domingo, 7 de dezembro de 2025

Arquivo do semana 21/03 à 27/03 de 2016

21
mar.segunda-feira
PILULAS

"José Eduardo Cardozo era professor da Faculdade de Direito da PUC. Quando eleito vereador em SP soube conciliar muito bem as funções de político e professor. Porém, quando assumiu o MJ abandonou totalmente a condição de jurista, ignorou tudo que sabia e ensinava sobre a República, o interesse público e a ética, para defender, incondicionalmente, os interesses políticos do governo e do partido. Para substituí-lo a presidente nomeou um membro do MP, Wellington César Lima, que deixou de ser ministro sem nunca ter sido, porque essa acumulação é, indiscutivelmente, vedada pelo art. 128 da Constituição. Agora, para substituir o substituto, a Presidente nomeou Eugênio Aragão, também integrante do MP, uma figura grotesca, que começou por ameaçar a PF. Na perspectiva jurídica, sua nomeação é tão inválida quanto a do Wellington Lima, e pela mesma razão. Já há uma ação no STF, movida pelo PPS, postulando a decretação dessa nulidade. Aragão argumenta que não estaria proibido de ocupar cargo no Executivo, sem deixar o MP, por já ser integrante do MP anteriormente à promulgação da CF/88. Com efeito, a CF, nas disposições transitórias, art. 29, § 3º, dispõe: "Poderá optar pelo regime anterior, no que respeita as garantias e vantagens, o membro do Ministério Público admitido antes da promulgação da Constituição, observando-se, quanto às vedações, a situação jurídica na data desta." Note-se o destaque para as vedações. Uma coisa é a manutenção de regime quanto a garantias e vantagens, e outra coisa são as vedações, para as quais deve ser observada a situação jurídica vigente em 5 de outubro de 1988. Ou seja: quem, nessa data, se encontrasse em acumulação que passou a ser vedada, poderia assim permanecer. Trata-se de uma oportuna aplicação do princípio da segurança jurídica. Porém, de maneira alguma é possível extrair daí que integrantes do Ministério Público naquela data incorporaram ao seu patrimônio jurídico o direito de acumular funções expressamente proibidas pelo texto constitucional. Isso ficou muito claro no julgamento do RE 157.538-7 Rio de Janeiro (STF, 1ª Turma, Rel. Min. Moreira Alves, VU, presentes os Ministros Sydney Sanches, Sepúlveda Pertence, Celso de Mello e Ilmar Galvão, 22/6/93), de cuja ementa consta, expressamente, que "Não há direito adquirido contra a Constituição". Toda norma jurídica, para ser aplicada, deve ser primeiro interpretada, sendo certo que toda norma comporta uma pluralidade de interpretações. Entretanto, um princípio fundamental de hermenêutica é aquele no sentido de que toda exceção deve ser interpretada restritivamente. No caso em exame, não é possível dar interpretação extensiva, atribuindo a antigos membros do MP o privilégio de violar a Constituição. Espera-se que a Presidente tenha o bom senso de abandonar a luta inglória pela manutenção de mais uma violação da Constituição e nomeie para o MJ algum dos muitos respeitáveis juristas que a apoiam, e que não abandone seu compromisso com o Direito, acabando com a triste sina desse órgão governamental." Adilson Abreu Dallari Professor Titular de Direito Administrativo pela PUC/SP, especialista em Direito Político pela Faculdade de Direito da USP e consultor jurídico

