de 4.000 testemunhas a serem ouvidas. Será o caos. Enfim, ou se cria uma situação emergencial, ou o STF será criticado noite e dia. 3 - Estadão: "Moro diz que STF tinha motivos para decretar prisão". 4 - Folha de S.Paulo: "Prisão de Cunha é um tapa na imagem do Supremo". 5 - Ontem, no fim da manhã, houve um remanejamento interno nas celas da carceragem da PF em Curitiba. Nas mudanças, espremeram presos numa ala para que sobrassem três lugares vagos na outra. Um destes locais, como se sabe, ganhou no início da noite seu novo morador. Os outros dois colchonetes, dizem pelos corredores, receberão seus hóspedes entre hoje e amanhã. Há quem garanta que as reservas estão feitas em nome de Luís Inácio e Paulo Okamoto. Quem viver, verá no momento do check-in. 6 - Editorial da Folha de S.Paulo: "Oficialmente em silêncio - o presidente se encontrava em trânsito, retornando do Japão -, o entourage de Michel Temer revelava nos bastidores grande apreensão." 7 - O doleiro Lúcio Bolonha Funaro é mencionado 14 vezes no pedido de prisão de Cunha. Moro, ao despachar, cita-o outras 8 vezes. Diante disso, novamente a pergunta: o que é que o indigitado doleiro está fazendo na Papuda que ainda não foi despachado para Curitiba ? Quem temê-lo-á ? 8 - Até o fechamento desta edição não havia notícia de nenhuma nova prisão. No entanto, como agora se prende com Sol a pino... ______________ Advocacia agredida, sociedade apequenada Estava demorando. Estava demorando. De fato, estava demorando para que a população passasse a hostilizar os advogados dos réus na Lava Jato. Um processo midiático como este, em que antes de se iniciar o julgamento já se toma a medida do pescoço para que a corda da forca fique bem ajustada, o advogado é mero personagem decorativo. E, como tal, demonizado e confundido com o cliente. As cenas que se viram ontem, quando os advogados Ticiano Figueiredo e Pedro Ivo Velloso (Figueiredo & Velloso Advogados Associados), que defendem os interesses de Eduardo Cunha, foram agredidos na porta da PF de Curitiba, são deprimentes. Ao saírem do prédio, os causídicos foram perseguidos por manifestantes aos gritos de "bandido" e de receberem "honorários de propina". O caso demonstra claramente que o grau de incivilidade dos corruptos é semelhante daqueles que cobram Justiça. Para o advogado Kakay, a causa disso está no clima de condenação antecipada, que se dá por meio da espetacularização do Direito Penal; de uma mídia opressiva; e, da falta de espaço para a defesa. Agora,"chegou no limite máximo que é a agressão física de um advogado no exercício da profissão". Veja as cenas e a repercussão do caso.

O plenário do STF fixou ontem duas teses de repercussão geral em REs que já tinham sido julgados: RE 704.292 - Conselhos de profissão não podem fixar anuidade acima da previsão legal. RE 838.284 - É válida cobrança da taxa para emissão da ART em obras. "Sereno da vida" A importantíssima tese fixada no RE 704.292 foi proposta pelo relator, ministro Toffoli, com a colaboração do ministro Celso de Mello, mas que infelizmente estava ausente na sessão de ontem. Ao votar, o ministro Fachin ressaltou a experiência do decano, "que certamente, banhado pelo sereno da vida, olhou essa realidade e tomou como premissa fixar um limite de antemão". O tom poético do ministro Fachin quebrou o gelo entre os ministros. De fato, Barroso corroborou : "Eu estava preocupado com o ministro Celso, mas o problema é que ele ficou banhado pelo sereno da vida e não pôde vir hoje." Em seguida, o ministro Fux votou com a maioria: "Sereno da vida !" Na sua vez, o ministro Marco Aurélio disse: "Presidente, receio o sereno porque posso resfriar." No que divergiu a ministra Cármen Lúcia: "Vossa excelência é um touro. Eu duvido que qualquer sereno lhe pegue." Lirismo supremo Seja adjetivo, seja substantivo, "sereno" pode ser encontrado na poesia pátria. Vejamos dois exemplos, ambos de nosso romantismo. Embevecido pelos encantos da meninice, Casimiro de Abreu fala em "Meus oito anos" que "o mar é - lago sereno...". Já o boêmio Fagundes Varela, antigo aluno das Arcadas, no belíssimo "A flor do maracujá", entre tantas rimas em "a", cita as "gotas de sereno / nas folhas do gravatá".

Por maioria, o plenário do STF rejeitou embargos de declaração interpostos contra decisão, em que assentou que os profissionais liberais devem acertar com o Fisco o pagamento da Cofins. Alegava-se contradição e omissão no julgamento quanto à modulação dos efeitos. Na época, foi indeferida a modulação, porque não se obteve a maioria de dois terços da Corte (oito), conforme o art. 27 da lei 9.869/98. O julgamento ficou empatado (5x5) em razão da ausência da ministra Ellen Gracie. A ministra Rosa, relatora, votou pelo conhecimento dos embargos. Em seu escólio, o quórum do art. 27 da lei 9.868 não se aplica a casos em que não há declaração de inconstitucionalidade de norma. "Salvo quando declarada em processo objetivo ou subjetivo a inconstitucionalidade de lei ou ato normativo, não incide como regra de julgamento o art. 27 da lei 9.868/98, no que exige maioria qualificada de dois terços do tribunal para a modulação dos efeitos da decisão judicial." A ministra, no entanto, ficou vencida, tendo a maioria acompanhado a divergência aberta pelo ministro Teori, para quem "o julgamento foi muito claro : rejeitou o pedido de modulação". "Pode ser que o art. 27 não se aplique ao caso, mas o Tribunal decidiu assim, não teve contradição ou omissão." (RE 381.964 e RE 377.457) Vida longa Caso os embargos de declaração relatados nas migalhas acima fossem acolhidos, o julgamento seria retomado e a ministra Rosa, como sucessora da ministra Ellen Gracie, apresentaria seu voto quanto à modulação dos efeitos. O fato foi criticado por alguns ministros. "Vamos rejulgar a matéria a essa altura ? (...) Embargos de declaração de um processo que foi julgado em 2008 ?", questionou o ministro Marco Aurélio. Na sequência, o ministro Gilmar Mendes afirmou : "As coisas acabam, mas os processos não terminam (...) A toda hora nós estamos voltando, com risco de rejulgarmos causas por composição incompleta."