sábado, 27 de abril de 2024

Arquivo do dia 04/04 de 2016

PILULAS

O editorial da Folha de S.Paulo de ontem é irrepreensível. No caos que se está, a soberania deve ser devolvida ao povo. Nossos representantes não mais nos representam, se é que um dia nos representaram. "Dada a gravidade excepcional desta crise, seria uma bênção que o poder retornasse logo ao povo a fim de que ele investisse alguém da legitimidade requerida para promover reformas estruturais e tirar o país da estagnação." Os vices na história do impeachment Vejamos uma breve comparação nos processos de impeachment de Collor e Dilma. Collor fez toda a trapalhada sozinho. Melhor dizendo, com seu finado companheiro PC. Itamar Franco, aliás, foi um vice-presidente sem partido, pois se desfiliou do PRN, indo só depois para o PMDB. Já no governo Dilma, o PDMB agiu nos últimos seis anos como aquelas plantas trepadeiras que vão se contorcendo, subindo e aproveitando cada nesga aberta. Ocupou e ocupa uma infinidade de cargos. É, pois, corresponsável (em alguns casos cúmplice) da má gestão do país. E isso para não falar que seus caciques estão mais enrolados que tudo na Lava Jato. Ou seja, quando a Folha de S.Paulo diz que não há legitimidade para o vice-presidente, e quando se diz algures que a alternativa é, de fato, aterrorizante, a única saída seria devolver ao povo o poder de escolher. Amolando a faca A escapatória legal para haver eleição à presidência neste momento seria a cassação da chapa pelo TSE. O processo que pode levar a isso é de autoria do PSDB. Mas, inexplicavelmente, o PSDB deixou o feito cozinhando em fogo brando. Inexplicavelmente, não. É que pesquisas indicam que numa eventual eleição daqui a 90 dias, nenhum candidato com plumagem tucana ganharia. Lula, Marina ou um nome novo, mas conhecido (tipo Donald Trump), ganhariam as eleições. Por isso, os tucanos passaram a preferir o impeachment, que é uma maneira de tentar ajeitar as coisas nos próximos dois anos, emplacando um correligionário num bom ministério e dando-lhe visibilidade para alçar voo em 2018. E ainda assim manteriam o processo de cassação na mão, como uma faca no pescoço do presidente Temer, pronta para desferir o golpe fatal caso o jogo não saia a contento. Imponderável Todas essas conjecturas olvidam um imponderável : Michel Temer, depois de sentado e assentado no Palácio do Planalto, dificilmente sai de lá em dois anos. Vai tomar gosto pela coisa. Dizem que é um sonho que persegue. E falam até que é ranço da juventude quando disputas frustradas teriam lhe deixado marcas indeléveis. Referimo-nos às malogradas candidaturas à presidência do centenário Centro Acadêmico XI de Agôsto, considerado pelo ministro Flavio Bierrenbach como o cargo mais importante a que um bacharel em Direito pode concorrer. Votos e fatos Acerca do vice-presidente Michel Temer, interessante notar que embora sucessivamente eleito, nunca foi esplendidamente sufragado. Nas últimas eleições proporcionais que participou, em 2006, só conseguiu uma cadeira na Câmara, Casa que já havia presidido por duas ocasiões (1997-99 e 1999-01), graças ao coeficiente eleitoral. Fosse pelos seus próprios eleitores, tinha ficado na suplência. A sorte foi que o partido tinha puxadores de votos como Karina Somaggio, que teve 2.307 votos e ajudou a carregá-lo. Aliás, para quem não se lembra dela, Fernanda Karina Ramos Somaggio era a secretária de Marcos Valério que deu uma entrevista à IstoÉ Dinheiro acusando integrantes do Governo Lula e do PT de envolvimento com atividades ilícitas praticadas por seu patrão. Ela até queria posar para a Playboy, mas a revista poupou seus leitores. Mas voltando à votação de Temer, embora em 2002 ele tivesse conseguido 252.208 votos, quatro anos depois seus eleitores minguaram e passaram a ser 99.046. Um pouco menos do que Bolsonaro, que no RJ obteve 99.700, e bem distante dos campeões de votos daquele pleito : Maluf (739.827), Ciro Gomes (667.830), Celso Russomano (573.524), Clodovil (493.951) e ACM Neto (436.966). Impressiona, todavia, a capilaridade (eleitoralmente falando) do vice-presidente, que teve votos em 450 municípios bandeirantes. Em sua terra natal, Tietê, às margens do rio que dá nome à cidade, ele obteve 3.627 votos. Pouco mais da metade do que o candidato José Carlos Melaré, que ali conseguiu 7.142 eleitores. E ficou em segundo lugar também em Barretos, mas aí sua votação foi impressionante. De todo modo, foi o mais votado em Duartina, Terra Roxa e Brotas. Vejamos abaixo algumas cidades e sua votação em 2006 : Cidades Votos Barretos 7.592 Tietê 3.627 Duartina 2.716 Brotas 2.599 Terra Roxa 1.979 Boituva 1.871 Campinas 1.568 Cerquilho 1.560 Itu 1.362 Piracicaba 1.213 Santos 341 Pedregulho 8 Terceira presidência Mesmo tendo sido diplomado pelo coeficiente eleitoral, isso não torna (e, de fato, não tornou) o deputado Michel Temer um parlamentar menor. E tanto é assim que, excepcional articulador, naquela legislatura novamente foi eleito presidente da Casa (2009-10). A César o que é de César Ainda acerca do processo no TSE, há uma tese correndo por aí segundo a qual iriam se dividir responsabilidades, isentando o vice-presidente das questões de arrecadação de campanha. Quem viver, verá. Mudou-se Vendo agora, com certo distanciamento, a missiva do vice-presidente não foi nem um pouco ingênua e bobinha, como os "memes" que se fizeram dela. Ela tinha um alvo que, olhando agora, foi atingido. O destinatário não era o que estava no envelope. Mídia e empresariado estavam sendo avisados do rompimento dele com a presidente. A partir daquele momento, ele passou a ser poupado por aquela e procurado por este. Com sua indiscutível habilidade política, submergiu para desenhar o quadro que hoje se apresenta.