23
mar.quarta-feira
PILULAS

Na séria série "esqueçam o que eu escrevi", ontem trouxemos a informação de um artigo do professor Celso Antonio Bandeira de Mello sobre interceptação telefônica. Eram argumentos que respaldavam a divulgação de conversas vazadas, na época (1999), de FHC. Hoje a informação é de um voto-vista do ministro Gilmar Mendes num HC do caso Banestado (HC 95.518). A autoridade coatora: Sérgio, sempre ele, Moro. A ementa do remédio heroico é autoexplicativa: "Atua com inequívoco desserviço e desrespeito ao sistema jurisdicional e ao Estado de Direito o juiz que se irroga de autoridade ímpar, absolutista, acima da própria Justiça, conduzindo o processo ao seu livre arbítrio, bradando sua independência funcional." "Revelam-se abusivas as reiterações de prisões desconstituídas por instâncias superiores e as medidas excessivas tomadas para sua efetivação, principalmente o monitoramento dos patronos da defesa, sendo passíveis inclusive de sanção administrativa." No voto-vista, o ministro Gilmar Mendes de 2013 não deixa dúvidas: "O Tribunal tem-se manifestado várias vezes em relação a essa questão, que o juiz é órgão de controle no processo criminal. Tem uma função específica. Ele não é sócio do Ministério Público e, muito menos, membro da Polícia Federal, do órgão investigador, no desfecho da investigação." "Penso que não pode ser diferente o papel desta Corte e de nós juízes, pois é inaceitável, sob qualquer fundamento ou crença, tergiversar com o Estado de Direito, com a liberdade do cidadão e com os postulados do devido processo legal." Os magistrados de 2013 e 1016 são os mesmos. Já as partes... ____________ Editorial Platão ensinou que tudo o que o espírito humano faz ou sofre levará à felicidade quando é guiado pela sabedoria, mas ao oposto quando guiado pela insensatez. Nesse sentido, é preciso emitir com parcimônia as opiniões acerca dos magistrados. Primeiro, sem extremismos. Ou melhor, ficando na temática filosófica, nem tanto ao céu, nem tanto à terra. O juiz Moro parece ser daqueles homens bem intencionados. É verdade que exagera aqui e ali (e como !), mas não se vislumbra nele um viés ideológico. Não o vemos rodeado de grupos políticos ou econômicos. De modo que, até onde sabemos, é movido por uma certa sanha de justiça, um tanto quanto exacerbada. Condenável na terra, sim, mas talvez Ele o absolva no juízo final. O certo seria os tribunais superiores, sempre que instados, lembrassem a ele da observância das regras. No entanto, como é forçoso convir, passaram apenas a falar amém (há exceções, como a decisão de ontem do ministro Teori). Quem sabe as Cortes estejam imbuídas do mesmo interesse, qual seja, da efetividade da Justiça. Tudo isso seria ótimo, não fosse o fato de que ao transpor limites, eles deixam de existir. Por isso, é chegado o momento de restabelecê-los, sob pena de não avançarmos no processo civilizatório. Certos pontos da excelente decisão acima, de 2013, servem como uma luva para 2016. O juiz não pode ir além de suas competências de controle do processo crime. Não é sócio do MP, nem muito menos parceiro da PF. E não pode ter animosidade com as partes, por mais que estas tenham com ele. Nesse sentido, auguramos novos ventos na operação Lava Jato. Operação que tem no juiz Moro um excelente condutor, o qual, incontestavelmente, descortinou inúmeras mazelas que grassam desde os tempos coloniais. Mas estes panegíricos, por si sós, não justificam, por outro lado, práticas condenáveis. Cada coisa em seu lugar. Ademais, basta ver algumas últimas operações para perceber que nitidamente a Lava Jato deu uma guinada e começou a ser uma caça de provas para corroborar o impeachment ou a cassação do mandato da presidente da República. Esse direcionamento é nefasto e pode jogar por terra todo o hercúleo trabalho até aqui realizado. É bem o momento de voltar para uma investigação ecumênica. E doa a quem doer. A propósito, a delação premiada da Odebrecht pode ser a tábua de salvação da operação, pois ali - segundo consta - há corrupção para todos os paladares. Incluindo, provavelmente, a necessidade de o Judiciário cortar na própria pele. E se depois de aberta essa caixa de pandora o impeachment ou a cassação forem consequência, isso será algo normal, e não forçado, como querem alguns grupos que passaram a soltar maviosos cantos no ouvido de Sérgio Moro, e que podem o estar inebriando. Não se esqueça, magistrado, a mesma mão que o afaga hoje, é a que lhe beliscará amanhã. Ou já beliscou ontem.