A mídia tem sido responsável por várias distorções nesse tormentoso problema político que enfrentamos. Como o que nos interessa é o ponto de vista jurídico, fiquemos adstritos a ele. Pois bem, o Estadão de ontem dizia que os "ministros do STF começam a questionar Dilma". A excelente jornalista Beatriz Bulla - amiga desta Redação, e que assina o texto - deve ter suas fontes, embora nos pareça que a epígrafe é generalizadora ao extremo e o conteúdo seja impreciso. Além disso, há uma farpa lançada ao final que nos motiva a comentar. Vejamos. Conta-nos ela que "quem mantém o contraponto às vozes críticas ao governo é Marco Aurélio Mello". Evidentemente que a informação está equivocada. Mas infelizmente isso tem sido repetido aqui e ali. E não só ao ministro Marco Aurélio, mas a todos os onze ministros, cada um de um jeito. A tachação e rotulagem é feita gostosamente pelos jornais e pelas mídias sociais. Mas quem conhece o ministro Marco Aurélio, por exemplo, está a rir quando o querem carimbar de defensor do governo. O ministro tem uma postura legalista e liberal. Nos últimos 25 anos no STF não saiu nem uma única vez dessa linha. É de uma coerência invejável. Por isso, quando o ministro diz qualquer coisa, é seu escólio natural que está a falar. Se agrada um e desagrada outro, é circunstância que certamente não lhe interessa, pois como S. Exa. não se cansa de afirmar, processo, para ele, não tem capa. Ademais, o ministro Marco Aurélio, para gáudio da comunidade jurídica, tem como musa, além de sua esposa querida, Dra. Sandra, a Carta Magna de 1988. Por essas e outras, é chegada a hora de pararmos de procurar tomada em focinho de porco, de buscar ideologias esconsas nas decisões dos ministros, ou de querer rotulá-los como CG (contra o golpe) ou FI (a favor do impeachment). Nesse sentido, ao se dizer, alhures, que a alternativa que se apresenta é péssima, não se está querendo dizer que concorda com o que aí está. Ou seja, uma coisa não anula a outra. E os ministros, guardiões da Constituição Federal, devem ser mais respeitados e preservados por uma sociedade que quer que a lei e a Justiça se mantenham intactas. Causa própria A explicação acima se dá também porque nós aqui somos vítimas do mesmo mal. De fato, ao fazermos um comentário qualquer, logo viramos CG ou FI. Deixemos claro, para acabar com esse assunto : nós aqui não temos este ou aquele viés, e nem nos compete ter. Se esperam essa ou aquela posição de Migalhas, estão lendo o informativo errado. De outra parte, não nos quedaremos sempre que acharmos que a legalidade está sendo violada. E falamos isso porque, hoje em dia, não raro há os que aceitam alguns excessos em prol de um bem qualquer que imaginam no futuro. Ou seja, para estes os fins justificam os meios. Se essa lógica vencer, o porvir nos mostrará quão torto caminho trilhamos.